Ricardo Daehn
postado em 26/12/2017 06:11
Crítica // O rei do show ***
Num trecho do musical indicado ao Globo de Ouro O rei do show, há um personagem que, cantando, sintetiza todo um sentimento de marginalização concentrado numa galeria de tipos que habitam o filme: ;Sou velho conhecido da escuridão/ Sugerem para que eu me esconda;.
Brota, entretanto, justamente de uma atitude de exposição extrema o fio condutor do romântico, previsível, mas bastante explosivo O rei do show. Filme do estreante Michael Gracey, a produção se esbalda em boas sinalizações para o sucesso: traz trilha assinada por Justin Paul e Benj Pasek (a dupla de ouro de La la land: Cantando estações), trata de trama em parte migrada da vida real e tem roteiro assinado pela produtora de Sex and the city, Jenny Bicks, e pelo diretor Bill Condon, de A Bela e a Fera.
Uma verdadeira celebração, colorida e festiva, atravessa a tela. O primeiro número musical, com o visceral Hugh Jackman mostrando a razão da indicação ao Globo de Ouro de melhor ator em comédias e musicais, pode não ter o efeito esperado ; repete-se o truque visto em Ironweed: a plateia em polvorosa com a performance dele, mas, na verdade, inexistente. Mas é a trajetória de superação do protagonista, P.T. Barnum, que gera interesse: ele é um empreendedor na corda bamba do risco e disposto a ser um showman.
Com a música The greatest show, o cicerone Barnum puxa a atenção do público (;é aqui que você quer estar;). E, de fato, não há nada que atrapalhe a azeitada narrativa do musical, num ambiente que remete ao universo do diretor Tim Burton de Peixe grande e suas histórias maravilhosas (2003). Um museu de cera e um picadeiro estabeleceram a glorificação do empreendedor disposto a disseminar alegria, amor, amizade e trabalho para artistas que viviam na penumbra.
Nascido no século 19, o Barnum & Bailey Circus se mostrou próspero, trazendo atrações que desfilam na telona. Sem conseguir atrações sugeridas por uma das filhas, P.T. Barnum recruta um anão que está decidido a não passar por palhaço; além de homem cão, homem tatuagem, mulher barbada (a excelente cantora Keala Seattle) e gigante irlandês, entre outros.
Sem os entraves de Os miseráveis (outro musical com Hugh Jackman), o astro de Logan deslancha, ao lado da colega de cena Michelle Williams. Um clima muito mais convincente virá pela presença de Rebecca Ferguson (Missão: impossível ; Nação secreta) que, dublada por Loren Allred (nas cenas de canto com quê de ópera), dá vida a Jenny Lind. Como estratégia de marketing, Jenny será vendida à plateia refinada como um ;rouxinol sueco;.
Ao manipular, com O rei do show, uma trajetória repleta de persistência, êxitos, mas ainda de momentos de baixa, os roteiristas Jenny Bicks e Bill Condon optam por ressaltar o glamour. A letra de Never enough (;Torres de ouro ainda são pouco;) expressa o quilate de ambição que motivam personagens que transitam em meio à sonoridade de músicas como E se nós reescrevêssemos as estrelas?. Entre as virtudes, o filme traz com naturalidade um tabu (para o século 19) ; o romance interracial apresentado pelos personagens de Zac Efron e Zendaya.