postado em 10/12/2014 11:00
Para o julgamento desses autores das violações de direitos humanos durante o período que foi de 1964 a 1985, a recomendação dada pela Comissão Nacional da Verdade (CNV) é a não aplicação dos dispositivos presentes na Lei de Anistia. O documento reserva cinco pontos ao tema da Lei da Anistia, um dos mais polêmicos em relação ao relatório. A CNV decidiu não recomendar, explicitamente, a revisão da Lei da Anistia no relatório final, divulgado nesta quarta-feira (10/12), mesmo com a pressão feita pelos grupos estaduais nesse sentido. No entanto, pede a não aplicação da legislação e chega a citar exemplos de países que revogaram leis semelhantes.
[SAIBAMAIS] "A CNV considerou que a extensão da anistia a agentes públicos que deram causa a detenções ilegais e arbitrárias, tortura, execuções, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres é incompatível com o direito brasileiro e a ordem jurídica internacional, pois tais ilícitos, dadas a escala e a sistematicidade com que foram cometidos, constituem crimes contra a humanidade, imprescritíveis e não passíveis de anistia", argumenta.
O documento invoca a jurisprudência internacional para ressaltar a importância da não aplicação da Lei de Anistia. "Considerando a extrema gravidade dos crimes contra a humanidade, a jurisprudência internacional endossa a total impossibilidade de lei interna afastar a obrigação jurídica do Estado de investigar, processar, punir e reparar tais crimes, ofendendo normas peremptórias de direitos humanos. A proibição da tortura, das execuções, dos desaparecimentos forçados e da ocultação de cadáveres é absoluta e inderrogável", completa.
O texto diz ainda que leis de autoanistia perpetuam a impunidade, obstruem o esclarecimento dos fatos e propiciam uma injustiça continuada a vítimas e familiares. Por fim, a CNV cita a Corte Interamericana de Direitos Humanos e as decisões de revogação de legislações semelhantes em países vizinhos.Assinada em 1979, ainda durante o regime ditatorial, a Lei de Anistia foi uma forma de "reconciliação" da sociedade brasileira, após anos de terror por parte de agentes do Estado e de grupos de oposição radicais, que recorreram às armas para enfrentar os militares. A norma impede a condenação de pessoas a serviço do Estado que cometeram crimes como tortura e desaparecimento, assim como de civis que optaram pela resistência armada.
A polêmica em torno da revisão da norma é antiga e chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2008, exigiu posicionamento da Corte depois de uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que entendia que os princípios da Constituição de 1988 não permitiriam o acolhimento da Lei de Anistia. Em abril de 2010, por sete votos a dois, os ministros da Corte rejeitaram o pedido. O STF deve voltar a se debruçar sobre o tema ao julgar recurso da própria OAB e uma nova ação, de maio de 2014, apresentada pelo PSol.