Há décadas, cientistas investigam a capacidade do metabolismo de algumas bactérias de realizar reações bioquímicas que envolvem a produção de eletricidade para aplicações industriais sustentáveis. Apostando nessa alternativa, pesquisadores da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL), na Suíça, modificaram micróbios para gerar energia a partir de águas residuais. A ideia é que a solução tecnológica, no futuro, também funcione em uma ampla variedade de fontes.
A equipe escolheu trabalhar com a espécie Escherichia coli, geralmente encontrada no intestino de humanos e animais e amplamente estudada pela comunidade científica devido à facilidade para ser manipulada. No entanto, esse micro-organismo é limitado quanto à transferência de elétrons extracelulares (EET) — processo de respiração sem presença de oxigênio —, o que compromete o seu uso na bioeletrônica.
Os pesquisadores decidiram alterar geneticamente bactérias E. coli para exibir EET aprimorado. Isso permitiu torná-las altamente eficientes para produzir até três vezes mais corrente elétrica enquanto metabolizam uma variedade de substratos orgânicos, em comparação aos métodos convencionais que exigem produtos químicos específicos para a gerar eletricidade.
"Embora existam micróbios exóticos que produzem eletricidade naturalmente, eles só conseguem fazê-lo na presença de produtos químicos específicos. A E. coli pode crescer em uma ampla variedade de fontes, o que nos permitiu produzir eletricidade numa ampla variedade de ambientes, inclusive a partir de águas residuais", conta, em nota, Ardemis Boghossian, professora de ciências químicas e engenharia da EPFL e uma das autoras do estudo, publicado, neste mês, na revista Joule.
Cervejaria
Os pesquisadores testaram a tecnologia em águas residuais de uma cervejaria e constataram que, enquanto outros micróbios elétricos morreram, a E. coli modificada foi capaz de florescer exponencialmente. O resultado, segundo eles, demonstra o potencial da bactéria para o tratamento de resíduos e para a produção de energia em grande escala.
Agora, a equipe planeja explorar a flexibilidade genética da bactéria para adaptá-la a ambientes e matérias-primas específicos e torná-la uma ferramenta versátil para o desenvolvimento verde. "Com todos os esforços atuais de pesquisa na área, estamos entusiasmados com o futuro das bactérias bioelétricas e mal podemos esperar que nós e outros levemos essa tecnologia a novas escalas", afirma, em nota, Mohammed Mouhib, autor principal do estudo.