postado em 29/06/2011 09:34
Belo Horizonte ; Quando ouvimos falar em radioatividade, logo pensamos em usinas nucleares e bomba atômica. No entanto, o perigo pode estar presente onde menos esperamos: bem dentro de casa. É o que revela a dissertação de mestrado da pesquisadora Talita de Oliveira Santos, defendida no programa de pós-graduação em Ciências e Técnicas Nucleares da Escola de Engenharia Nuclear da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Intitulado Distribuição da concentração de radônio em residências e outras construções da Região Metropolitana de BH, o estudo foi desenvolvido em parceria com o Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear (CDTN), que pertence à Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnem). A pesquisa identificou que 15% das 540 residências e construções analisadas apresentaram concentrações do radônio superiores aos limites de 150bq* e 200bq, definidos pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (Usepa) e pela Comissão Internacional de Proteção Radiológica (ICRP) como inofensivos à saúde humana. Inimigo oculto, o radônio é um gás inerte presente na atmosfera, proveniente da desintegração radioativa do urânio e do tório. Nasce no solo e nas rochas e chega às nossas residências pela água e pelo material de construção. Foi justamente o fato de o radônio ser proveniente do ambiente geológico que motivou a pesquisa de Talita. ;A maior parte de habitantes na região estudada está inserida numa região granítica. E o granito é conhecido por ter alta concentração de radionuclídeos naturais, principalmente de urânio e tório;, explica.
Apesar de o radônio ser a principal fonte de radiação externa natural e já ser conhecido como carcinógeno humano 1, o mais alto grau, pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (Iarc), ele não oferece, inicialmente, riscos significativos à saúde. O problema reside nos produtos gerados pelo decaimento radioativo dele, que são sólidos e, quando inalados (evaporação), vão para o trato respiratório e permanecem ali em processo de desintegração.
;De acordo com literaturas internacionais, ele já é responsável por 50% da dose de radioatividade natural que recebemos. Está logo abaixo do cigarro, mas é involuntário. Ele é um gás inerte, presente em locais externos;, destaca a pesquisadora. ;Dentro de nossas residências, o gás vai se alojar em local fechado e se acumular. Ali, ele começa a decair em filhos (polônio, bismuto e chumbo), que vão aderir às partículas de poeira presentes no ambiente, e nós vamos respirar essas partículas. Elas ficarão presas ao nosso trato respiratório e gerarão efeitos biológicos, que podem evoluir para um câncer de pulmão, dependendo da quantidade inalada.;
Os dados colhidos por Talita, apesar de superiores a pesquisas similares realizadas no Rio de Janeiro, em São Paulo, Curitiba, Poços de Caldas e Campinas, não confirmam riscos aos moradores da Região Metropolitana de BH. ;Como é uma pesquisa screening (estudo para levantamento de dados), não é possível concluir que a concentração encontrada causa risco à saúde. Por outro lado, podemos afirmar que há altas concentrações médias de radônio na região preocupantes e que sugerem estudos mais aprofundados. A Usepa sugere concentração de radônio de 40bq/m; para ambientes de baixo background (radioatividade natural ou espontânea diária). Nós obtivemos 108 em Belo Horizonte. Então, concluímos que precisamos saber de onde está vindo esse radônio, qual a sua principal fonte. Uma vez conhecida a causa, podemos reduzir seus efeitos;, explica a autora do estudo.
Medidas preventivas
Segundo Zildete Rocha, pesquisador do CDTN e um dos orientadores de Talita, um dos fatores de prevenção dos malefícios decorrentes do radônio é o clima do país. ;Felizmente, no Brasil, esse problema é menor. Somos privilegiados por termos clima tropical, em que mesmo no inverno as portas são mantidas abertas. Na Europa e nos Estados Unidos, devido ao clima frio, o ar do ambiente interior das residências é mantido por longo tempo. A ventilação é importante nesse caso, porque a troca de ar dilui o radônio.;
Em função disso, já existem medidas governamentais preventivas na Europa e nos Estados Unidos. ;Há uma norma americana, por exemplo, que determina que toda casa deve ser construída sobre uma manta antirradônio e todo loteamento precisa ser avaliado antes quanto à presença dele. Quem for vender uma casa tem de apresentar um laudo oficial de medida de radônio;, conta Zildete, destacando a importância da ventilação e da colocação de bons pisos nas residências.
(*) Bequerel: é uma grandeza física, unidade de medida da intensidade da radiação
O radônio
Descoberto em 1899 por R. B. Owens e Ernest Rutherford, o elemento é produto da desintegração do rádio. Incolor, inodoro e insípido, este gás é 7,58 vezes mais pesado que o ar e mais de cem vezes mais pesado que o hidrogênio. Seus isótopos têm vida curta e sua fonte, o rádio, é um elemento escasso. Ele é raro na natureza. As camadas baixas da atmosfera apresentam traços do elemento, desprendidos da terra e de tochas que contêm pequenas quantidades de rádio, gerado como produto da desintegração natural do urânio. O radônio natural apresenta três isótopos, cada um deles provenientes de uma das três séries de desintegração radioativa ocorrida naturalmente: do urânio, do tório e do actínio. O isótopo de meia-vida mais longa (3,823 dias), o radônio 222 procede da desintegração do urânio. O nome, para alguns autores, é reservado para esse isótopo. Os demais seriam chamados de torônio e actinômio.