Paloma Oliveto
postado em 13/10/2017 09:00
Poucos lugares do mundo têm uma paleta de cores tão diversa quanto a África. Ainda que muitas pessoas associem o continente ao tom de pele escuro, há uma variação enorme nas tonalidades dos habitantes dos 54 países africanos. Até hoje, não se conhecia a raiz de tantos matizes ; os poucos genes relacionados com a pigmentação da pele foram descobertos em estudos europeus. Agora, porém, um trabalho da Universidade da Pensilvânia encontrou diversas variantes do DNA por trás das diferentes colorações desse que é o berço da humanidade. A pesquisa, segundo os autores, vai lançar luz sobre a evolução do homem, além de ajudar a traçar riscos genéticos de condições dermatológicas como o melanoma.
Essas variantes, conta Sarah Tishkoff, pesquisadora da universidade e principal autora do estudo, publicado na revista Science, explicam por que alguns africanos chegam a ter um tom de pele tão claro quanto dos asiáticos, enquanto que outros são de um matiz marcadamente escuro. De acordo com ela, as mutações genéticas identificadas não surgiram recentemente: ;Elas estão por aí há muito tempo, desde antes da origem do homem anatomicamente moderno;, afirma. O Homo sapiens como se conhece hoje evoluiu há cerca de 300 mil anos.
[SAIBAMAIS]A pesquisadora explica que a variação na cor da pele pode ser justificada pela necessidade de o organismo se adaptar às diferentes condições do planeta. Por exemplo, tons escuros são necessários para proteger o corpo dos raios ultravioletas, que incidem com mais força nos trópicos, comparados às regiões temperadas. Nessas, onde o Sol brilha poucas vezes no ano, a tonalidade clara ajuda a sintetizar a vitamina D.
Para categorizar a variada gama de pigmentações africanas, uma equipe coordenada por Tishkoff utilizou um medidor de cor, que avaliou a reflexão luminosa da pele de mais de 2 mil habitantes do continente, pertencentes a diversas composições étnicas. Enquanto os grupos pastoris da região do Nilo, no leste da África, têm as tonalidades mais escuras, os caçadores-coletores do sul africano exibem as cores mais claras.
Depois dessa primeira análise, os cientistas coletaram amostras de DNA de 1,6 mil participantes, de onde extraíram mais de 4 milhões de polimorfismos de nucleotídeos únicos ; variações que envolvem apenas uma das quatro bases do genoma (A, T, C ou G). Com esses dados nas mãos, foi possível associar as mutações às diferentes cores de pele.
O local do genoma onde essa associação foi mais intensa é em torno e dentro do gene SLC24A5. Nas populações europeias, uma variante dessa proteína relaciona-se à pele clara de europeus e sul-asiáticos. Acredita-se que ela surgiu há mais de 30 mil anos e, de acordo com Tishkoff, estava presente em antigas populações da Etiópia e da Tanzânia que tinham ascendência no sudeste da Ásia e no Oriente Médio. A pesquisadora diz que isso sugere que a variação foi levada para a África desde essas regiões e selecionada positivamente devido à alta frequência em que é encontrada.
Vitiligo
Outra forte associação do genoma com a cor da pele é na região do gene MFSD12, expresso em níveis muito baixos nas partes da derme sem pigmento de pessoas que sofrem de vitiligo, uma condição na qual a cútis perde a coloração. ;Foi muito interessante quando descobrimos essa associação;, recorda Nicholas Crawford, primeiro autor do artigo e pesquisador da Universidade da Pensilvânia. Segundo ele, as mutações ao redor desse gene que tinham relação com a pigmentação escura estavam presentes em alta frequência nas populações com ascendência nilo-saariana, que tendem a ter uma pele muito negra, assim como em todas as etnias subsaarianas, exceto a San, que, geralmente, exibe pele mais clara.
Os pesquisadores também identificaram essa variante, assim como outras associadas à pigmentação da pele escura, nas populações do sul da Ásia e Australo-Melanésias, que têm o tom de pele mais negro do planeta, fora da África. ;A origem de traços como a textura do cabelo, a cor da pele e a estatura, que são compartilhadas entre algumas populações indígenas em Melanésia e Austrália e alguns africanos subsaarianos, até agora tem sido um mistério;, diz Tishkoff. ;Alguns argumentaram que essas populações evoluíram de forma independente dessas mutações, mas nosso estudo sugere que, no que diz respeito aos genes associados à cor da pele, as variantes dessas pessoas são idênticas às associadas à pele escura como africanos;, diz.
Para a pesquisadora, os dados são consistentes com um evento de migração precoce de humanos modernos fora da África ao longo da costa sul da Ásia e para Australo Melanésia, seguido de ondas migratórias secundárias para outras regiões. ;No entanto, também é possível que existisse uma única fonte africana que continha variantes genéticas associadas com a pele clara e escura, e que as mutações associadas à pigmentação escura foram incorporadas somente nos sul-asiáticos e nos australo-melanésios e perdidas em outros eurasianos devido à seleção natural;, diz.
Elas (as mutações genéticas ligadas à cor da pele) estão por aí há muito tempo, desde antes da origem do homem anatomicamente moderno;
Sarah Tishkoff, pesquisadora da Universidade da Pensilvânia e principal autora do estudo