Agência France-Presse
postado em 14/12/2017 08:39
As desigualdades aumentaram profundamente no mundo desde a década de 1980, em particular nos Estados Unidos, de acordo com um estudo coordenado por vários economistas, que se mostram preocupados com o possível agravamento da situação até 2050.
Europa, África, Ásia e o continente americano, "as desigualdades aumentaram em quase todas as regiões do mundo", afirma o "relatório sobre a desigualdade global", que compara de maneira inédita a distribuição da riqueza a nível mundial e sua evolução em quase quatro décadas.
Este fenômeno, no entanto, aconteceu com ritmos diferentes, de acordo com as regiões, afirmam os coordenadores do estudo, que apontam um forte aumento das desigualdades nos Estados Unidos, mas também na China e na Rússia, países cujas economias registraram uma significativa liberalização durante os anos 1990.
De acordo com o estudo, que teve como principais coordenadores Lucas Chancel, da Paris School of Economics, e Thomas Pikkety, autor do best-seller "O Capital no século XXI", a parte da riqueza nacional nas mãos de 10% dos contribuintes mais ricos passou de 21% a 46% na Rússia e de 27% a 41% na China, entre 1980 e 2016.
Nos Estados Unidos e Canadá, este índice passou de 34% a 47%, enquanto na Europa foi registrado um aumento mais moderado (de 33% a 37%). "No Oriente Médio, na África subsaariana e no Brasil, as desigualdades permaneceram relativamente estáveis, mas a níveis muito elevados", afirma o documento.
Divergência extrema
Em 2016, o pódio das regiões e países menos igualitários era formado por Brasil (55% da renda nacional nas mãos do 1% mais rico), Índia (55%) e Oriente Médio (61%), que perfila segundo os autores um "horizonte de desigualdades" em escala mundial.
No Oriente Médio, as desigualdades estão "sem dúvida subestimadas", destaca o relatório, que menciona uma contradição entre as estatísticas oficiais dos países do Golfo e alguns aspectos de sua política econômica, como o crescente recurso a trabalhadores estrangeiros mal remunerados.
Em termos de evolução, a divergência é "extrema entre a Europa ocidental e os Estados Unidos, que tinham níveis de desigualdade comparáveis em 1980, mas se encontram atualmente em situações radicalmente diferentes", destaca o estudo, realizado com a colaboração de mais de 100 pesquisadores de 70 países.
Em 1980, a parte da riqueza nacional nas mãos de 50% dos contribuintes mais pobres era quase idêntica nas duas regiões: 24% na Europa ocidental e 21% nos Estados Unidos. Desde então, o índice permaneceu estável, a 22%, no lado europeu e caiu a 13% nos Estados Unidos.
Um fenômeno que se explica, de acordo com Thomas Piketty, pela "queda das rendas da menor faixa" nos Estados Unidos, mas também por uma "desigualdade considerável na área de educação e uma tributação cada vez menos progressiva neste país", explica Piketty.
"Isto mostra que as políticas públicas têm um forte impacto nas desigualdades", completa.
Margens de manobra
A principal vítima desta dinâmica, segundo o relatório, baseado em 175 milhões de dados fiscais e estatísticas resultantes do projeto wid.world (wealth and income database), é a "classe média mundial".
Entre 1980 e 2016, o 1% dos mais ricos obteve 27% do crescimento mundial. Os 50% mais receberam apenas 12% da riqueza, mas viram sua renda aumentar significativamente. O que não aconteceu com as pessoas entre as duas categorias, cujo "crescimento da renda foi frágil". Estas desigualdades vão aumentar ou diminuir no futuro? Em seu estudo, os autores antecipam um novo crescimento até 2050, com base nas atuais tendências. A participação do patrimônio dos mais ricos aumentaria assim de 33% a 39%, enquanto a classe média mundial veria sua participação no patrimônio cair de 29% a 27%.
"Tal evolução não é, no entanto, inevitável", explicam os autores. De acordo com as projeções, as desigualdades aumentarão caso os países sigam a tendência atual nos Estados Unidos, mas podem registrar uma leve queda caso repitam a trajetória da União Europeia.
"Há margens de manobra. Tudo dependerá das decisões tomadas", conclui Thomas Pikkety, que considera necessário um "debate público" sobre as questões.