Jéssica Eufrásio*, Tainan Pimentel*
postado em 11/04/2017 19:40
As doenças são raras e têm nomes difíceis. ;Craniossinostose sindrômica;, ;cardiopatia congênita;, "bronquite obliterante". Não bastassem os termos técnicos, conviver com o diagnóstico também não é nada fácil. Famílias de pacientes que nasceram com patologias sérias e incomuns precisam recorrer à internet para bancar os tratamentos dos filhos, depositando as esperanças na arrecação por meio de doações on-line.
Um desses casos é o do morador de Planaltina que ficou conhecido pela saga para conseguir transplante pulmonar. Lucas Neres nasceu com uma bronquite obliterante que o permitiria viver apenas até os 2 anos de idade. Hoje, com 19 anos, ele está internado em estado grave na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da Santa Casa de Porto Alegre (RS) após sofrer uma parada cardiorrespiratória em 2 de abril. Irani Neres, mãe de Lucas, conta que o jovem dormia na manhã do primeiro domingo do mês quando acordou atordoado, pedindo ajuda. "Ele não dizia coisa com coisa. Pedia ajuda e estava cansado. Depois, teve a parada cardiorespiratória", conta Irani.
O jovem é acompanhado na Santa Casa de Porto Alegre desde julho de 2016, quando se mudou para a capital gaúcha para realizar um transplante pulmonar. Irani diz que o filho respira, desde então, com a ajuda de aparelhos e que os médicos ainda não sabem exatamente o que aconteceu. "Estão fazendo vários exames, mas não dizem nada de concreto. Também não podem tirar os aparelhos dele, porque ele não consegue respirar sozinho quando tiram. E, enquanto não retirarem, ele não vai poder fazer o transplante", afirma a mãe.
Irani diz que, hoje, Lucas tem apenas 15% do pulmão e o que restou não trabalha mais com a capacidade total. "Estamos chegando a um momento delicado da doença. O pouco do pulmão que ele tinha não funciona direito. Ele [o pulmão] não consegue fazer as trocas gasosas e o coração está numa posição desfavorável", explica. A mãe conta quais foram algumas das últimas palavras de Lucas antes de entrar na UTI. "Ele cantou uma música do padre Marcelo [Rossi]. Terça à tarde [4/4] foi o último dia que ouvi a voz dele", conta.
Lucas Neres ficou conhecido em 2010 após sua história de superação contra uma bronquite obliterante ; doença caracterizada pela obstrução das vias aéreas, predominante em pessoas do sexo masculino. A doença foi diagnosticada logo após o nascimentodo menino e o fez perder todo o pulmão esquerdo e incapacitar o funcionamento da maior parte do pulmão direito. Para respirar, o garoto usa um balão de oxigênio 24 horas por dia, que o livra do risco de uma morte súbita.
[SAIBAMAIS]Por causa da bronquite obliterante, o adolescente desenvolveu, ainda, hipertensão pulmonar, desnutrição e problemas cardíacos, que o levaram a fazer um cateterismo. Teve também, por diversas vezes, infecções pulmonares e acumula quatro passagens por UTIs, a última agora, em Porto Alegre.
A única chance de Lucas se curar é um transplante de pulmão. O procedimento foi negado duas vezes em razão de o menino ter feito duas cirurgias para retirada do órgão. Nessa época, a familia do garoto lançou uma campanha para arrecadar US$ 300 mil para realização do transplante no Canadá. Eventos beneficentes, como shows, foram realizados para ajudar.
No ano passado, veio a esperança: o aparelho necessário para realização do transplante em Lucas estava no Brasil. Havia sido levado a Porto Alegre, segundo Irani, para atender vítimas da tragédia na Boate Kiss. A primeira consulta de Lucas com a nova equipe médica aconteceu em abril. Em julho, a família se mudou definitivamente. "Confio em Deus que Lucas vai sair dessa. Tenho certeza de que fiz o máximo que pude por ele", conta Irani.
