Bioeletrônicos

Sensores ultrafinos captam partículas no ar

A ideia é utilizá-los para detectar sinais biológicos e monitorar a qualidade do ar. A fibra 50 vezes mais fina do que um fio de cabelo cuja aderência já foi testada

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postado em 15/07/2024 06:00

Karin Santin*

Inspirados em teias de aranha e fios de cabelo, sensores bioeletrônicos ultrafinos foram desenvolvidos por pesquisadores da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. A ideia é utilizá-los para detectar sinais biológicos e monitorar a qualidade do ar. Publicado na Nature Electronics, o trabalho do grupo de cientistas, liderado por Yan Yan Sherry Huang, criou uma fibra 50 vezes mais fina do que um fio de cabelo cuja aderência foi testada em plantas, embriões de pintinho e dedos humanos.

Nos testes, os fios se adaptaram bem às superfícies, preservando a capacidade de realizar trocas normais com o ambiente. Os pesquisadores trabalharam para criar um material pouco invasivo capaz de fazer o acompanhamento de sinais fisiológicos ou ambientais. O artigo destaca a aplicabilidade do dispositivo em medicina, monitoramento ambiental, indústria têxtil e eletrônicos.

"A escala de tempo para a aplicação poderia começar na área de de Inovação e Desenvolvimento (I&D) no espaço de 2 a 3 anos, depois na medicina, monitoramento ambiental e indústria no intervalo de 4 a 6 anos", estima Huang. 

A colocação da fibra foi inspirada na forma de tecelagem utilizada pelas aranhas, em que a disposição dos fios se baseia na organização espacial de que se dispõe no momento: a chamada abordagem in situ, como explicado no estudo. A técnica utiliza uma máquina que adiciona cada camada de fibra com um movimento circular, o que permite uso sob medida de material.

Feitos com um material capaz de conduzir sinais elétricos (polímero condutor), os fios desenvolvidos são usados em associação com eletrodos para captar e transmitir os sinais desejados. Para avaliar o funcionamento do sensor, a equipe de Cambridge fez a auferição de impulsos elétricos cardíacos (eletrocardiograma).

"O elétrodo metálico é uma fita de cobre colocado na unha. As fibras bioeletrônicas são enroladas em torno dela e do restante do dedo. Assim, os impulsos são captados pelas fibras, transportados à fita de cobre e, por fim, entregues a um medidor de leitura para visualização", esclarece Huang. 

Nanofibras 

Pesquisas que abordam materiais em forma de nanofibras e medições elétricas já foram realizadas, inclusive, nacionalmente. Mas a aplicação in situ testada em Cambridge é um diferencial, como confirma Maria Luisa Braunger, pesquisadora colaboradora no Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP).

"Deposição de sensores sobre folhas de plantas ou protótipos em tecido epitelial são factíveis com as técnicas comumente utilizadas na área de desenvolvimento de sensores. O método de fabricação sobre uma interface biológica complexa, como a ponta do dedo de uma pessoa, é algo inovador e talvez não amplamente praticado no Brasil", explica Braunger.

A fibra produzida é constituída por uma solução à base de água, que combina um polímero condutor biocompatível (Pedot:PSS), ácido hialurônico e óxido de polietileno. Essa composição torna seus fios biocompatíveis e hidrofílicos, o que permite sua fácil remoção com água uma vez finalizada sua vida útil.  Para reforçar a durabilidade do material, os cientistas recomendam revestimentos com materiais complementares, como uma camada de filme de celulose.

Braunger chama atenção para a diferença de materiais biocompatíveis e biodegradáveis. Biocompatibilidade se refere ao uso em contato com sistemas biológicos sem causar efeitos adversos. Materiais biodegradáveis, por outro lado, são aqueles possíveis de se decompor sem causar danos ao meio ambiente.  "O polímero utilizado no trabalho da professora Huang (Pedot:PSS) é biocompatível, mas não é biodegradável.", conclui a pesquisadora do LNNano.

Os pesquisadores também testaram os sensores para monitoramento ambiental, quando foram  combinados com uma pequena luz de LED sobre a folha de uma planta. Em condições normais a luz permanecia acesa, mas diminui após exposição à amônia devido ao afrouxamento da fibra reagindo à substância. "[Foi possível] detectar níveis de poluentes em plantas, proporcionando um sistema de alerta precoce para contaminação ambiental", ressalta Braunger. 

Outra possibilidade de aplicação é com a adição dos sensores a luvas de algodão e a incorporação desses sensores à indústria têxtil para criar roupas inteligentes. Esse uso poderia ser expandido também para a área de realidade virtual e videogames, detalhes preservados por motivos de confidencialidade, segundo a pesquisadora. 

Sinais bioelétricos

A rede elétrica do corpo humano está associada às reações que ocorrem entre os elementos químicos nele presentes em nível celular. Essas substâncias interagem entre si e a dissolução de seus átomos gera partículas eletricamente carregadas, os chamados íons. A circulação e interação de íons com diferentes potenciais elétricos no organismo gera uma certa corrente, de forma similar ao que acontece com um conjunto de pilhas.

Tal atividade emite os chamados sinais bioelétricos, como batimentos cardíacos ou a atividade muscular, que podem ser captadas com a colocação de eletrodos em contato direto com a pele. A informação obtida na primeira captação passa por uma filtragem para garantir a precisão de dados. Os sinais de origem são analógicos, portanto devem passar por uma conversão digital para serem processados por computadores. Com base nos padrões dos dados digitais, transcreve-se as informações de forma compreensível, como em um gráfico que representa a atividade cardíaca.

*Estagiária sob supervisão de Renata Giraldi

 

 


Sinais biolétricos

A rede elétrica do corpo humano está associada às reações que ocorrem entre os elementos químicos nele presentes em nível celular. Essas substâncias interagem entre si e a dissolução de seus átomos gera partículas eletricamente carregadas, os chamados íons. A circulação e interação de íons com diferentes potenciais elétricos no organismo gera uma certa corrente, de forma similar ao que acontece com um conjunto de pilhas.

Tal atividade emite os chamados sinais bioelétricos, como batimentos cardíacos ou a atividade muscular, que podem ser captadas com a colocação de eletrodos em contato direto com a pele. A informação obtida na primeira captação passa por uma filtragem para garantir a precisão de dados. Os sinais de origem são analógicos, portanto devem passar por uma conversão digital para serem processados por computadores. Com base nos padrões dos dados digitais, transcreve-se as informações de forma compreensível, como em um gráfico que representa a atividade cardíaca.

 

Hidrofílico e eletrodo

HIDROFÍLICO - Tipo substância compatível com água e, portanto, solúvel nela.

ELETRODO - Elemento que transmite a eletricidade e permite que ela seja conduzida de um objeto externo a um circuito elétrico. Na medicina, é utilizado, por exemplo, para aplicação de tratamentos ou para medir sinais elétricos do corpo, como no caso de um eletrocardiograma.

  • Sensores
    Sensores Foto: Universidade de Cambridge
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