Inovação e meio ambiente

Cientistas criam forma de reutilizar resíduos na geração de hidrogênio

Pesquisadores britânicos criaram uma técnica que reaproveita resíduos metálicos, como catalisadores na geração de hidrogênio a partir da água. A expectativa é aumentar a sustentabilidade da produção de gás, usado como combustível

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Resíduos de limalhas de metal ajudam na produção de fonte de energia limpa que só emite vapor de água e não polui o ar -  (crédito: Universidade de Nottingham)
Resíduos de limalhas de metal ajudam na produção de fonte de energia limpa que só emite vapor de água e não polui o ar - (crédito: Universidade de Nottingham)
postado em 13/05/2024 04:45

Cientistas criaram uma maneira 100% eficaz de utilizar resíduos metálicos como catalisadores na geração de hidrogênio a partir da água. A descoberta pode potencializar a sustentabilidade da produção do gás, muito usado como combustível. Uma equipe de pesquisadores da Universidade de Nottingham, no Reino Unido, revelou que a superfície dos cavacos — subprodutos da indústria de usinagem de metal — tem pequenas ranhuras, facilitando a ação de átomos de platina ou cobalto, utilizados na separação dos elementos. A técnica necessita de apenas 10% dos metais preciosos utilizados por catalisadores industriais de última geração.

Conforme o estudo, publicado na revista Journal of Material Chemistry, recentemente, o hidrogênio é um combustível limpo com aplicações em aquecimento e propulsão veicular que apresenta apenas vapor d'água como subproduto em sua queima. No entanto, a maioria dos métodos para sua produção ainda depende de materiais fósseis. Nesse cenário, a eletrólise da água se destaca como uma das alternativas mais promissoras, pois precisa de dois componentes básicos: líquido e eletricidade.

A indústria enfrenta um obstáculo na eletrólise da água devido à necessidade de alguns elementos raros, como platina, para catalisar  e facilitar o processo. Com a oferta global limitada e os crescentes preços dos metais preciosos, a busca por alternativas para eletrocatalisadores — mecanismo via substâncias químicas que aumentam a reação eletroquímica — se torna urgente.  

"Somente no Reino Unido, milhões de toneladas de resíduos metálicos são geradas anualmente pelas indústrias. Utilizando um microscópio eletrônico de varredura, examinamos as superfícies aparentemente lisas dos cavacos de aço inoxidável, titânio ou ligas de níquel. Para nossa surpresa, descobrimos sulcos e ranhuras com dezenas de nanômetros de largura. Percebemos que essa superfície nanotexturizada poderia ser uma oportunidade única para a fabricação de eletrocatalisadores", afirmou, em nota, Jesum Alves Fernandes, da Escola de Química da Universidade de Nottingham e líder da pesquisa.

Corrente elétrica

Os pesquisadores aplicaram a técnica de pulverização catódica de magnetron para depositar átomos de platina na superfície dos materiais. Nesse processo, uma corrente elétrica é aplicada a um alvo de platina dentro de uma câmara de vácuo, o que faz com que os átomos de platina sejam liberados do alvo. Os átomos, em seguida, são depositados na superfície dos cavacos, onde podem atuar como catalisadores para as reações, como a divisão da água em hidrogênio e oxigênio.

A técnica permite um controle preciso sobre a distribuição dos átomos de platina na superfície dos materiais utilizados, maximizando assim a eficiência do catalisador resultante. Esses átomos então se aglomeram em nanopartículas que se encaixam nas ranhuras em nanoescala.

Madasamy Thangamuthu, pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Nottingham e responsável pela análise estrutural e atividade eletrocatalítica dos novos materiais, destaca a relevância da criação. "É notável que tenhamos sido capazes de produzir hidrogênio a partir de água usando apenas um décimo da quantidade de platina necessária em comparação com catalisadores comerciais de última geração."

Em seguida, o pesquisador acrescenta que: "Com apenas 28 microgramas de metal precioso espalhados em 1 cm² de cavacos, conseguimos criar um eletrolisador em escala laboratorial com 100% de eficiência, produzindo 0,5 litro de gás hidrogênio por minuto a partir de uma única peça de cavaco".

Eletrolisadores

O grupo está colaborando com a AqSorption, uma empresa especializada no projeto e fabricação de eletrolisadores, para ampliar sua tecnologia. O professor Andrei Khlobystov, da Escola de Química da Universidade de Nottingham, explicou. "Os eletrocatalisadores feitos de cavacos têm o potencial de causar um grande impacto na economia."

Segundo Khlobystov, a tecnologia resolveu dois grandes problemas. "Primeiro, permite a produção de hidrogênio verde usando a menor quantidade possível de metais preciosos e, segundo, recicla resíduos metálicos da indústria aeroespacial, tudo em um único processo."

Tom Rodden, vice-reitor de Pesquisa e Intercâmbio de Conhecimento da Universidade de Nottingham, reforçou que o desenvolvimento de sistemas de propulsão a hidrogênio pode ser um grande avanço na busca por um ambiente livre de carbono. "Especialmente nas indústrias de transporte e manufatura. No entanto, o sucesso dessa estratégia depende da produção sustentável de hidrogênio verde, como através da eletrólise da água, o que, por sua vez, exige avanços no design de materiais."

Fibra de carbono como solução

Os plásticos reforçados com fibra de carbono (CFRP) são uma alternativa mais leve e robusta em relação aos metais e costumam ser empregados em uma gama de indústrias, desde a aviação até a automotiva, chegando até em produtos esportivos. Com o tempo, sua aplicação se expandiu para novos setores, o que gerou um aumento na demanda e um desafio na gestão dos resíduos. O CFRP não é biodegradável, e os métodos convencionais de incineração emitem substâncias tóxicas. Agora, cientistas do Instituto Coreano de Ciência e Tecnologia (KIST) criaram uma tecnologia que permite reciclar mais de 99% dos CFRP em questão de minutos.

Comandados por Yong-chae Jung, diretor do Convergence Research Center, a equipe desenvolveu o procedimento utilizando água em estado supercrítico — uma característica alcançada sob condições extremas de temperatura e pressão, o que garante propriedades únicas —, com esse líquido, é possível fazer a remoção seletiva do epóxi impregnado no CFRP, resultando na obtenção de fibra de carbono reciclada.

O sistema de reciclagem é considerado altamente eficiente pelos pesquisadores. Uma das vantagens da invenção é não precisar de catalisadores — elementos que viabilizam uma reação—, oxidantes ou solventes orgânicos. A equipe descobriu que a adição de glicina, um aminoácido, à água supercrítica pode enriquecer a fibra de carbono reciclada com átomos de nitrogênio, melhorando sua condutividade elétrica em comparação com a fibra reciclada convencional.

A abordagem marca a primeira vez em que um único processo foi capaz de reciclar e reutilizar simultaneamente o CFRP em um curto espaço de tempo, mantendo o controle sobre a estrutura e as propriedades da fibra reciclada.

Enquanto as fibras recicladas de CFRP, até então, tinham uso limitado devido à falta de homogeneidade em suas propriedades, o material desenvolvido pelos estudiosos do KIST mostrou um desempenho equivalente ou até superior ao do grafite em testes quando aplicadas como eletrodos em baterias.

Yong-chae Jung destacou a importância do avanço. "É uma conquista de pesquisa significativa que não apenas reduz drasticamente as emissões de carbono, mas também apresenta um ciclo virtuoso de recursos que são convertíveis em materiais de eletrodos de bateria para mobilidade elétrica", frisou, em nota.

 

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