Júlia Moita*
Na busca por soluções para ampliar o acesso à água potável, pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology (MIT) criaram um dispositivo promissor. O sistema coleta a umidade no ar de lugares áridos, transformando-a em água potável. A equipe afirma que o coletor produz, por dia, até 1,3 litro de água limpa e pronta para o consumo. O estudo foi publicado na Analytical Chemistry.
O projeto do coletor de água atmosférica multicíclico é compacto e de alto desempenho para ambientes áridos, uma tecnologia que pode proporcionar água para consumo, irrigação e demais alívios da seca global. No interior, há um conjunto de 10 pequenas aletas verticais de 2 milímetros de distância uma da outra, feitas de folhas e espumas de cobre e revestidas com um material zeólito especializado, usualmente empregado para absorção de água.
Acionado, o dispositivo captura a umidade e coleta água do ar seco, várias vezes por dia. Em processo de aperfeiçoamento, a ideia é que o sistema se integre a infraestruturas que produzem calor residual, como edifícios ou veículos de transporte, para fornecer uma opção econômica na produção de água potável em regiões áridas.
Uma vez que o material adsorvente está saturado de água, as camadas são aquecidas. O vapor gerado do aquecimento é, então, coletado e resfriado separadamente, de forma que a água removida da atmosfera seja condensada e armazenada em recipientes fechados para posterior consumo.
Análise
Xiangyu Li, participante do estudo e professor assistente da Universidade do Tennessee Knoxville, nos Estados Unidos, explica que o objetivo é ampliar o acesso à água potável de forma prática e eficiente. "Compreender quais os materiais adsorventes são adequados para tornar o processo mais rápido e eficiente, para que possamos captar diariamente maior quantidade de água do ar úmido."
Os resultados dos testes do dispositivo estão de acordo com a expectativa de design e o propósito de produzir mais água diariamente, mesmo em regiões áridas. "Utilizando o calor residual, podemos recolher água para beber ou para outras aplicações diretamente do ar ambiente, para aliviar a escassez global de água, especialmente em regiões secas com abastecimento de água limitado, como regiões desérticas", complementa Li.
A tecnologia de coleta de água a partir da umidade do ar já existe há alguns anos, a exemplo dos sistemas que retêm orvalho ou neblina, acumulando o líquido em recipientes. Quando se trata da coleta em áreas secas, é preciso utilizar materiais específicos, como hidrogéis sensíveis à temperatura, já que ajudam a puxar pequenas quantidades de umidade do ar e liberam a água quando aquecida. Mas é preciso que os materiais sejam incorporados a dispositivos compactos e portáteis com uma fonte de calor residual.
Diego Freitas, analista químico do Conselho Federal de Química (CFQ), observa que o equipamento descrito no artigo é composto por camadas de materiais que adsorvem grandes quantidades de umidade em suas superfícies, "como ocorre com a sílica gel que vem dentro de caixas de sapatos, por exemplo".
"O diferencial da tecnologia é que pode utilizar ativamente painéis fotovoltaicos para transformar a energia solar em elétrica, assim como outras fontes de energia", diz Freitas. "Isso permite a operação em múltiplos ciclos de adsorção e dessorção ao longo de um único dia, aumentando de duas a cinco vezes a produção diária de água em comparação com os outros equipamentos passivos", acrescenta o especialista.
Para o futuro, as perspectivas são otimistas. "Esperamos também integrar materiais mais inovadores e construir um dispositivo abrangente. Atualmente ainda está na fase inicial de pesquisa e esperamos trazer o conceito para beneficiar o público em geral", ressalta Xiangyu Li.
*Estagiária sob supervisão de Renata Giraldi
Saiba Mais
Glossário
Adsorvente: capacidade de efetuar, em sua superfície, a adesão de moléculas insolúveis dispersas em um meio líquido ou gasoso.
Adsorção: fenômeno em que átomos, moléculas ou íons introduzem-se em uma fase mais massiva, e fixam-se. O processo pode se dar pela fixação de um gás por um sólido ou um líquido, ou pela fixação de um líquido por um sólido.
Dessorção: a liberação de uma substância ou material de uma interface entre uma superfície sólida e uma solução
Inovação para regiões áridas
Uma forma de explicar as mudanças climáticas é imaginar que uma casa grande tem seu calor normal, o efeito estufa. A mudança do clima vem quando o calor dentro de casa começa a aumentar porque, de alguma forma, estamos fazendo algo diferente, como cozinhar, fechar as janelas e não abrir as portas. Isso tudo gera uma mudança no clima. O que acontece na atmosfera é a mudança do padrão de comportamento ao qual estávamos acostumados. Mas, com a intensidade dos processos humanos de industrialização, esses gases cresceram tanto em volume que afetam a distribuição de radiação solar dentro da Terra, o que ocasiona o aquecimento global. Acredito que esse dispositivo possa beneficiar zonas áridas, inclusive neste cenário de mudança dos climas e perspectivas até 2100. No Distrito Federal, seria crucial, já que estamos em expansão das zonas urbanas.
