postado em 06/01/2012 07:36
O município de Petrolina (PE), base eleitoral e cidade natal do ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho, foi escolhido para receber a maior quantidade de cisternas de plástico compradas pelo ministério, dentre as regiões do Nordeste que serão contempladas com os equipamentos. O edital do pregão que resultou na contratação da empresa que vai fabricar as 60 mil cisternas, a um custo de R$ 210,6 milhões, é assinado pelo presidente da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), Clementino de Souza Coelho, irmão do ministro. A Codevasf é uma estatal vinculada ao Ministério da Integração Nacional.Das 60 mil cisternas, 22.799 (38%) precisam ser entregues na unidade da Codevasf em Petrolina, conforme o edital. Das sete cidades nordestinas previstas no programa para a entrega dos equipamentos, Petrolina ; onde Fernando Bezerra já foi prefeito por três vezes ; é a que receberá a maior quantidade de cisternas, seguida de Bom Jesus da Lapa e Juazeiro (BA), com 11 mil; Penedo (AL), com 7.429; e Montes Claros (MG), com 7.391 cisternas.
A compra dos equipamentos integra o Plano Brasil sem Miséria, programa que é vitrine do governo da presidente Dilma Rousseff. O Cadastro Único, o mesmo usado para o Bolsa Família, encontrou 738,8 mil famílias em oito estados do Nordeste e em Minas Gerais que precisam de uma cisterna para obtenção da água necessária ao consumo. Conforme a radiografia do cadastro, Pernambuco é apenas o terceiro estado com a maior demanda: 128,6 mil famílias ainda não contam com o equipamento.
A maior necessidade está na Bahia (224,9 mil famílias), seguida do Ceará (185,9 mil). Mesmo assim, Fernando Bezerra e o irmão Clementino privilegiaram Petrolina e região com a destinação de novas cisternas. Clementino e um dos filhos do ministro, o deputado federal Fernando Bezerra Coelho Filho, são pré-candidatos à prefeitura de Petrolina nas eleições deste ano. Enquanto a Bahia, recordista em demandas por cisternas, receberá 11 mil equipamentos de plástico, não há nenhuma previsão de entrega para o Ceará, o segundo estado com maior números de famílias inscritas no Cadastro Único.
A cisterna de plástico que será fornecida pela Dalka do Brasil Ltda., a empresa contratada pela Codevasf, custa duas vezes mais do que as tradicionais cisternas de placa construídas no semiárido nordestino. O custo unitário do equipamento de polietileno é de R$ 3,5 mil, enquanto uma cisterna tradicional custa R$ 1,8 mil (veja arte).
Fábrica
Somados os gastos com transporte, instalação e manutenção, a cisterna de polietileno sairá por R$ 5 mil. A tradicional tem custo final de R$ 2.080, segundo a Articulação no Semiárido (ASA), organização responsável pelo programa de construção de um milhão de cisternas na região, financiado basicamente pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). A pasta de Fernando Bezerra foi incluída no Programa Água para Todos, do Brasil sem Miséria, e a opção dele foi substituir parte das cisternas tradicionais por equipamentos de plástico.
[SAIBAMAIS]No mesmo dia em que a Dalka do Brasil Ltda. foi anunciada como vencedora da licitação, em 25 de outubro de 2011, representantes da empresa estiveram na Prefeitura de Petrolina para discutir a instalação de uma unidade da fábrica na cidade. Os executivos da Dalka ressaltaram que ;grande parte do volume de entrega (de cisternas) está num raio de 150km de Petrolina;, como consta em notícia publicada no site da prefeitura. A Dalka do Brasil tem o nome fantasia Acqualimp. É, na verdade, a multinacional mexicana Rotoplas, que atua em 16 países da América Latina.
O grupo está no Brasil há 10 anos e foi contratado pela Codevasf em 28 de novembro do ano passado. As primeiras cisternas de plástico estão instaladas. Se antes a construção das cisternas era decidida pela comunidade, a distribuição dos equipamentos de plástico passou a ser definida pelos titulares da Codevasf e do Ministério da Integração Nacional, que privilegiam a região de Petrolina. ;Grandes grupos acabam sendo favorecidos. É mais uma ação de clientelismo no Nordeste. O acesso à água é um direito da família ou passa a ser mais uma benesse?;, critica a coordenadora executiva da ASA, Cristina Nascimento. O Correio tentou falar com os representantes da multinacional mexicana no Brasil, contratada para a fabricação das cisternas. Na tarde de ontem, ninguém atendeu os telefones na Dalka do Brasil, sediada em Valinhos (SP).
Com o aval da CGU
O edital do pregão para a contratação da empresa fabricante de cisternas de plástico foi submetido à Controladoria-Geral da União (CGU) e, somente depois, aprovado pela diretoria da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). É o que sustenta o Ministério da Integração Nacional em nota da assessoria de imprensa enviada ao Correio.
O edital foi assinado pelo irmão do ministro Fernando Bezerra, porque, na ocasião (setembro de 2011), ele respondia interinamente pela presidência da estatal. Clementino de Souza Coelho é diretor de Desenvolvimento Integrado e Infraestrutura da Codevasf desde 2003, segundo a assessoria. É o presidente em exercício da estatal. ;O processo obedeceu a todos os princípios de publicidade, foi amplamente divulgado em conformidade com as determinações legais. Não obstante todas as providências adotadas, apenas uma empresa, a Acqualimp, foi habilitada.;
Conforme o ministério, a distribuição das cisternas é definida pelo comitê gestor do Programa Água Para Todos, formado por diferentes pastas, entre elas a de Integração Nacional. O Cadastro Único indica onde estão as principais demandas. ;A demanda de Petrolina que será atendida é de 2.658 cisternas. A decisão de situá-las em Penedo (AL), Montes Claros (MG), Teresina (PI) e Petrolina (PE) se deve ao fato de serem os municípios onde se localizam as sedes regionais da Codevasf.;
O pregão foi aberto à participação internacional ;tendo em vista o reduzido número de empresas aptas a produzir este equipamento no Brasil;, cita a assessoria do ministério. A opção por cisternas de plástico é para que o governo cumpra a meta de 750 mil equipamentos até 2014, diz a assessoria.