Diversão e Arte

Pintura de Fábio Baroli mostra um interior atual em exposição no CCBB

Artista faz trabalho nada romantizado sobre a vida no campo

Nahima Maciel
postado em 28/10/2015 11:56

Baroli retrata a vida no interior de um Brasil contemporâneo

Os trocadilhos são comuns nos títulos das pinturas da Fábio Baroli. Não há gratuidade na maneira como artista os utiliza nas pinturas da exposição Deitei para repousar e ele mexeu comigo, em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Baroli nasceu em Uberaba, há 34 anos, e foi por lá que encontrou o material das cinco séries selecionadas para a mostra com ajuda da curadora Renata Azambuja. Depois de oito anos em Brasília para cursar artes visuais na UnB e mais três no Rio de Janeiro, ele decidiu voltar à cidade de origem para fazer o que chama de antropomatutologia, ou uma antropologia do matuto.

A combinação dos trocadilhos típicos do meio rural usados nos títulos e uma pintura corajosamente realista renderam uma série de quadros coloridos e bonitos, porém carregados de um olhar raramente ingênuo. Não é um retrato da vida no interior que Baroli propõe, mas, de certa forma, uma reflexão sobre questões contundentes como a opressão imposta pelo cotidiano, as relações de poder no meio agrário e a postura diante da morte e do desconhecido. ;A ideia não é trabalhar o interior de forma romantizada. A pergunta que me faço é como seria esse matuto hoje;, conta o artista, que aponta o quadro Meu matuto predileto como um ponto de partida para pesquisa.

A banalidade do cotidiano é um dos temas do artista

Foi pouco antes de voltar para Uberaba, em 2012, que Baroli começou a notar, em algumas pinturas, a presença de referências do próprio passado no interior de Minas Gerais. Resolveu assumir essa postura de vez ao retornar para a cidade mineira e dar corpo à pesquisa. ;Resolvi criar coragem e voltar. Fiquei com medo de ficar um pouco isolado, mas resolvi criar isso pela poética do trabalho, para ter o alimento poético do cotidiano;, explica. ;E o retorno me trouxe um monte de surpresas.; A antropomatutologia está nos rostos de obras como Pra lá de dois pé-de-gariroba e Cê gosta de laranja?, mas também nas escolhas de composição de polípticos como Quando a seca entra e A terra do zebu e a casa do caralho. Nessa última, montada em uma sala reservada e escura, Baroli revisita as manifestações que tomaram as ruas de Uberaba em 2013.

Terra de zebu é a terra do gado, mas também do demônio e seu inferno, da represália e da opressão. Ao refletir sobre as manifestações de 2013 que invadiram as ruas do Brasil, o artista tentou imaginar qual o lugar do matuto no cenário tomado por redes sociais, indignação e black bocks. ;Ficava imaginando que, se esses matutos caíssem na TV ou na internet reivindicando seus direitos, seriam cyberjecas. Comecei a pensar sobre isso e desenvolvi esse trabalho. É um trabalho de resistência;, avisa. As manifestações aconteceram em julho, Baroli pintou os quadros em agosto.

Quando a seca entra tem um viés mais intimista, um olhar nascido de uma arqueologia familiar. Os álbuns de família deram o subsídio para o artista criar as 81 pinturas -- pequenas reproduções das fotografias encontradas e do próprio álbum -- da série. ;O desafio desse trabalho foi a paleta saturada;, admite, ao encarar as nuances acinzentadas das telas. Agora, Baroli começa a olhar em outra direção e a se interessar pelas paisagens do interior. Se antes elas apareciam como pano de fundo, em Pra lá de dois pé-de-gariroba, o painel de entrada da exposição, elas ganham volume. ;Virou assunto principal;, constata o artista, que deve continuar a investir na paisagem.


Deitei para repousar e ele mexeu comigo

Exposição de Fábio Baroli. Visitação até 21 de dezembro, de quarta a segunda, das 9h às 21h, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB ; SCES Trecho 2)

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