
Cientistas da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, anunciaram um avanço que pode revolucionar a computação de alta performance ou supercomputação, destinada à solução de desafios complexos ou de volumes elevados, como grandes quantidades de cálculos detalhados. A pesquisa verificou que ondas magnéticas — denominadas "ondas de spin" — transmitem informações em redes complexas. A inovação também pretende criar uma geração de computadores mais econômicos e resistentes à temperatura ambiente, uma alternativa aos computadores quânticos.
Por enquanto, as pesquisas aperfeiçoam a técnica e o funcionamento do sistema. Não há estimativa para colocar as máquinas no mercado nem previsão de preços. Os computadores quânticos são muito utilizados para resolver os chamados problemas de otimização combinatória que buscam uma resposta exata para determinado problema. Esse sistema faz numerosos cálculos de inteligência artificial (IA) e consome grande quantidade de energia. Por meio das ondas de spin, os pesquisadores estão confiantes na solução da produção de um dispositivo tão eficiente quanto o tradicional.
"A spintrônica tem o potencial de impactar muitos campos diferentes, desde inteligência artificial e até telecomunicações e sistemas financeiros. A capacidade de controlar e manipular ondas de spin na nanoescala pode levar ao desenvolvimento de sensores mais poderosos e eficientes, inclusive, máquinas de negociação de ações de alta frequência", analisa o líder da pesquisa Akash Kumar, do Departamento de Física da Universidade de Gotemburgo.
Tecnologia
Essa inovação se apoia na spintrônica, tecnologia que aproveita o momento magnético dos elétrons para processar e transferir dados. A partir da manipulação de materiais ultrafinos expostos a campos magnéticos e correntes elétricas, os pesquisadores conseguiram gerar e controlar ondas de spin com precisão.
Um dispositivo de Ising é um novo tipo de sistema computacional que imita como os spins magnéticos em um material físico se organizam para atingir um estado estável. É usado principalmente para resolver problemas complexos de otimização de forma eficiente. Em vez de calcular passo a passo como em computadores convencionais, os muitos pequenos "spins" do sistema trabalham juntos para encontrar rapidamente a melhor solução.
A máquina de Ising é programada pela força das conexões entre os diferentes spins. Se o acoplamento for positivo, os spins apontarão na mesma direção (em fase) e se for negativo, eles apontarão na direção oposta (fora de fase). A solução para o problema é então lidar como a direção final de todos os diferentes spins depois que eles foram alinhados de forma ideal.
O resultado abre caminho para a evolução das chamadas máquinas de Ising, projetadas para resolver problemas complexos de otimização, como os encontrados em inteligência artificial. Diferentemente dos computadores convencionais, essas máquinas buscam rapidamente soluções eficientes, consumindo menos energia e ocupando menos espaço.
Na prática, os pesquisadores acreditam que, a partir desse projeto, os cientistas aguardam soluções mais eficientes mais sustentáveis. A expectativa é enfrentar desafios complexos com rapidez e eficiência, sem exigir a infraestrutura sofisticada dos sistemas quânticos atuais.
Perspectivas
O pesquisador e professor Akash Kumar, principal autor do estudo, ressaltou que o esforço é para buscar um sistema econômico e funcional, o que, na opinião dele, está bastante próximo. "Com a ajuda das ondas de spin, estamos mais perto de criar sistemas de computação altamente eficientes e de baixo consumo de energia que podem resolver problemas do mundo real."
Publicado na revista Nature Physics, o estudo prevê a ampliação da escala da tecnologia, criando redes com milhares de osciladores capazes de integrar desde supercomputadores até dispositivos portáteis, como celulares. Graças ao tamanho reduzido e ao baixo consumo energético, essas estruturas podem ser incorporadas facilmente a sistemas maiores ou adaptadas a aparelhos compactos.
A spintrônica também promete impactos em diversas áreas, incluindo telecomunicações e finanças. A possibilidade de controlar ondas magnéticas na escala nanométrica pode levar ao desenvolvimento de sensores avançados e tecnologias de processamento ultrarrápido, além de otimizar operações como negociações financeiras automatizadas.