André Souza, coordenador de Enfrentamento às Mudanças Climáticas na Secretaria de Meio Ambiente e Proteção Animal (SEMA) do Distrito Federal
Origami é aliado em soluções 3D
Inspirados nas dobraduras de origami, pesquisadores da Universidade de Tel Aviv, em Israel, desenvolveram uma solução original e criativa para um impasse que tem limitado pesquisadores no mundo todo: a dificuldade em posicionar sensores dentro de modelos de tecido bioimpressos em 3D. Por meio da inovação, os sensores projetam e produzem uma estrutura inspirada em origami que se dobra ao redor do tecido fabricado, permitindo a inserção de sensores em locais predefinidos. A tecnologia também é promissora no desenvolvimento de medicamentos.
As técnicas de impressão de modelos de tecidos biológicos para pesquisa já são amplamente difundidas, mas apresentam limitações. Em tecnologias existentes, a "cabeça" da impressora se move para frente e para trás, imprimindo camada sobre camada do tecido necessário. O método, no entanto, tem uma desvantagem significativa: o tecido não pode ser bioimpresso sob um conjunto de sensores necessários para fornecer informações sobre suas células internas, porque, no processo de impressão, a "cabeça" quebra os sensores.
Segundo o estudo publicado na Advanced Science, a plataforma multissensorial inspirada na arte do origami supera esses desafios ao "dobrar" em torno de uma estrutura de tecido 3D fabricada separadamente. No caso, a novidade permite a inserção de eletrodos em locais precisos, que são definidos de forma personalizada usando software de design auxiliado por computador.
Sensibilidade
Ben Maoz, autor do estudo e professor do Departamento de Engenharia Biomédica da Universidade de Tel Aviv, diz que a inspiração na arte japonesa foi motivada pela necessidade de aumentar a sensibilidade. "O conceito do origami surgiu à medida que criamos uma plataforma de sensoriamento em 2D, e, após dobrá-la, a nova estrutura 3D possui sensores em uma posição 3D que fica nos lugares exatos em que gostaríamos que estivessem."
"Se você pensar bem, é como se tivéssemos um pedaço de papel, que é 2D, e, uma vez dobrado, podemos criar estruturas 3D únicas que possuem uma orientação específica", ressalta.
Baseada em ciência e arte, o software de design CAD (Computer Aided Design) auxilia os pesquisadores a projetarem uma estrutura multissensorial personalizada para um modelo de tecido específico, no caso, inspirado na dobradura de papel origami. Essa estrutura incorpora vários sensores para monitorar a atividade elétrica ou a resistência das células em locais previamente escolhidos no interior do tecido, garantindo seu bom funcionamento.
Personalização
Aleson Pereira de Sousa, biomédico e mestre em Biologia Celular e Molecular, explica que a utilização de técnicas de Origami na bioimpressão 3D permite uma personalização precisa dos dispositivos médicos para que eles se ajustem melhor às necessidades individuais dos pacientes, aprimorando a eficácia dos tratamentos e reduzindo o risco de complicações.
"Assim como o papel de origami pode ser dobrado sem perder sua integridade, materiais biocompatíveis utilizados na bioimpressão 3D podem ser projetados para dobrar de maneiras específicas, mantendo a funcionalidade e a durabilidade necessárias para aplicações médicas", diz.
Para Sousa, o futuro está ligado a soluções como esta do origami. "Essa técnica, quando bem estabelecida, testada e aprimorada, poderá ser o futuro de grandes intervenções atuais na saúde de diversos pacientes", diz: "Implantes cardiovasculares, regeneração de tecidos, implantes ortopédicos, dispositivos para liberação de medicação controlada, dispositivos para diagnóstico clínico mais preciso e menos invasivo e a grande busca dessa área que é o desenvolvimento de órgãos funcionais para transplantes."
Na fase de testes, a equipe fez uma prova de conceito, medindo e monitorando a atividade elétrica das células cerebrais, em que foi verificada a permeabilidade da barreira hematoencefálica, um importante parâmetro.
Como resultado, foi comprovado que a tecnologia é capaz de resolver muitos impasses existentes no uso de tecidos bioimpressos, como o monitoramento das funcionalidades em tecidos, integração de diferentes tipos de tecidos, e a indução e imitação do fluxo no sistema 3D. (J.M.)
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"A relação entre origami e bioimpressão 3D está no uso de princípios de dobragem e design origami para criar estruturas complexas e funcionais na área biomédica"