Robôs

Robôs de origami para serem utilizados nas missões espaciais

Módulos triangulares têm autonomia para se juntar e realizar atividades específicas, como explorar terrenos extraterrestres. Tecnologia poderá ser útil em atividades de comunicação e de de reparos externos em naves especiais

Amanda Gonçalves*
postado em 26/06/2023 06:05
Simulação de atividades que poderiam ser desempenhadas por Mori3 em missões pelo espaço -  (crédito: Christoph Belke, Raphaël Galeuchet, EPFL)
Simulação de atividades que poderiam ser desempenhadas por Mori3 em missões pelo espaço - (crédito: Christoph Belke, Raphaël Galeuchet, EPFL)

Robôs modulares têm capacidade para se conectar e assumir novas funções graças às pequenas peças que os constituem. Dessa forma, podem se adaptar em diferentes formatos e realizar tarefas diversas. Inspirados nessas habilidades, pesquisadores da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL), na Suíça, desenvolveram um robô origami capaz de mudar de forma, mover-se e interagir com objetos e pessoas. A ideia é que a tecnologia seja utilizada para viagens espaciais, principalmente em atividades de comunicação e reparo externos.

O Mori3 é constituído por módulos individuais, em formato triangular, que se unem facilmente para criar polígonos de diferentes tamanhos e configurações, um processo conhecido como malha de polígonos. Isso permite que a máquina possa se transformar de triângulos 2D em quase qualquer objeto com três dimensões. Conjunto de molas, imãs e componentes eletrônicos permitem que as peças se movam e se unam em pouco tempo.

Christoph H. Belke, primeiro autor do artigo, conta que a ideia do Mori3 veio da necessidade de desenvolver robôs multifuncionais, em contraposição a sistemas de uma única função, como os androides tradicionais. "Quanto mais versátil você tenta fazer um robô, mais complexo ele se torna e cai seu desempenho em diferentes tarefas. Abordamos esse desafio por meio da arquitetura exclusiva por trás do Mori3: malha de polígonos físicos", explica.

Ainda segundo o pesquisador, para construir a solução tecnológica, a equipe se inspirou em três pilares: a computação gráfica, que usa malha de polígonos para renderizar ambientes, objetos e pessoas; o comportamento de enxame em sistemas biológicos, como formigas ou abelhas; e a arte do origami, que fornece a base matemática para dobrar estruturas 3D a partir de elementos 2D. "A combinação desses conceitos resulta em uma estrutura inerentemente flexível, que pode mudar sua forma e sua função para lidar com a tarefa em questão", detalha Christoph.

Emparelhamento de dois módulos Mori
Peças em 2D se juntam e formam estruturas tridimensionais (foto: EPFL RRL)

Marcelo Becker, professor no Departamento de Engenharia Mecânica da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), da Universidade de São Paulo (USP), avalia que combinar muitos módulos dimensionais é uma boa estratégia, uma vez que permite a formação de uma estrutura complexa sem dificuldades. "Como é simples, a probabilidade de erro é menor. Mesmo que uma das peças falhe, pode-se descartá-la porque há outras dezenas de módulos trabalhando em conjunto", explica.

Além disso, para o professor da USP, o formato de origami é interessante porque consegue deixar o robô compacto e fazer uma distribuição de cargas. "Por ser tridimensional, não vai ter muitas conexões. Um robô com seis lados teria que ter uma quantidade de conexões muito grandes", compara.

Carla Koike e Dianne Viana, do Projeto Ereko de Robótica Modular da Universidade de Brasília (UnB), ressaltam que os módulos independentes do robô permitem, além do movimento individual, a geração de máquinas mais simples de serem projetadas, construídas e programadas. "Robôs tridimensionais podem alcançar posições que um plano não consegue, e, portanto, realizar tarefas mais complexas", afirmam, em nota.