Spintrônica ou magnetoeletrônica
A spintrônica ou magnetoeletrônica é uma tecnologia que usa o spin dos elétrons para processar e armazenar informações. Na eletrônica tradicional trabalha-se apenas com 0 e 1, enquanto na spintrônica, os elétrons coexistem em uma combinação desses estados ao mesmo tempo, o que aumenta a capacidade de processamento. Essa tecnologia possibilita avanços, como a leitura e gravação mais rápida em discos rígidos. Com a resistência magnética gigante (GMR) houve uma redução da resistência elétrica ao alinhar o spin dos elétrons com um campo magnético, permitindo maior fluxo de corrente e, consequentemente, melhor desempenho dos dispositivos de armazenamento. Também viabiliza memórias, tornando os computadores mais eficientes.
Três perguntas para: Lucas Francisco Wanner do Instituto de Computação da Unicamp e pós-graduado em Ciência da Computação
Em termos de otimização de problemas complexos, como as máquinas de Ising poderiam ser aplicadas em áreas específicas, como logística, finanças ou até em pesquisas científicas
no Brasil?
Por exemplo, um entregador precisa fazer 10 entregas diferentes e quer encontrar a rota (e a ordem das entregas) mais rápida. À medida que o número de entregas cresce, o número de combinações possíveis aumenta exponencialmente. No caso das 10 entregas, já temos centenas de milhares de ordenações possíveis. Com 20 endereços, o número de possibilidades é tão grande que não é mais viável testar todas com um computador convencional, e usamos heurísticas — métodos que testam apenas parte das possibilidades e encontram uma solução boa, mas não necessariamente a melhor. Diferentemente de um computador tradicional, que avalia uma solução de cada vez, as máquinas de Ising conseguem explorar muitas possibilidades em paralelo, de forma inspirada em fenômenos físicos. Assim como as heurísticas, elas não garantem a melhor solução, mas conseguem encontrar boas soluções de forma rápida e eficiente, mesmo em problemas muito difíceis. No Brasil, aplicações promissoras incluem logística (como rotas de transporte ou entrega), finanças (como otimização de investimentos), inteligência artificial, e pesquisas em áreas como biologia e medicina.
A spintrônica pode oferecer uma alternativa de baixo custo e eficiente ao processamento convencional de dados. Como o Brasil pode se preparar para adotar e desenvolver essas tecnologias, especialmente em setores industriais e acadêmicos?
Essas tecnologias ainda estão em fase de pesquisa e sua aplicação prática ainda pode demorar um pouco. No entanto, é fundamental investir em pesquisa desde já, para que o país possa dominar as tecnologias e contribuir para sua viabilização no futuro.
Como a manipulação das ondas de spin pode contribuir para o desenvolvimento de sistemas computacionais de baixo consumo energético e que operem em temperatura ambiente no contexto brasileiro?
Os computadores tradicionais consomem grandes quantidades de energia para tarefas como aprendizado de máquina (como o ChatGPT) e problemas de otimização. Diversos grupos de pesquisa no Brasil estão explorando novos modelos de computação com potencial para reduzir esse consumo. Isso inclui pesquisas com máquinas de Ising, computação quântica, e computação aproximativa, que utilizam circuitos convencionais projetados para dar respostas aproximadas, mas com menor consumo de energia do que os circuitos tradicionais que entregam resultados exatos.
Solução rápida
Um computador quântico é um tipo que usa as leis da física quântica para processar informações. Diferentemente dos sistemas clássicos, que utilizam bits (que representam 0 ou 1), nos quânticos, a referência são os qubits — que têm capacidade de estar em múltiplos estados ao mesmo tempo, a superposição. O que permite que façam cálculos de forma paralela e resolvam problemas de forma mais rápida do que as máquinas tradicionais, sobretudo em criptografia, simulação de moléculas e otimização.
Os qubits podem interagir entre si de uma maneira denominada de "emaranhamento quântico", o que aumenta ainda mais a potência de processamento. A combinação dessas propriedades faz com que os computadores quânticos tenham um grande potencial para resolver problemas extremamente complexos, que seriam impossíveis ou levariam milhares de anos para serem resolvidos por computadores clássicos.
Os computadores quânticos ainda estão em desenvolvimento, com muitos desafios em termos de estabilidade e escalabilidade — quando há aumento ou diminuição da demanda sem comprometer o rendimento.
Atualmente, são usados para experimentos e tarefas muito específicas. Já os tradicionais seguem como ferramenta para o uso cotidiano.
*Estagiária sob supervisão de Renata Giraldi
Saiba Mais
Três perguntas para
Lucas Francisco Wanner
do Instituto de Computação da Unicamp e pós-graduado em Ciência da Computação
Em termos de otimização de problemas complexos, como as máquinas de Ising poderiam ser aplicadas em áreas específicas, como logística, finanças ou até em pesquisas científicas
no Brasil?
