Agência France-Presse
postado em 22/10/2015 14:41
Santiago, Chile - "A partir de hoje o Chile é diferente, é um Chile para todos", comemorou Roxana Ortiz, que se tornou, ao lado de sua companheira espanhola, Virginia Gómez, um dos primeiros casais gays a realizar uma união civil, uma possibilidade até então inexistente.Em uma cerimônia provada no Registro Civil, acompanhadas de seus pais e amigos mais íntimos, o casal conseguiu após 11 anos de vida em comum legalizar sua união, uma das maiores aspirações das organizações homossexuais chilenas.
Em meio ao papel picado colorido e muito sorridentes, Virginia e Roxana exibiram após o fim da cerimônia o livreto familiar de cor azul que oficializa o Acordo de União Civil (AUC).
"Foi como uma cerimônia de matrimônio civil, igual. A juíza estava presente, leu nossos direitos e deveres, nos desejou o melhor, enquanto dizíamos ;sim, aceito;. Foi super bonito", revelou Virginia à AFP.
Enquanto acontecia a cerimônia, um grupo de casais homossexuais dançava uma valsa em frente ao Registro Civil, onde funcionários - que estão em greve há mais de três semanas - aproveitaram a presença da imprensa para protestar por um aumento salarial.
Na mesma hora, na cidade de Concepción (500 km ao sul de Santiago), Vicente Medel Salazar e Esteban Guzmán Rioseco, um jovem casal de estudantes, uniu-se oficialmente.
Dia histórico
"Estamos nos sentindo muito felizes em ter chegado a este ponto e principalmente em meu país, e isso é o que mais me deixa contente, ver que o Chile já não é o mesmo. A partir de hoje, o Chile é diferente, é um Chile para todos", afirmou Roxana Ortiz, referindo-se às mudanças ocorridas na sociedade chilena.
"É um dia histórico, de muitas emoções para todos", comemorou Oscar Rementería, porta-voz do movimento de Libertação e Integração Homossexual (Movilh), que compartilha a visão de que agora o "Chile é um país muito mais maduro, muito mais respeitoso e tolerante".
"Tenho que dizer que o Chile evoluiu. Quando eu cheguei aqui, isso era inimaginável", afirmou Virginia, uma espanhola que vive há cinco anos neste país junto com Roxana, com quem já havia se casado na Espanha e cria uma filha de 14 anos.
O AUC entrará em vigor no Chile após 12 anos de debate parlamentar, num país com grande influência da Igreja Católica e onde o divórcio só foi estabelecido em 2004, despenalizou a sodomia há 15 e onde o aborto não é permitido em nenhum caso.
O AUC cria um novo estado civil, o de "convivente civil". Poderão herdar do outro nas mesmas condições dos casamentos e com as mesmas obrigações sobre os filhos. No caso dos homossexuais, têm a mesma preferência que os parentes de sangue para o cuidado dos filhos e têm direito à cobertura de saúde do cônjuge, assim como à pensão.
Mas os assinantes do AUC não são elegíveis para adotar, uma opção para a qual têm prioridade os casamentos tradicionais. Os homossexuais podem fazê-lo, mas como um último recurso e como solteiros.
Cerca de 1.600 casais, a maioria heterossexuais, já haviam se inscrito para assinar o AUC, considerado também uma oportunidade para regularizar convivências de anos, muitas com filhos e bem em comum, que não quiseram passar por um juiz ou pela igreja.
Embora as organizações homossexuais considerem o AUC como um dos principais marcos de sua luta pela igualdade de direitos, alertam que no Chile ainda restam algumas pendências, como uma lei de identidade de gênero ou o casamento igualitário.
As novas gerações já sentem estes novos ares e são ainda mais ambiciosas: "Eu quero me casar. Espero algum dia sair de mãos dadas da igreja com meu companheiro", diz à AFP Norberto Vio, um jovem de 21 anos que há apenas três semanas admitiu sua homossexualidade à família.