Essa semana, estive novamente no emblemático distrito de Serra Pelada, no município de Curionópolis no estado do Pará para mais uma série de trabalhos sociais de campo, atendendo demandas de minha rotina de profissional!
No ritmo do dia, deparamos com a Associação de Empreendedores de Serra Pelada e Região, uma entidade sociocultural, que é movimentada prioritariamente por mulheres, 80 participantes especificamente e que até muito recente era uma entidade, sugestivamente, denominada “Associação das Mulheres Aliadas de Serra Pelada”, um nome forte e que marcou uma importante descoberta, o empreendedorismo na vertente da economia criativa!
Consultando o dicionário, podemos entender a palavra “empreender” sob alguns prismas, entre elas o fato de “pôr em prática, que seria interprender, fazer, executar, efetuar, entreprender, interpresar, realizar” e em uma outra compreensão, podemos entender o termo empreender, também no sentido de “tentar realizar uma tarefa difícil, que nos leva a apostar, ariscar, começar, delinear, entabular, experimentar, iniciar, intentar, procurar, resolver, tentar”.
Bom, com esta pesquisa etimológica, já podemos seguir com nosso conteúdo de hoje! Em uma manhã de trabalho em Serra Pelada, como já disse, conheci mulheres fortes, de todas as idades, muitas delas com vivência antiga da trajetória histórica do garimpo naquele distrito, mas que acreditaram nas suas habilidades e talentos e resolveram se unir, mulheres jovens, adultas e idosas, para pôr em prática a sua expressão feminina no campo do empreendedorismo.
A força feminina criou um movimento inédito em Serra Pelada
Lideradas pela jovem e talentosa Francisca Zacarias Reis, a Fran, a Associação de Empreendedores de Serra Pelada e Região, com a força de mulheres decididamente empreendedoras, e com o domínio de ofícios na costura, nos bordados, na tecnologia e muita determinação, resolveram se mobilizar para iniciarem um trabalho, para aquele momento inovador na vida da maioria delas.
Em um ímpeto grande baseado no empreendedorismo social, a entidade estabeleceu parcerias com empresas atuantes na região, que forneceram antigos uniformes, banners e lonas de painéis promocionais usados, dentre outros insumos e esta foi a matéria prima para que um rico processo de reaproveitamento fosse iniciado dando formas diversas a estes insumos, transformando-os nos mais variados produtos utilitários para o dia a dia, além de peças artesanais e utensílios domésticos.
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Podemos citar entre eles, os conjuntos para banheiro, os jogos americanos, ecobags, sacolas para feiras, mochilas infantis e por aí vai!
As costureiras Maria Irene e a sorridente Eunice Oliveira, mostraram orgulhosas a qualidade dos trabalhos finalizados enquanto a presidente da Associação de Empreendedores de Serra Pelada e Região a Fran, ostentava em seu corpo um modelo das camisetas, que ilustraram a 1ª Feira Serra Pelada Empreendedora, um evento que serviu para a mobilização destas trabalhadoras, além de sensibilizar uma boa parte da comunidade sobre a importância do reaproveitamento de resíduos que geramos diariamente em nossas atividades rotineiras.
Fran, a jovem presidente da entidade, mostrou orgulhosa também os atraentes “mouse pads” personalizados ostentando imagens mundialmente conhecidas das escadarias utilizadas no auge do garimpo em Serra Pelada, jocosamente apelidadas de “escada adeus mamãe”, fazendo uma alusão ao risco diário que aqueles mais de 70 mil trabalhadores corriam, subindo e descendo aquelas estruturas, em uma corrida contra o tempo, onde se arriscavam no maior garimpo a céu aberto do mundo, nos anos 80, para garantir seus vencimentos, visando a sua sobrevivência e de muitas famílias.
Tecnologia no dia a dia em uma estrutura modesta
Ainda sobre o espírito empreendedor da Associação de Serra Pelada, é bom citar, que apesar da estrutura modesta de sua sede, onde trabalham produzindo boa parte desta transformação, pudemos ver, que a tecnologia também já faz parte do dia a dia deste grupo de costureiras, artesãs e especialistas no reaproveitamento de resíduos.
Além das peças fabricadas por meio das técnicas de reciclagem as mulheres empreendedoras fabricam camisetas com estampas do garimpo e imagens especiais de Serra Pelada, além de canecas de louça personalizadas com motivos locais.
Naturalmente não é a primeira iniciativa feminina de empreendedorismo, que conheci, mas é inegável, que uma experiência como esta, emanar de um território tão significativo e que marcou um período importante da história social brasileira, atraiu a minha atenção e me encantou pela simplicidade das pessoas envolvidas e pela determinação estampada em cada rosto que conheci de perto.
