Cidades

Mais de mil cotistas se formaram 7 anos após implantação do sistema na UnB

postado em 03/12/2011 08:00
Kendy Neres foi bem nas provas do vestibular e ficou acima da nota de corte do curso de sociologia, mas optou pelo sistema de cotas: representatividade

O primeiro sistema de cotas para negros em uma universidade federal acaba de completar sete anos com mais de mil cotistas formados. Em meio a polêmicas, dificuldades e questionamentos judiciais, desde o segundo semestre de 2004 a Universidade de Brasília (UnB) matriculou 6.180 pessoas negras e pardas. Dessas, 1.024 se formaram em cursos como direito, comunicação social e matemática. O plano de metas para integração social, ética e racial da instituição prevê a destinação, por 10 anos, de 20% das vagas em cursos superiores para a ação afirmativa.

A três anos de passar por uma revisão nos parâmetros, a política tem pela frente uma prova de fogo: sua constitucionalidade julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2008, o partido Democratas questionou a implantação de alternativas de acesso ao ensino superior para afrodescendentes.

Para o diretor executivo da Educafro ; Educação e Cidadania de Afrodescendentes, Frei David Silva, o questionamento não se justifica, pois a ação afirmativa visa corrigir uma distorção de oportunidades entre brancos e negros que acontece desde a época da escravidão no Brasil. Além disso, ele encontra respostas para a legalidade das cotas no artigo 3; da Constituição. ;São objetivos fundamentais da República: construir uma sociedade livre, justa e solidária, erradicar as desigualdades sociais e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor ou idade. A iniciativa não fere nenhum preceito, só aumenta as oportunidades para aqueles que estiveram às margens da sociedade por um longo período;, ressaltou.

Ele acredita que a votação no STF não deve demorar mais de 20 dias para ocorrer. ;A comunidade negra conversou com os ministros e acredita que eles votarão contra a inconstitucionalidade. Temos medo somente das ressalvas;, disse o Frei David. O temor deve-se ao modelo adotado atualmente para escolher os cotistas. ;A UnB tem uma comissão que define quem pode ou não ser aceito. Acreditamos que as pessoas devem entrar pelo sistema por meio da autodeclaração e depois passar por uma solenidade pública. Assim, quem fraudasse a seleção se sentiria constrangido em aparecer na frente de toda a universidade;, complementou o diretor da Educafro.

Transparência
A decana de graduação da UnB, Márcia Abrahão, afirma que a ideia ainda não está em discussão, mas que, desde o início das cotas, o processo ganhou maior transparência. ;Antes, a comissão era muito fechada. Hoje, temos um edital com todos os critérios para a seleção. Somente aqueles com decisão unânime são aceitos;, detalhou. Márcia considera o programa bem-sucedido. ;As médias dos cotistas são tão boas quanto as dos que entram pelo sistema convencional. Isso quebra o preconceito daqueles que apostavam em uma queda no rendimento da universidade;, complementou.

No quinto semestre de sociologia, Kendy Neres, 25 anos, teve bom desempenho no vestibular e ficou acima da nota de corte para ingressar no curso. Ela optou por entrar pelo sistema de cotas por acreditar que a representatividade de negros e pardos na comunidade acadêmica precisa aumentar. ;São as pessoas negras que sofrem preconceito na rua. Elas que são descritas pela polícia como elemento padrão em caso de assaltos. O número de engenheiros, médicos e economistas negros é muito pequeno;, relata.

Moradora de Santa Maria, Kendy não aceita os argumentos de que as vagas da ação afirmativa são somente para pessoas de baixa renda. ;Se fosse esse o caso, poderíamos ter cotas sociais. A ideia é representar a diversidade do povo brasileiro na universidade;, disse. Desde quando ingressou no curso, ela afirma ter aprendido ainda mais sobre o que é ser negro. ;Não tinha muita noção do que era preconceito ou de como as coisas aconteciam. Sempre me declarei parda, mas agora sei a importância de fazer parte do processo, da luta. Só agora entendo que, quando as pessoas me chamavam de nariz de taboca e cabelo ruim, era preconceito.;

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