Irani diz que se mudou com o filho para Porto Alegre ano passado porque não havia, em Brasília, o aparelho necessário para realização do transplante de pulmão em Lucas. Ela conta que, antes, entrou com um pedido de ajuda de custo fornecido pelo GDF para pacientes que realizam tratamento fora do Distrito Federal. No entanto, diz que até agora não recebeu nenhuma parcela do benefício e que tem pago contas, como aluguel, alimentação e compra de suplementos usados por Lucas, graças a ajudas de pessoas sensibilizadas com o caso do filho.
"Quando eu ligo lá, me informam que já mandaram a planilha para pagamento, mas que não tem data para pagar", relata. "A gente está se virando com o dinheiro das campanhas que fizemos. Não sabemos quanto tempo vamos ficar aqui. Se esse dinheiro viesse, já seria uma ajuda e tanto", acrescenta.
Em nota, a Secretaria de Saúde do DF informou que o processo para pagamento do Tratamento Fora de Domicílio (TFD) para o paciente está em fase final e que a previsão é que o valor seja creditado na conta bancária até a próxima semana.
Ajuda para os gêmeos
Durante a gravidez, Mitchelly Layla da Silva, 22 anos, não esperava que os filhos nasceriam com uma síndrome rara. Após o parto, os gêmeos Augusto da Silva e Gustavo da Silva, 3 anos, foram diagnosticados uma doença chamada dismorfismo craniano do tipo escafocefálico, que causa o fechamento do crânio e dificulta o desenvolvimento da cavidade óssea. A família criou uma ação na internet para tentar arrecadar o dinheiro necessário para a cirurgia corretiva.
O texto da campanha de financiamento coletivo aponta que, além do problema que envolve a parte estética, existe a possibilidade de aumento da pressão intracraniana, capaz de ocasionar sequelas graves, como o retardo mental, o déficit cognitivo e a perda da visão. ;Ambos, Augusto e Gustavo, necessitam fazer a cirurgia urgentemente, pois já estão com mais de três anos e, com o avançar da idade, os ossos cranianos se tornam mais espessos e menos flexíveis;, descreve o texto.
Augusto e Gustavo nasceram prematuramente e precisariam ser submetidos a duas intervenções cirúrgicas corretivas: uma após o parto e a outra depois de crescidos. Como o caso de um deles era mais delicado pelo fato de a caixa craniana estar completamente fechada, logo ao nascer, Augusto precisou ter a cavidade óssea craniana remodelada por meio de uma cirurgia de craniossinostose.
Depois de consultarem um neurologista e um médico especialista em genética, Mitchelly e o marido, Wellington Erik Gomes, 22 anos, descobriram que a síndrome ainda não é muito conhecida no meio científico e que o procedimento cirúrgico deveria ser realizado em caráter de urgência. ;O médico disse que eles precisavam de cirurgia, mas, em Brasília, já tem uns quatro anos que não pagam o craniotomo, um equipamento que corta o osso do crânio com precisão", explicou Mitchelly. Como o aparelho já não estava disponível, a operação de Augusto teve de ser feita com uma tesoura cirúrgica.
Por conta da situação, o médico que acompanhava o caso também indicou a alternativa do Tratamento Fora de Domicílio (TFD) para os pais. O programa, que foi instituído por meio de uma portaria publicada em 1999 pela Secretaria de Atenção à Saúde, oferece ajuda de custo aos dependentes do Sistema Único de Saúde (SUS) nos casos em que todas as formas de tratamento no município e origem do paciente se esgotam. Segundo a mãe, o pedido de inscrição no programa foi originalmente negado por falta de verba. O casal precisou entrar na justiça em julho do ano passado para conseguir usufruir do benefício.
