No rastro das mudanças climáticas, a combinação de urbanização e do aquecimento global leva ao aumento das temperaturas nas cidades e agrava a intensidade de eventos de calor extremo. Em busca de soluções, a Universidade de Surrey, no Reino Unido, conduziu um amplo estudo em que sugere a adoção das chamadas infraestruturas urbanas verde-azul-cinza (GBGI) nas cidades. São parques, projetos de telhados e paredes "naturais", que têm o potencial de melhorar o clima nas áreas urbanas.
Os cientistas concluíram que as GBGIs são capazes de registrar o resfriamento da temperatura entre 3,5ºC e 5ºC, após revisar 27 mil pesquisas e concentrar em 202. O artigo sobre o trabalho, denominado Urban heat mitigation by green and blue infrastructure: drivers, effectiveness, and future needs (Mitigação do calor urbano por meio de infraestruturas verdes e azuis: motivadores, eficácia e necessidades futuras, em português), publicado na revista científica The Innovation, com a participação de pesquisadores da Austrália, do Brasil, da China, dos Estados Unidos e do Reino Unido.
Para a especialista em poluição atmosférica Maria de Fátima Andrade, professora de geociências do Departamento de Física da Universidade de São Paulo (USP) e uma das autoras do estudo, é fundamental observar como a vegetação não só ajuda a controlar o aumento de temperaturas, como recupera áreas destruídas no perímento urbano. Ela ressalta que essa é uma alternativa a ser associada a outras em busca de soluções para as mudanças climáticas.
Soluções globais
"É um problema que soluções locais não resolvem. Mas seria extremamente útil para mitigar o impacto de ilhas de calor em áreas urbanas, amenizando as temperaturas. É importante destacar que, em algumas áreas, há falta de parques, de áreas verdes e as construções não mantêm áreas dedicadas à presença de vegetação", destaca a física, acrescentando que as GBGIs colaboram ainda para o equilíbrio hídrico, a prevenção de alagamentos e a preservação da natureza. "É uma proteção (também) contra os excessos de temperatura e chuva."
Conforme a pesquisa, é urgente a adoção de medidas, como a sugerida via GBGI, uma vez que projeções de altas emissões de gases de efeito estufa indicam que, até o fim do século, as alterações climáticas vão mudar por completo o cenário atual. Cidades que têm clima temperado, por exemplo, poderão enfrentar condições mais áridas. Diante dos prognósticos, é necessário examinar alternativas que combinam inovação tecnológica com sustentabilidade ambiental.
Os cientistas advertem ainda que, embora os resultados sejam promissores, há dificuldades para levar adiante o projeto. São necessários investimentos elevados para transformar, por exemplo, zonas úmidas e jardins botânicos subutilizados. Para os pesquisadores, é preciso priorizar políticas públicas destinadas ao tema, ampliando, por exemplo, o orçamento. Paralelamente, é necessário trabalhar a conscientização da sociedade, envolvendo todos os setores.
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Há soluções simples e menos onerosas, segundo os pesquisadores, como paredes e telhados verdes, que podem ser integrados aos edifícios. Áreas já instaladas, como parques e zonas úmidas, são apontadas como soluções ideais para resfriamento, pois contribuem para a gestão de enchentes e a preservação da biodiversidade. O envolvimento da população no planejamento dessas soluções é crucial para garantir que essas atendam às necessidades locais e promovam o engajamento comunitário.
Ilhas de calor dominam as cidades
O estudo mostra que as cidades no Brasil e no mundo foram invadidas por ilhas de calor, áreas de concreto que absorvem e retêm calor, aumentando as temperaturas, especialmente à noite. Esse efeito, combinado com as mudanças climáticas globais, aumenta a frequência e a intensidade de ondas de calor, que impactam na saúde pública, na economia e na qualidade de vida como um todo. De 1998 a 2017, mais de 166 mil mortes em todo o mundo foram atribuídas a essas ondas.
Em 2003, o fenômeno atingiu intensamente a Europa, causando mais de 70 mil mortes e prejuízos econômicos no setor agrícola, principalmente, devido à seca prolongada. Diante desse cenário, o estudo Urban heat mitigation by green and blue infrastructure: Drivers, effectiveness, and future needs (Mitigação do calor urbano por meio de infraestruturas verdes e azuis: motivadores, eficácia e necessidades futuras, em português) destaca que áreas que incluam paredões verdes e uma extensão moderada de água são ferramentas essenciais no combate ao aquecimento urbano.
Essas infraestruturas atuam colaborando com a evaporação, a transpiração e o sombreamento, resfriando o ambiente e criando microclimas mais agradáveis. Entre as soluções analisadas, os jardins botânicos, zonas úmidas e árvores urbanas se destacam como as mais eficazes, com redução de até 5 °C em áreas demograficamente mais densas.