O poder de ocupação da literatura ; seja no imaginário de quem lê ou, no plano físico, na conquista de uma área de potencial limitado (como a da Biblioteca Nacional de Brasília) ; será testado, na realização da 1; Bienal Brasil do Livro e da Leitura, no período entre 14 e 23 de abril de 2012. Sem livros para empréstimo, a Biblioteca Nacional abriga, hoje, a cerimônia de lançamento oficial da bienal, que, num espaço de 17 mil m;, contará com investimentos na faixa de R$ 7,5 milhões, terá entrada franca e vai dispor de quase 150 estandes, prontos para comercialização, a partir da próxima semana. Grande trunfo para a bienal será a participação, inédita em terreno brasileiro, de Wole Soyinka, o primeiro autor negro (de origem africana) premiado com o Nobel de Literatura.
Presenças de editoras e livreiros, programação cultural, convidados internacionais podem delinear contornos de bienais de São Paulo e Rio ou de feiras como Flip (Paraty) e Fliporto (Olinda e Porto de Galinhas), mas, integrante do conselho consultivo, o escritor Luiz Fernando Emediato se adianta em relativizar comparações. ;Ambicionamos ser diferentes: queremos que os convidados ; ficcionistas, poetas, historiadores, pensadores, cientistas ; falem não só de suas ideias e obras, mas também ajudem a pensar sobre a crise mundial. Uma crise de valores, de ideologias, de religiões, das condições do meio ambiente, do brutal desequilíbrio econômico, mesmo frente aos maiores avanços científicos e tecnológicos;, explica.
Leitor de peso, segundo dados de pesquisa da Câmara Brasileira do Livro e do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, o brasiliense será brindado com uma avalanche de letras, no lançamento de 300 livros (média de 30, por dia). ;O Distrito Federal, com alto poder aquisitivo, é o maior consumidor de livros per capita do país. Nosso público é o cidadão que lê, especialmente jovem e, em grande parte, feminino. Mas teremos atrações para todos, literalmente dos 5 anos aos 104, a idade de Oscar Niemeyer, que será nosso convidado;, adianta Emediato.
No crivo do coordenador literário da bienal, o rol sonhado de convidados contempla pensadores como Noam Chomsky e Rudiger Safranski (biógrafo de Nietszche, Heidegger e Schopenhauer), além da autora de livros infantis neozelandesa Gill Pittar, autora de 64 livros sobre a igualdade, para além de aspectos étnicos, entre as meninas Milly e Molly ; ;que hoje, em mais de 100 países, discute bullying, amor, raiva, racismo e meio ambiente;, destaca Emediato. Na linha de frente das discussões, ele elenca ;a maior crise que a humanidade já viveu, e da qual apenas agora começamos a nos dar conta;.
Do belo ao feio
Vista como ;o centro nervoso do poder e da política;, Brasília, nas palavras do escritor, não abrigará discriminações: ;A bienal terá o bom e o mau, o belo e o feio, o fácil e o difícil;. A participação afunilada refletirá nos europeus e norte-americanos. ;Não focamos autores de livros adocicados como os de Nicholas Sparks ou de vampiros como os de Stephanie Meyer. Com todo respeito, consideramos que nossos leitores merecem coisa melhor. Traremos um novo autor norte-americano de entretenimento inteligente que se chama Daniel Polansky, uma mistura de J.R.R. Tolkien com Quentin Tarantino. Ou seja, queremos surpreender. Mais do mesmo você já encontra nas megas dos shoppings, nos cinemas e nas feiras convencionais;, ressalta Emediato.
Com ênfase na perspectiva contemporânea de autores da África Portuguesa, a partir de ;autores que pensam a África com outros olhos;, há vislumbre de nomes como Pepetela, Roderick Nehone, Ondjaki, Isabel Ferreira, Luis Kandjimbo (de Angola), o guineense Abdulai Sila, o moçambicano Ungulani Ba Ka Khosa e o cabo-verdiano Germano Almeida. Na tribuna de honra, o engajado dramaturgo Wole Soyinka, aos 77 anos, terá a peça The lion and the jewel (1963), traduzida pela Geração Editorial, além de promover palestra que aborda, aos moldes de seus escritos, inevitavelmente, a repetição da história, num caráter circular, alinhavada por conspirações, militância, fraudes e corrupções. Com formação na Nigéria e estudos na Inglaterra, Soyinka preza traços da cultura iorubá. Exemplo disso está em The lion and the jewel que, por trás de uma disputa amorosa, avança em temas como as diferenças entre culturas africanas e ocidentais e o papel das mulheres na sociedade.
Ajuda para professores
Sob o tema O Poder Transformador do Livro e da Leitura, o evento terá homenagem para Ziraldo, importante elo entre leitores de primeira viagem que buscam livrarias e bibliotecas. Com um programa de incentivo ao professor, a bienal, a partir de verba individual de R$ 80 para a compra de livros, a ser feita por 20 mil docentes, pretende estimular, igualmente, alunos.
;Não temos nenhum problema com a Feira do Livro, que, na 30; edição, é uma experiência consolidada. Agora, teremos a iniciativa do poder público, em que a Secretaria de Cultura do DF, com apoio do Instituto Terceiro Setor, partirá para a captação de patrocinadores. A bienal traz a síntese de uma política em construção, com a aproximação, na última década, entre o Brasil e a relação, ;aos soluços;, de admiração aos latino-americanos;, explica o secretário da pasta, Hamilton Pereira. A boa experiência das bibliotecas colombianas, ;transformadas em centros culturais múltiplos de convivência socializada, numa sociedade fraturada como a do Brasil;, será objeto de debate e aprendizado, de acordo com o secretário.
Com espaço para sebos e para velhas discussões, a 1; Bienal, desde já estimula o pensamento. Entrarão em pauta: a baixa média para tiragens (3,5 mil exemplares, por edição) e o alto valor das publicações, numa conjuntura em que ;governos não compram livros para bibliotecas públicas e escolares, e o mercado só consome, às toneladas, títulos sobre bruxos, vampiros, anjos, conspirações contra a Igreja e moças apaixonadas;, pontua Luiz Fernando Emediato.
Aliás, sediado na Biblioteca Nacional, o lançamento do evento, desde já, rende pano pra manga: ;Embora tenha computadores e seja muito frequentada, a biblioteca não tem empréstimos, por causa da incúria do gestor público, que não colocou no orçamento recursos para aquisição de livros. Esperamos que isso seja corrigido no ano que vem, quando será feito e votado o orçamento de 2013. Uma biblioteca sem livros é uma vergonha;, conclui Emediato.
Confira os prováveis convidados da 1; Bienal Brasil do Livro e da Leitura ; 2012
Richard Bourne
Noam Chomsky
Slavoj Zizek
Oscar Niemeyer
Rudiger Safranski
Gill Pittar
Daniel Polansky
Pepetela
Roderick Nehone
Ondjaki
Isabel Ferreira
Luis Kandjimbo
Abdulai Sila
Ungulani Ba Ka Khosa
Germano Almeida
Domi Chirongo
Paulina Chiziane