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Lentes intraoculares em 3D facilitam tratamentos na visão

Material desenvolvido por pesquisadores britânicos é o primeiro compatível com a técnica em resina com expectativa de agilidade maior na produção. É recomendada para quem sofre de catarata e miopia, por exemplo

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Especialistas afirmam que a impressão 3D apresenta potencial de reduzir o tempo de produção das lentes -  (crédito: Divulgação )
Especialistas afirmam que a impressão 3D apresenta potencial de reduzir o tempo de produção das lentes - (crédito: Divulgação )
postado em 17/06/2024 06:01
Karin Santin*

Pesquisadores da Universidade D'Ânglia Oriental, no Reino Unido, desenvolveram, em fase de testes, um material que permite a impressão 3D de lentes intraoculares, utilizadas no tratamento da catarata e dos chamados erros de refração, como miopia e astigmatismo. Publicada na Current Eye Research, a pesquisa do grupo liderado por Aram Saeed apresenta resultados das próteses impressas com a nova resina e testadas em uma cápsula ocular em laboratório. Os cientistas estimam que a técnica deve levar à maior agilidade na produção, podendo ser feita em escala superior às que estão no mercado, e com resultados adaptados às necessidade de cada paciente.

"Nosso objetivo era criar uma resina que atendesse aos padrões existentes, mas adicionando maior flexibilidade e capacidade de impressão precisa", explica Saeed, professor associado em Tecnologia da Saúde, que descreve o novo material como similar ao utilizado em lentes de contato de alta qualidade, mas desenvolvido com engenharia de dez anos de pesquisa em implantes oculares.

Segundo o professor, a maior flexibilidade do material utilizado permite que as lentes sejam dobradas e inseridas em cortes menores, reduzindo os impactos da cirurgia e facilitando a cicatrização.

Atualidade

Atualmente, a confecção de lentes intraoculares é feita à base de PMMA, acrílico ou silicone. São substâncias biocompatíveis para a cirurgia e que proporcionam uma boa claridade óptica, mas não podem ser aplicadas na técnica de impressão. Imprimir com resina flexível viabiliza diversos formatos de implantes, simplificando a criação de lentes de alta qualidade e sob medida para os pacientes.

"(O material em resina) possibilita a fabricação de múltiplas lentes com diferentes propriedades e formas em um único equipamento", destaca Saeed.

Especialistas afirmam que a impressão 3D apresenta potencial de reduzir o tempo de produção das lentes. As técnicas de moldagem e torneamento empregadas hoje exigem bastante tempo e cuidado na fase de polimento, uma etapa que seria minimizada pela precisão das impressões 3D.

"Significa que o tempo entre o diagnóstico e a cirurgia seria reduzido, agilizando o processo e diminuindo custos de tratamento no geral", defende Saeed.

Análise

Wilson Hida, chefe do setor de Catarata do Hospital Oftalmológico de Brasília, afirma que, adaptadas à anatomia dos pacientes, as lentes podem levar a melhores resultados visuais das correções nas cirurgias.

"A tecnologia oferece vantagens em termos de velocidade e personalização. A capacidade de produzir lentes que se ajustem especificamente à anatomia do olho de cada paciente e dar maior satisfação", adiciona Hida.

Para André Seabra, especialista em catarata do Visão Hospital de Olhos, a técnica de impressão pode extinguir o uso de lentes pré-fabricadas, uma vez atingida a capacidade de reprodução em larga escala das lentes feitas com a resina pesquisada.

"Sem dúvida, se a gente conseguisse ter uma impressora com alta precisão e alta qualidade seriam impressionantes os resultados que nós conseguiríamos, porque nós não ficaríamos presos às lentes pré-fabricadas. A gente poderia personalizar para o grau específico de cada paciente", explica Seabra.

Acessibilidade

Com base nos dados de 2021, do Relatório Mundial sobre a visão da Organização Mundial da Saúde (OMS), essa tecnologia pode tornar mais acessível o tratamento no mundo para cerca de 65,2 milhões de pessoas que sofrem de catarata e 123,7 milhões de pessoas que têm diagnóstico de erros refrativos, como miopia, astigmatismo, hipermetropia e presbiopia.