Faz-tudo

Embora o robô possa fornecer benefícios em várias áreas de aplicação, a equipe almeja utilizá-lo em missões espaciais. De acordo com Christoph, isso é um desafio para os quais a malha de polígonos físicos é adequada. "O Mori3 poderia, por exemplo, servir como um auxiliar multifuncional em espaçonaves ou explorar vários terrenos na exploração extraterrestre", exemplifica o pesquisador.

Para a dupla de professoras, o uso espacial da solução tecnológica é interessante pela capacidade que ela tem em ocupar menos espaço, ser mais leve e exigir menor quantidade de combustível. "Um robô reconfigurável que pode alterar sua forma e sua mobilidade e, portanto, executar diversas tarefas seria uma excelente alternativa com o objetivo de reduzir o espaço e o peso ocupados por esses equipamentos robóticos nos veículos espaciais", explicam. "Em vez de enviar três ou quatro robôs para diferentes tarefas, seriam enviados módulos que podem ser combinados e formar máquinas com capacidades variadas."

Por enquanto, a performance dos módulos foi testada em laboratório e apresentada, neste mês, na revista Nature Machine Intelligence. A equipe espera que a tecnologia possa ser utilizada em cenários diversos, para além dos espaciais. "Esperamos que outros pesquisadores e engenheiros comecem a aproveitar os conceitos por trás de Mori3 para beneficiar os vários aspectos da robótica", almeja Christoph.

*Estagiária sob a supervisão de Carmen Souza

 


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Pangolins terapêuticos

Pangolim, a inspiração para o robô médico -  (crédito: MPI for Intelligent Systems)
crédito: MPI for Intelligent Systems

Pangolins são mamíferos cobertos por escamas duras, feitas de queratina — o mesmo material de cabelos e unhas humanos. Essas escamas sobrepostas funcionam como uma armadura e permitem que esses animais se enrolem em uma bola em caso de perigo. Inspirados nessas características, pesquisadores da Max Planck Institute for Intelligent Systems, na Alemanha, desenvolveram um robô de metal, mas macio e flexível, para transportar medicamentos. A ideia é que, um dia, o pequeno dispositivo possa ajudar em tratamentos no sistema digestivo.

Com menos de 2cm de comprimento, a tecnologia é constituída por uma primeira camada macia, feita de um polímero cravejado com pequenas partículas magnéticas, e uma segunda camada mais dura, feita de elementos metálicos dispostos em camadas sobrepostas. Dessa forma, apesar dos componentes sólidos, consegue ser macio e flexível para uso dentro do corpo humano.

"O design em escala introduzido nesse trabalho permite que dois requisitos concorrentes, ou seja, a conformidade e o desempenho de aquecimento, sejam realizados simultaneamente em um único robô sem fio", descrevem os autores do artigo publicado, neste mês, na revista Nature Communications.

Quando exposto a um campo magnético de baixa frequência, o robô se enrola e se move para frente e para trás, o que permitiria transportar partículas como medicamentos. Em contato com um campo magnético de alta frequência, aquece em temperatura superior a 70°C, graças ao metal embutido. Devido a essa energia térmica, poderá ser utilizado em outros procedimentos médicos, como para tratar trombose, estancar sangramento e remover tecido tumoral, apostam os criadores.

Os testes foram conduzidos em tecidos animais e órgãos artificiais O objetivo dos criadores é que o dispositivo médico possa atingir regiões mais estreitas e sensíveis do corpo humano de forma minimamente invasiva e suave.

"Estudos futuros devem se concentrar em quatro aspectos técnicos além de questões específicas da aplicação, como se o conteúdo intestinal residual pode estar presente após a lavagem do trato gastrointestinal e de que forma isso poderia interferir na locomoção", indicam os autores.

Fusão de conceitos

O nome Mori é uma fusão de modularidade e origami, dois conceitos da robótica reconfigurável que influenciaram o trabalho da equipe suíça. O número três refere-se aos muitos múltiplos de três que estão presentes no robô, incluindo três arestas de um triângulo, três lineares e três graus de liberdade rotacionais. Também indica o pilar de conceitos do sistema robótico: reconfigurabilidade, modularidade e origami.

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