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O garimpo em Serra Pelada, ao mesmo tempo que encantou o mundo com imagens muitas vezes assustadoras, no contraponto ilustrou brilhantemente, a força do ouro, atraindo milhares e milhares de pessoas aventureiras, que deram o sangue e muitos, até a vida, ajudando a contar esta parte histórica e instigante do garimpo no Brasil e no mundo!
Trabalho, incentivo e um desafio
Mas quero é voltar a falar sobre o entusiasmo que senti, ouvindo aquelas senhorinhas contando animadas sobre as parcerias, que os trabalhos produzidos ali, estabeleceram com entidades bancárias governamentais e privadas e já conseguem escoar uma significativa fatia de sua produção, para outras regiões do Pará, além de verem seus produtos chegando para comercialização também a São Paulo e a Brasília.
Isso se dá muito em função da prática incentivadora aplicada pelas empresas que fornecem os insumos para a produção das peças. Após a transformação efetivada, as empresas compram a produção e ajudam a promover o sucesso do trabalho.
Entre as inúmeras empreendedoras da associação, uma se destaca pela alegria em promover o distrito de Serra Pelada e claro, fazer acontecer por lá a materialização da possibilidade do distrito se transformar em um destino turístico ainda mais visitado. Admito, um grande desafio, mas não impossível de se concretizar.
Falo de Mara Firmo, uma empresária local, proprietária de uma loja de presentes, que faz parte do grupo de mulheres empreendedoras e representa o distrito na Câmara Empresarial de Turismo da Associação Comercial e Agroindustrial de Curionópolis, no Pará.
Mara lembra emocionada, que ao final do período áureo do garimpo, era comum entre os moradores de lá refletirem sobre o que fazer no futuro, pois muitos “não tinham certeza de que Serra Pelada continuaria existindo sem o movimento garimpeiro”.
Serra Pelada, não só continuou, como abriga entidades bastante dinâmicas, entremeadas de jovens e adultos que se dedicam a produzir cultura nas mais variadas modalidades, zelam pela economia criativa, têm um cuidado enorme em preservar a memória do distrito e se juntam para unidos, promoverem uma maior distribuição de renda, por meio de projetos inovadores, sensatos e factíveis, que amparam muito bem a ousadia de fazer valer ali, a prática do turismo de base comunitária, como parte do processo de diversificação da economia local.
Não bastasse a força do empreendedorismo em Serra Pelada, o distrito ainda possui um expressivo casario remanescente dos tempos do garimpo e que ajudam a ilustrar a compreensão sobre como era a vida no garimpo, abriga um sem-fim de cachoeiras, que contribuem muito com o fluxo de turismo na localidade.
Edital Rouanet Norte
Poderia ficar contando inúmeras passagens que vivenciei por ali em apenas um dia de trabalho de campo, mas teremos outras oportunidades para voltar ao tema Serra Pelada, que carrega um passado interessantíssimo e que não pode ser esquecido tão cedo.
Por hora, aproveito o espaço para ressaltar o espírito empreendedor desta entidade, a Associação de Empreendedores de Serra Pelada, que aceitou o desafio, para apresentarem um projeto cultural, que concorre no Edital Rouanet Norte, publicado pelo Ministério da Cultura e que é voltado para os estados da Região Norte do Brasil com objetivo de favorecer as práticas culturais mais distantes, produzidas fora dos grandes polos, normalmente beneficiados pelos incentivos fiscais, como os eixos sul e sudeste.
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O Edital, publicado com esta finalidade especial, traz uma característica diferenciada, uma vez que já tem os recursos para o financiamento dos projetos contemplados, uma espécie de fundo para o fomento cultural, com recursos advindos de instituições financeiras do governo federal além dos Correios. Um sucesso e já soube, que mais de mil projetos culturais estão concorrendo a esta grande oportunidade regional.
Como disse, ficaria aqui escrevendo páginas e páginas sobre essa gente empreendedora, mas preciso finalizar este material.
Para isso, ressalto a minha crença no povo brasileiro, reforço os créditos ao potencial cultural e turístico do nosso país e louvo as figuras importantes, que se movimentam e fazem as coisas acontecerem.
Encerro este texto, homenageando as Marias, as Irenes, as Eunices, as Franciscas, as Maras e todas as pessoas, que acreditam no seu potencial criativo e se oferecem para promover desenvolvimento humano, com respeito ao conhecimento popular e desafiam as dificuldades de mercado fazendo valer a força da união de pessoas comuns, que querem e fazem a transformação social acontecer!
Salve o povo brasileiro!
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