postado em 06/05/2011 15:06
Bem no começo, quando havia apenas um punhado de canções num gravador portátil, a estratégia de Merrill Garbus era só uma: sobreviver. ;Chame atenção ou morra;, lembra a cantora americana, em entrevista ao jornal Village voice. Aprendeu, logo nos primeiros shows, que o público precisa ser ganho no susto, antes que pense duas vezes, nos primeiros cinco minutos da performance.O desejo de se fazer notar aparece já no nome do projeto da compositora, escrito num zigue-zague de letras maiúsculas e minúsculas: tUnE-yArDs. ;Para mim era muito simples: se as pessoas não parassem imediatamente para ouvir a minha música, eu seria ignorada e não receberia gorjetas;, explicou.
Essa aflição quase adolescente aparece no estilo de Garbus. No palco, ela usa pedais para improvisar loops de bateria, que adensam camadas de vozes, baixo e ukulele. Na hora de gravar discos, trata os recursos disponíveis (às vezes, quase nenhum) como brinquedinhos coloridos, daqueles que hipnotizam crianças pequenas. Feito de matéria reluzente, o segundo álbum da compositora não há de deixar ninguém apático: aterrissa feito um objeto (de plástico) não catalogado.
O sortido whokill, que marca o estreia do tUnE-yArDs no selo indie 4AD Records (casa de Bon Iver, Deerhunter e The National), brinca de ser tudo ao mesmo tempo: rock, R, folk afro-pop e funk. Selvageria e suavidade. Para o ouvinte menos amedrontado, uma montanha-russa das boas. Também é o trabalho mais ;profissional; de Garbus, cuja estreia foi gravada dentro do quarto, numa casa de Montreal. ;As pessoas pedem para que os discos pareçam com meus shows. Mas fui teimosa, quis me rebelar e entrei num estúdio de verdade, com um engenheiro de verdade e microfones de verdade;, contou ao site Pitchfork.
A nova encarnação de Garbus provocou mais euforia que surpresa na ;indielândia;. Com alto índice de elogios (na Pitchfork, sim, e também em publicações como a Rolling Stone e a inglesa New Musical Express), o disco eleva a cantora ao clube das principais apostas de 2011. Para quem começou a carreira se apresentando no metrô de Montreal, é um salto de longa distância. Depois de se mudar para a ensolarada Oakland, na Califórnia, ela esbarrou numa sonoridade mais verdejante, que tem sabor de estranheza e cheiro do pop mais acessível, daquele que se canta a plenos pulmões.
;Do it yourself;
Produtora dos próprios discos, Garbus faz parte de uma geração que atualiza a política do ;faça você mesmo;, batizada em meio aos rumores do punk setentista. Como acontece na arte de Ariel Pink e do Times New Viking, por exemplo, ninguém mexe na carpintaria da cantora. Quando muito, ela permite acesso a um baixista (Nate Brenner, que coescreveu algumas das faixas novas) e a um engenheiro de som. Para quem ouve o disco, no entanto, a sensação é de que Garbus se deixa acompanhar por um mutirão de instrumentistas. Ilusão.
A obsessão por ritmos africanos adensa este pop feito de cacos domésticos e versinhos íntimos (por vezes raivosos), de ;baixa fidelidade;. As viagens de Garbus ao Quênia apertaram os laços entre a vocalista e uma cultura estrangeira que ela reconhece não entender por completo. ;Quando voltei da África, caí até em depressão: amo aquela música, mas não me sinto no direito de escrever algo igual;, contou. Depois de um tempo, ela tratar aquela referência com a naturalidade como lida com as outras inspirações: uma cor que se transforma quando esta batedeira sonora começa a funcionar.