Mais populosa cidade do Entorno do Distrito Federal, marcada pela violência, pela pobreza e pelo crescimento desordenado, Águas Lindas (GO) começa a desfrutar dos confortos da ascensão econômica das classes C e D. Ainda sem um grande edifício, a cidade de 180 mil habitantes ganhou recentemente o primeiro shopping center. E, com ele, as primeiras escadas rolantes, o primeiro estacionamento com segurança privada, a primeira loja de departamentos, as primeiras salas de cinema e as primeiras lanchonetes fast-food. As mesmas experiências vivenciam os moradores de Luziânia e Alexânia, também goianas e vizinhas de Brasília.
As três cidades seguem o fenômeno nacional da interiorização dos shoppings. No fim de 2014, 50,9% das unidades em operação no país estão fora dos grandes centros urbanos. São 264 no interior, ante 254 em capitais. Há 20 anos, 85% estavam nas principais cidades. O Entorno conta com quatro estabelecimentos. Um quinto está nos planos de uma empreiteira brasiliense para ser construído entre Planaltina e Formosa (GO). Da clientela dos 47 shoppings do Centro-Oeste, 35% são da classe C, 37% pertencem à classe B e 28% à classe A. Os dados vêm da Associação das Empresas de Shopping Centers (Abrasce).
Assim como Águas Lindas, Luziânia e Alexânia, Valparaíso, na divisa com o DF, tem shopping. Primeiro da região, inaugurado em 1993, já passou por expansão. Sob nova administração, de um grupo goiano dono de nove shoppings, todos no interior, foi remodelado em 2008. Com cerca de 100 lojas, o empreendimento é o único de grande porte no Entorno Sul (Valparaíso, Luziânia, Gama, Novo Gama, Santa Maria, Cidade Ocidental e Cristalina), região com cerca de 900 mil habitantes.
Dos quatro shoppings do Entorno, três foram inaugurados em 2012, o que, segundo o professor do Ibmec-DF e doutor em administração Bento Alves da Costa Filho, mostra que a tendência é nova na região. Essa migração, lembra ele, começou nos anos 2000, em São Paulo. “Até o início dos anos 2000, a maioria da população brasileira pertencia à classe D, pobre. Hoje, o país é formado por uma classe média, baixa, mas classe média. E os investidores viram uma oportunidade de negócio”, explica Costa Filho.
O custo-benefício oferecido pelo interior também foi colocado no cálculo dos empresários. Ao contrário dos grandes centros urbanos, que apontam a tendência de saturação, as cidades menores têm mais oferta de terrenos e menos concorrência. “Nas capitais, os preços dos imóveis são altos e exigem investimento pesado para manutenção do empreendimento no mercado. Isso também contou para esse movimento de interiorização dos shoppings”, analisa.
Esse é o caso do outlet instalado em Alexânia. Distante 92km de Brasília, é o primeiro do tipo no DF e no Entorno. A ideia inicial dos investidores era colocar o estabelecimento no perímetro do Distrito Federal, mas a burocracia e o preço dos imóveis levou o investimento para uma cidade menor, com 25 mil moradores.
O presidente da Abrasce, Luiz Fernando Veiga, afirma que a tendência de aumento do número de shoppings fora das capitais é natural, pois o interior ainda tem muito mercado a ser explorado. “Além disso, hoje, para você construir um shopping em uma cidade como São Paulo, você precisa fazer compensações ambientais, viárias etc. No interior, as prefeituras nos recebem de braços abertos, porque um shopping gera emprego, impostos e valoriza a região”, opina.
Segurança
Outro fator que coloca as cidades do interior na mira dos empresários de shopping é a violência urbana, também presente nos municípios menores. Com o perigo nas ruas, o ambiente de segurança criado por um shopping passou a atrair os consumidores. “Quando falamos no Entorno, essa situação de violência torna-se mais evidente. Como as pessoas que vivem nessa região tiveram uma ascensão econômica, elas querem consumir, mas com segurança”, afirma Costa Filho.
A segurança é um dos motivos que levam Ronaldo Matheus, 17 anos, e a vizinha Poliana Yasmin, 26, a visitarem o shopping de Águas Lindas ao menos duas vezes por semana. “Aqui tem tudo, é o ponto de encontro da galera. E podemos ir ao cinema e ficar conversando na praça de alimentação até tarde, sem preocupação, no ar-condicionado”, destaca Ronaldo. “O shopping é o nosso principal ponto de compras e de lazer”, completa Poliana, mãe de três crianças. “Aqui, só falta uma loja de brinquedos”, observa.
O shopping de Águas Lindas tem proporcionado outro movimento novo. Antes uma cidade-dormitório, o município hoje recebe moradores do Distrito Federal que trabalham no centro comercial. Caso de Irene Oliveira, gerente-geral da unidade de uma rede de eletrodomésticos e móveis do DF. Moradora de Ceilândia, ela leva 15 minutos de ônibus de casa ao trabalho. “Vim para cá a pedido do patrão, para puxar as vendas, pois tenho experiência. Vendemos cerca de R$ 360 mil por mês, é o melhor resultado das lojas pequenas da rede, que tem 39 estabelecimentos”, conta ela.
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