Por exemplo, um entregador precisa fazer 10 entregas diferentes e quer encontrar a rota (e a ordem das entregas) mais rápida. À medida que o número de entregas cresce, o número de combinações possíveis aumenta exponencialmente. No caso das 10 entregas, já temos centenas de milhares de ordenações possíveis. Com 20 endereços, o número de possibilidades é tão grande que não é mais viável testar todas com um computador convencional, e usamos heurísticas — métodos que testam apenas parte das possibilidades e encontram uma solução boa, mas não necessariamente a melhor. Diferentemente de um computador tradicional, que avalia uma solução de cada vez, as máquinas de Ising conseguem explorar muitas possibilidades em paralelo, de forma inspirada em fenômenos físicos. Assim como as heurísticas, elas não garantem a melhor solução, mas conseguem encontrar boas soluções de forma rápida e eficiente, mesmo em problemas muito difíceis. No Brasil, aplicações promissoras incluem logística (como rotas de transporte ou entrega), finanças (como otimização de investimentos), inteligência artificial, e pesquisas em áreas como biologia e medicina.
A spintrônica pode oferecer uma alternativa de baixo custo e eficiente ao processamento convencional de dados. Como o Brasil pode se preparar para adotar e desenvolver essas tecnologias, especialmente em setores industriais e acadêmicos?
Essas tecnologias ainda estão em fase de pesquisa e sua aplicação prática ainda pode demorar um pouco. No entanto, é fundamental investir em pesquisa desde já, para que o país possa dominar as tecnologias e contribuir para sua viabilização no futuro.
Como a manipulação das ondas de spin pode contribuir para o desenvolvimento de sistemas computacionais de baixo consumo energético e que operem em temperatura ambiente no contexto brasileiro?
Os computadores tradicionais consomem grandes quantidades de energia para tarefas como aprendizado de máquina (como o ChatGPT) e problemas de otimização. Diversos grupos de pesquisa no Brasil estão explorando novos modelos de computação com potencial para reduzir esse consumo. Isso inclui pesquisas com máquinas de Ising, computação quântica, e computação aproximativa, que utilizam circuitos convencionais projetados para dar respostas aproximadas, mas com menor consumo de energia do que os circuitos tradicionais que entregam resultados exatos.
Solução rápida para problemas complexos
Um computador quântico é um tipo que usa as leis da física quântica para processar informações. Diferentemente dos sistemas clássicos, que utilizam bits (que representam 0 ou 1), nos quânticos, a referência são os qubits — que têm capacidade de estar em múltiplos estados ao mesmo tempo, a superposição. O que permite que façam cálculos de forma paralela e resolvam problemas de forma mais rápida do que as máquinas tradicionais, sobretudo em criptografia, simulação de moléculas e otimização.
Os qubits podem interagir entre si de uma maneira denominada de "emaranhamento quântico", o que aumenta ainda mais a potência de processamento. A combinação dessas propriedades faz com que os computadores quânticos tenham um grande potencial para resolver problemas extremamente complexos, que seriam impossíveis ou levariam milhares de anos para serem resolvidos por computadores clássicos.
Os computadores quânticos ainda estão em desenvolvimento, com muitos desafios em termos de estabilidade e escalabilidade — quando há aumento ou diminuição da demanda sem comprometer o rendimento.
Atualmente, são usados para experimentos e tarefas muito específicas. Já os tradicionais seguem como ferramenta para o uso cotidiano. (RB)
Spintrônica ou magnetoeletrônica
A spintrônica ou magnetoeletrônica é uma tecnologia que usa o spin dos elétrons para processar e armazenar informações. Na eletrônica tradicional trabalha-se apenas com 0 e 1, enquanto na spintrônica, os elétrons coexistem em uma combinação desses estados ao mesmo tempo, o que aumenta a capacidade de processamento. Essa tecnologia possibilita avanços, como a leitura e gravação mais rápida em discos rígidos. Com a resistência magnética gigante (GMR) houve uma redução da resistência elétrica ao alinhar o spin dos elétrons com um campo magnético, permitindo maior fluxo de corrente e, consequentemente, melhor desempenho dos dispositivos de armazenamento. Também viabiliza memórias, tornando os computadores mais eficientes.