Diversão e Arte

Biografias esmiúçam vida de Michelangelo de d. Pedro I

Em comum, ambos tem o fato de serem as estrelas de suas épocas

Nahima Maciel
postado em 01/11/2015 06:25

D. Pedro I: a elite brasileira criou muitos mitos envolvendo o monarca, que não escondia os escorregões

Mesmo distantes no tempo e nos talentos, Michelangelo Buonarotti e D. Pedro I têm algo em comum: ambos eram estrelas de suas épocas. O pintor e escultor italiano, pelo incrível e inquestionável talento. O monarca português, pelas trapalhadas que era incapaz de evitar e de esconder. São duas celebridades bem diferentes, mas que valem a leitura de biografias recém-lançadas e recheadas de detalhes e curiosidades sobre a vida dos personagens.

O pesquisador paulista Paulo Razzutti já havia publicado um livro sobre as cartas trocadas entre d. Pedro e Domitila de Castro Canto e Melo, a marquesa de Santos, e entre o imperador e os filhos quando resolveu que o monarca era digno de uma biografia. Com a ajuda da correspondência e de documentos guardados na Torre do Tombo, em Portugal, no Museu Imperial de Petrópolis, no Arquivo Nacional, no Instituto Histórico Geográfico Brasileiro (IHGB) e em instituições na Europa, Razzutti traçou o perfil de uma figura mais humana e terna do que aquela normalmente apresentada nos livros de história. D. Pedro ; A história não contada procura apresentar um personagem pouco explorado da história do Brasil. ;Tem muito pouca biografia dele;, lamenta Razzutti. ;D. Pedro I não serve muito para abraçar uma causa, é mais fácil fazer isso com D. Pedro II.;

Ao contrário do filho, d.Pedro I não escondia seus escorregões nem sabia construir a própria imagem junto à opinião pública. Todos sabiam de suas escapadas com amantes e muitos reclamavam de não ser um bom gestor. ;D. Pedro II soube se preservar, soube criar a imagem de um intelectual, de bom administrador. O pai estava pouco se lixando para isso. Ele tinha um lado muito humano;, conta Razzutti.


Entrevista completa com Martin Gayford



Que tipo de fontes você usou para fazer a pesquisa? Há muito material?
Há, de fato, uma quantidade surpreendente de notas e evidências da vida e do trabalho de Michelangelo. É dito que há mais material sobre ele do que sobre qualquer outro homem que tenha vivido no século 16, com exceção de governantes e santos. E há uma excelente e abrangente edição de suas cartas (a maioria pertence à Casa Buonarroti, em Florença). Há cerca de 500 cartas escritas por ele e mais de mil escritas para ele, cinco volumes no total, além de dois volumes de cartas de seus associados e família que se referem a ele. E há também um volume com os contratos, um com recordações), duas biografias contemporâneas de sua época. Recentemente, descobtimos detalhes sobre suas realizações bancárias. E isso continua. A enorme quantidade de informações é uma das coisas que o fazem um personagem tão atrativo.


O livro é muito preciso e detalhado. Qual era, exatamente, sua intenção ao fazê-lo?
A dificuldade foi analisar e resumir a vida a um indivíduo que viveu quase 90 anos, realizando e vivendo tantas coisas.

O que fez de Michelangelo um artista conhecido e reconhecido ao longo de mais de cinco séculos?
Claro, os trabalhos dele o tornaram famoso por si só e o único que ele achou que seria necessário assinar foi a Pietá, na São Pedro, terminada quando ele tinha 25 anos. Mas acho que ele também exercitou um certo grau de algo que hoje seria chamado de controle da própria imagem. Por exemplo, uma das biografias que menciono foi autorizada por ele. Isso quer dizer que Michelangelo cooperou com o autor, logo a posteridade teve acesso a muitas informações que ele mesmo selecionou e, poderíamos dizer, distorceu.

Leonardo da Vinci era um personagem muito sociável, o contrário de Michelangelo. Como você lidou com essa personalidade, que era conhecida como difícil?
Acho que Michelangelo era extremamente complexo. Ele tinha características bem desagradáveis: era malvado, avaro, intratável e desonesto. Ele era também - ou talvez tenha sido - acolhedor, adorável, generoso e engraçado. Pessoalmente, eu gosto dele como se gosta de um amigo que pode ser difícil. Eu sonhava com ele enquanto estava escrevendo o livro e em um sonho, já no final, ele me ofereceu um copo de vinho. Logo, talvez, ele tenha aprovado.

Como você descreveria a personalidade dele?
Sombrio, sarcástico e enfurecido por sua própria criatividade.

A biografia está baseada em três eixos: política, sexo e religião. Ela pode ser lida, também, como um documento sobre a Florença do século 16?
Sim, a vida de Michelangelo era entrelaçada com a história, não somente em Florença, mas por toda a Itália. Ele experimentou a reforma e a contrarreforma, trabalhou para oito Papas e conheceu pessoalmente quase todos os italianos importantes do século 16 na política, nas artes e na religião.

Como você lidou com a sexualidade de Michelangelo, um tema raramente explorado em suas biografias?
Sua sexualidade é um ponto complicado, em parte porque, naturalmente, ele não deixou muitas evidências - afinal, relações com pessoas do mesmo sexo levavam à pena de morte naquela época. E também porque ele era muito crente e mais atormentado sobre a questão do que Leonardo da Vinci. Eu deduzo que sua própria atividade sexual o atormentava e provavelmente ele tenha se tornado um celibatário até o fim da vida.

Qual a importância de se fazer uma biografia deste porte?
A história da arte tem evitado as biografias nas academias nas últimas décadas. Isso é uma vergonha porque é muito difícil compreender a arte ocidental sem vasculhar a personalidade de Michelangelo e as coisas que realizou.


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