Para Rita Lee, a palavra aposentadoria tem muitas olheiras. “Troco por ‘feriaday’: dar-se feriado diariamente, fulana feriadeu-se, do verbo feriadar”, explicou recentemente em seu Twitter, comentando o anúncio de que sua carreira, pelo menos em cima do palco, tem data para terminar. Aos 64 anos, Rita fará hoje sua última — até que se prove o contrário — apresentação pública. O derradeiro show da cantora será realizado em Aracaju, dentro da programação do festival Verão Sergipe 2012.
A notícia do “feriaday” de Rita Lee foi divulgada por ela mesma no último sábado, em show no Circo Voador — ocasião que marcou o début da cantora no tradicional palco carioca. No dia seguinte, Rita confirmou a declaração em seu Twitter (@LitaRee_real), mas tratou de tranquilizar os fãs, avisando que se afasta dos holofotes, mas não da música. “Vou ser rato de estúdio, tenho material para gravar mais cinco discos de inéditas”, avisou.
A saúde seria a justificativa para a aposentadoria. “Quem me viu ontem pode bem atestar minha fragilidade física”, disse, em referência ao show no Rio de Janeiro. Rita não quis conceder entrevistas sobre o assunto. Mas em seu microblog na internet falou diversas vezes sobre o tema, mesmo sem dar grandes detalhes.
Para os admiradores da cantora, o anúncio da aposentadoria ainda está sendo digerido.
“Isso de não poder vê-la em shows é só por um tempo. Ela não parou, pausou”, arrisca a carioca Norma Lima, administradora de um fã-clube virtual da cantora (ritalee.blog.terra.com.br). Será mesmo apenas um período longe dos palcos? A psicóloga Luísa Galiza tem suas dúvidas. “Como eu conheço a Rita há muito tempo, comecei a notar a debilidade física dela há uns cinco anos. Eu a visitei no camarim no último show em Brasília e a senti frágil, pequenininha — mas só percebi isso fora do palco mesmo.”
Rita Lee Jones nasceu em São Paulo, em 31 de dezembro de 1947. Durante a adolescência, passou por uma série de conjuntos musicais até fundar, com os irmãos Sérgio e Arnaldo Dias Baptista (seu primeiro marido), a banda Os Mutantes.
Corista de rock
Depois de dois discos solo, ainda como integrantes dos Mutantes (com quem registrou cinco LPs), Rita parte para novos projetos em 1973, primeiramente uma dupla formada com Lúcia Turnbull chamada Cilibrinas do Éden (que chegou a gravar um LP, nunca lançado no Brasil) e depois como Rita Lee & Tutti-Frutti, grupo que a acompanhou em shows pelo Brasil e em quatro discos de estúdio até 1978. Com o guitarrista Roberto de Carvalho, que ingressou na banda em 1976, Rita não faria apenas diversas parcerias musicais, mas formaria uma família (o casal está junto desde então e tem três filhos).
Mais do que a música, foi a postura que transformou Rita em ícone para gerações. “Além da importância absurda que ela possui para o rock nacional — como mulher e pioneira à frente de uma banda — admiro-a por seus posicionamentos e ideias, com as quais muito me identifico e sempre marcaram minha vida”, conta a farmacêutica Mirta Condessa, 28 anos. “Sempre gostei de personagens femininos e fortes. Virei fã da Rita quando a vi abrindo o show dos Rolling Stones, em 1995. Nunca havia observado uma mulher com uma presença tão agressiva no palco”, lembra Josiele Moreira, 31 anos, uma das donas da loja de discos Musical Center.
Luísa Galiza, 26, conta que começou a ouvir Rita Lee com os pais, ainda na infância. Na adolescência, encontrou na cantora um modelo. “Era o que eu procurava nessa fase da vida. Ela tinha aquela coisa hippie, de contracultura, meio porra-louca. Ao mesmo tempo, era irreverente, palhaça”, detalha. Autor de uma biografia de Arnaldo Baptista (A balada do louco, lançada em 1991), o servidor público Mário Pacheco observa que, no palco, a cantora se expressa melhor do que no Twitter. “Ali em cima, ela não tem medo de escorregar ou se expor ao ridículo. Quando ela canta Tudo vira bosta, eu sempre presto atenção na reação das pessoas e a situação é típica dela: uns apoiam e outros criticam. Rita Lee nunca deixou de ser uma grande polemista”, atesta Pacheco.
A trajetória da Rainha do Rock
1970: Rita estreia solo (ainda como integrante dos Mutantes) e participa de espetáculos ligados às indústrias têxtil e de moda. Nessas apresentações, além de cantar e dançar, Rita interpretava personagens.
1973: Em maio, no evento Phono 73, a cantora estreia o projeto Cilibrinas do Éden, dupla formada com Lúcia Turnbull (de sonoridade folk rock,
que teve vida curta).
1975: Acompanhada do grupo Tutti-Frutti, sua nova banda, Rita se apresentou no festival Hollywood Rock — o evento tinha na programação Celly Campelo, Erasmo Carlos, Raul Seixas, O Peso, Vímana, Mutantes e Raul Seixas.
1977: É lançado o LP ao vivo Refestança, de Gilberto Gil e Rita Lee (acompanhada pelo Tutti-Frutti). O disco vende mais de 200 mil cópias.
1985: Depois de dois anos sem fazer shows, Rita volta aos palcos na primeira edição do festival Rock in Rio. “Odiei ter participado em 1985”, ela comentou ano passado em seu Twitter, em referência ao tratamento inferior que os artistas brasileiros receberam do evento.
1991: A cantora lança seu primeiro disco ao vivo, Rita Lee em Bossa ‘n’ roll (mais de 400 mil cópias vendidas).
1995: Rita Lee é convidada para abrir o primeiro show dos Rolling Stones em solo brasileiro. No mesmo ano, a cantora lança o disco ao vivo A marca da Zorra.
1998: A convite da MTV, Rita grava seu Acústico, que contou com participações de Cássia Eller, Titãs, Paula Toller e Milton Nascimento.
2004: Outro disco ao vivo gravado a convite da MTV. O roteiro de Rita Lee MTV ao vivo foi baseado na turnê do disco Balacobaco (lançado no ano anterior), com sucessos novos e antigos.
2009: Mais um disco ao vivo, dessa vez com o selo do canal pago Multishow.
2012: Último (?) show da carreira da cantora, hoje em Aracaju.