Desenvolvida com a preocupação da reprodução industrial, a impressão 3D com a nova resina ainda deve passar por ajustes que garantam a padronização das lentes para produção em grande escala. A equipe de pesquisa responsável já está em busca de parcerias na indústria que viabilizem esse processo.

Os novos testes devem ser feitos antes de passar para a etapa de aplicação clínica em pacientes, algo que poderia ocorrer dentro dos próximos três anos. "Como toda nova tecnologia, é crucial verificar cuidadosamente e aperfeiçoar as lentes com testes clínicos para garantir o máximo de segurança e eficácia. Nós estamos comprometidos com a testagem em etapas", afirma Saeed.

*Estagiária sob supervisão de Renata Giraldi

 


Visão opaca

Com o diagnóstico de catarata, a pessoa passa a ter uma visão opaca, problema causado pela perda de transparência do cristalino — parte do olho localizada atrás da pupila e responsável por regular o foco da imagem. É uma consequência comum do envelhecimento, mas também pode ser causada por traumatismos, certos tipos de medicação, excesso de exposição à luz solar, diabetes ou ser congênita. (K.S.)

Erros refrativos

Dizem respeito às série de condições em que a imagem não se forma com o foco correto na retina devido a forma ou comprimento anormal do globo ocular. São incluídos nesse grupo miopia, hipermetropia, astigmatismo e presbiopia.

Atenção à escolha

Na cirurgia de catarata, é fundamental escolher bem e corretamente a lente a ser utilizada. Durante a operação, é removida a causa da visão embaçada, que é o cristalino danificado. Pacientes que passaram pela experiência relatam enxergar com clareza e sem a necessidade de uso de óculos. O cirurgião faz incisões microscópicas para a remoção da catarata e, logo após, são retirados e aspirados os fragmentos da doença, por meio de um equipamento ultrassônico. 

A lente intraocular — escolhida em comum acordo entre paciente e médico —  é colocada. Os especialistas fazem recomendações para o pós-operatório em relação aos cuidados com a higiene. A orientação é evitar peso, mergulhos em piscinas e mar por, no mínimo, um  mês, assim como tocar nos olhos, não dormir sobre o lado operado, no esforço de impedir que o olho corra risco de ser atingido de alguma forma. 

Uma vez definida a cirurgia de catarata, o paciente será avaliado com base nas suas necessidades visuais específicas, expectativas pessoais e os resultados de exames oftalmológicos. A lista de exames vai desde acuidade visual a laser (PAM), a ecobiometria ocular, à microscopia especular de córnea, retinografia e topografia ou tomografia de córnea, além de ultrassonografia ocular.

Atualmente, são mais utilizadas quatro tipos de lentes para a cirurgia de catarata: a intraocular monofocal tórica, intraocular monofocal não tórica, intraocular multifocal tórica e intraocular multifocal não tórica. A escolha depende se o paciente tem dificuldades para enxergar para perto, longe ou os dois e, ainda, se usa graus baixos, médios ou elevados. A definição deve ser feita com o médico oftalmologista. (K.S.)

Cuidados especiais

"A escolha é feita de acordo com as funções diárias e laborais do paciente, existem lentes intraoculares de excelente qualidade e de diversas funções. Cabe ao médico oftalmologista decidir junto com o paciente a melhor opção. Não tem como saber qual vai ser a lente sem examinar também como estão a retina e a córnea. Os pacientes com comorbidades, como diabetes, hipertensão arterial ou doenças oculares, do tipo glaucoma, uveíte, degeneração retiniana, entre outras, precisam de controle adequado antes e depois da cirurgia e podem não ser beneficiados com algumas lentes intraoculares. É importante conversar com o médico de confiança antes para tirar dúvidas."

Oftalmologista Núbia Vanessa, do Centro Brasileiro da Visão  (CBV) — Hospital dos Olhos

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