postado em 14/12/2015 06:00
Há pouco mais de dois meses à frente do Ministério da Saúde, o peemedebista Marcelo Castro quer fazer uma mudança que ameaça retroceder na política de assistência psiquiátrica no Brasil, segundo entidades e movimentos da área. Na última semana, o ministro anunciou a troca do coordenador-geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas, Roberto Tykanori, pelo psiquiatra Valencius Wurch Duarte Filho. Tykanori, coordenador da área desde 2011, é reconhecido internacionalmente e foi um dos responsáveis por iniciar a reforma do setor no Brasil.
Profissionais repudiam a nomeação e já enviaram carta, inclusive para a Casa Civil, contrária ao novo nome. Há ainda uma petição contra Duarte e um ato nacional marcado para hoje. O receio é de que a nomeação do médico, ex-diretor de um dos maiores hospitais psiquiátricos do Brasil, implique em grave retrocesso na política adotada pelo país, que preza pelo fim dos manicômios. O Ministério da Saúde diz que a indicação é técnica.
Nas últimas décadas, o Brasil tem promovido uma reforma psiquiátrica com o objetivo de mudar a lógica de cuidado ao doente mental e acabar com os hospícios. No lugar deles, passaram a ser instituídos, entre outros, os Centros de Atenção Psicossocial (Caps). O anúncio do novo nome ocorreu durante uma audiência com representantes de cerca de 700 entidades ligadas à luta antimanicomial no Conselho Federal de Psicologia (CFP), convocado para pedir a manutenção de conquistas. O receio é de que Duarte Filho volte atrás no modelo. O médico foi diretor-técnico da Casa de Saúde Dr. Eiras, em Paracambi, no Rio de Janeiro, que já foi o maior hospital psiquiátrico de administração privada da América Latina, de 1994 até 2000, segundo as entidades.
De acordo com os movimentos, o histórico profissional e pessoal de Duarte Filho indicam que ele é contra o modelo atual. O centro dirigido por ele já foi alvo de uma ação do Ministério Público do Rio de Janeiro em 2000, e o hospital foi denunciado no relatório da 1; Caravana Nacional de Direitos Humanos, feita pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, por diversas violações promovidas no local, como eletroconvulsoterapia e falta de roupas, por exemplos. Após uma determinação da Justiça, em 2009, a unidade foi fechada em 2012. Em entrevistas à época da inspeção do MP, Duarte Filho expressou ser contra a reforma.
Carta
Representante da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (Renila), Alyne Alvarez participou da audiência com Castro e disse que o encontro foi convocado para mostrar ao ministro a importância das diretrizes atuais e evitar que ele promovesse mudanças drásticas. ;Quando ele assumiu o cargo, em 5 de outubro, nós já nos preocupamos extremamente com as possíveis mudanças em todas as áreas;, disse. Logo após a audiência, os movimentos subscreveram uma carta para demonstrar preocupação pelo histórico pessoal e profissional de Filho, encaminhada à Casa Civil e também ao Conselho Nacional de Saúde.
A carta é assinada pelas seguintes entidades: Conselho Federal de Psicologia, Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes), Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme), Conselho Regional de Psicologia da 21a Região, Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (IMS-UERJ), Movimento Nacional da Luta Antimanicomial (MNLA) e Renila.
O Sistema Conselhos de Psicologia, formado pelo CFP e pelos Conselhos Regionais, também elaborou moção de repúdio na qual diz que a indicação representa atraso numa política internacionalmente reconhecida, pelo histórico de Duarte Filho como diretor do hospital psiquiátrico, e diz que ele representa interesses de uma política de privatização da saúde. ;A simples indicação deste nome já representa um retrocesso, indo na contramão do consenso internacional sobre o caráter iatrogênico dos hospitais psiquiátricos;, diz o texto.
O Ministério da Saúde informou que a indicação de Duarte Filho é uma nomeação técnica. ;Entre outros cargos e funções na área de saúde mental, o dr. Valencius, por exemplo, foi professor de psiquiatria e coordenador de Internato e Residência da UFF. A indicação, portanto, é técnica;, informou o Ministério.
;Entre outros cargos e funções na área de saúde mental, o dr. Valencius, por exemplo, foi professor de psiquiatria e coordenador de Internato e Residência da UFF. A indicação, portanto, é técnica;
Nota do Ministério da Saúde