Estudos com diversos astronautas e turistas espaciais indicam que até mesmo viagens curtas para o espaço podem modificar o organismo humano — mais especificamente, os telômeros, estruturas que ficam na ponta dos cromossomos e protegem o DNA das células.
Até hoje, cerca de 600 pessoas já saíram da Terra, com a maioria sendo homens de meia-idade em missões curtas, durando menos de 20 dias. Com o surgimento de cada vez mais empresas e multinacionais voltadas ao ramo das viagens espaciais, estas com as mais variadas durações, pessoas cada vez mais diversas devem ir à órbita do planeta.
Isso inclui diversidade de gênero, etnia e idade, mas especialmente de saúde — especialistas, como Susan Bailey, da Universidade Estadual do Colorado, estudam os efeitos causados pelo espaço no corpo dos humanos, e afirmam que cada corpo reage de forma diferente. Mesmo assim, alguns efeitos são generalizados.
O espaço e os telômeros
Um dos estudos mais famosos aconteceu em 2019, quando o astronauta americano Scott Kelly foi ao espaço para ficar um ano na Estação Espacial Internacional enquanto seu irmão gêmeo, Mark Kelly, também astronauta, ficou na Terra.
A pesquisa integrou o Atlas Médico e Ômico do Espaço, a maior compilação de dados, repositórios e protocolos sobre a medicina e biologia aeroespacial, alimentado por mais de 100 instituições.
Ao estudar amostras de sangue dos gêmeos, Bailey e seus colegas descobriram que os telômeros de Scott se alongaram durante a jornada espacial, se encurtando rapidamente quando retornou ao planeta — e continuaram em estado encurtado após o evento.
É normal que essas estruturas fiquem curtas quando envelhecemos, geralmente por conta do estresse, e esse fenômeno serve como indicador biológico para o risco de desenvolver algumas doenças ligadas à idade, como demência, doenças vasculares e câncer.
Outro estudo, feito em 2020, analisou 10 astronautas em missões de seis meses a bordo da ISS, com homens e mulheres de diversas idades com grupos para comparação na Terra. O comprimento dos telômeros foi medido antes, durante e depois da viagem ao espaço, mostrando haver mais deles encurtados após a viagem.
Para ir mais a fundo, a equipe também estudou alpinistas que se aventuraram no Monte Everest, e, para sua surpresa, seus telômeros também ficaram encurtados em relação a seus gêmeos no nível do mar — isso indica que o problema não é a microgravidade espacial, mas sim, outro elemento, como a radiação.
O que diz aos pesquisadores que radiação pode ter um papel nisso é o fato de que os telômeros são sensíveis ao estresse oxidativo. A radiação espacial expõe astronautas a dano oxidativo crônico, o que pode estar causando o alongamento e posterior encurtamento da estrutura.
Além disso, um estudo com astronautas da missão Inspiration4, da SpaceX, mostrou que níveis do RNA telomérico (chamado de TERRA) estavam maiores em seu corpo, o que também foi notado nos alpinistas. Telômeros possuem muitos trechos de DNA repetitivo, que são copiados para os TERRA.
Estes contribuem para a estrutura dos telômeros e os ajuda a fazer o seu trabalho, e parecem estar sendo danificados pelas viagens espaciais. Resta aos pesquisadores estudar os telômeros para entendê-los melhor e saber como estão relacionados com o envelhecimento. Isso poderá ajudar humanos a sobreviver por longas viagens espaciais, o que será necessário para colonizar e prosperar em outros planetas.
Para tal, precisaremos nos reproduzir e crescer no espaço — e não sabemos se isso sequer é possível ainda. Estudos como esse poderão responder essas e outras perguntas relacionadas ao DNA humano no espaço.
Fonte: Precision Clinical Medicine, Communications Biology, Cell Reports, Science