No início de março, a família viajou para Campinas (SP) com o dinheiro do TFD para que os gêmeos fossem consultados. As crianças foram encaminhadas para o Centro de Genomas de São Paulo. No entanto, o hospital também está sem verba e os pais não sabem se a cirurgia será realizada. ;Desde a primeira vez que viemos para São Paulo, os médicos perguntam o por quê de o tratamento não estar sendo feito em Brasília, pois a cidade deveria ser referência;, afirma Mitchelly.
O TFD é destinado apenas aos gastos com a passagem, hospedagem e alimentação, limitados ao orçamento do município onde o tratamento será realizado. Como existe chance de os pequenos terem problemas no coração, o valor arrecadado também será utilizado para a realização de exames cardíacos.
A luta de João
Quatro dias depois de nascer, o bebê de um mês João Miguel Serra foi internado na UTI do Hospital Regional de Santa Maria. João teve uma cardiopatia congênita que comprometeu a liberação do sangue pelo ventrículo direito. O problema foi percebido pela médica da maternidade no dia em que a criança teria alta. Ela notou que o pequeno estava respirando mais rápido e com a pele de cor diferente. Até então, ninguém imaginava que o bebê estaria com algum problema. Depois dos exames, a patologia foi detectada.
Quando começou a arrecadação, a mãe do bebê, Núbia Cristina Moreira, 22 anos, não tinha noção de quanto custaria a realização do procedimento em um hospital particular. Ainda segundo Núbia, os médicos informaram que o coração da criança não estava formado e que uma cirurgia seria necessária. ;O cardiologista falou que o corpo dele não ia se adaptar por muito tempo com um problema desses, que ele provavelmente não aguentaria até os três meses de vida e que, quanto mais ele crescesse, mais difícil seria;, relembra Núbia.
A mãe entrou na Justiça para tentar uma vaga no Instituto de Cardiologia do DF (ICDF) ; que também atende pacientes do SUS ;, mas não conseguiu uma vaga. Ainda que o procedimento seja delicado, o cardiologista afirmou à família que as chances de João não sobreviver são bem pequenas. De acordo com o especialista, nos casos em que a cirurgia é realizada, apenas 10 de cada 100 bebês morrem. Núbia também está esperançosa porque o quadro do filho é estável. ;Ele está num berço aquecido. Está sem remédios e, mesmo com a ajuda do oxigênio, ele está mamando, crescendo e ganhando peso;, diz.
A ideia dela é usar o dinheiro da vaquinha on-line para arcar com os gastos da cirurgia em um hospital particular e, devido ao alto custo das diárias para o processo de recuperação, recorrerá à Justiça para conseguir uma vaga no SUS após o procedimento cirúrgico.
Por meio de nota, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal informou que a direção do Hospital Regional de Santa Maria prevê que João Miguel seja removido para o ICDF dentro de algumas horas. A pasta explica que tem seis leitos pediátricos regulados no instituto, porém, todos estão ocupados. A secretaria também afirma que estuda ampliar o atendimento a crianças cardiopatas e desenvolver a proposta de realização de cirurgias de menor complexidade no Hospital da Criança, já que o Instituto de Cardiologia realiza, em média, 18 procedimentos cirúrgicos cardíacos em bebês e crianças todos os meses.
"É importante salientar que a gestão da fila leva em consideração uma série de fatores, entre eles, as condições clínicas do paciente para cirurgia. Mesmo com indicação cirúrgica, o paciente precisa ter peso mínimo e estar livre de infecções pois, nesses casos, apenas serão transferidas para ICDF quando estiverem em condição de cirurgia", descreve a nota.
Para doar
Irani Neres Santana
Caixa Econômica Federal
Agência 0973
Operação 013
Conta-poupança ; 766405-5
Os contatos com Irani e Lucas estão no site criado para o jovem e pode ser acessado clicando aqui
Gêmeos Augusto e Gustavo
Faltam: R$ 98.999
Bebê João Miguel
Faltam: R$ 98.510
* Estagiários sob supervisão de Mariana Niederauer