O empresário sul-africano Elon Musk não tuitou nada sobre sua nova participação no Twitter, o que para um ávido usuário da plataforma parece algo um tanto irônico.
Talvez seja porque os 9,2% da empresa que ele agora possui são descritos como uma "participação passiva", embora pessoas que conhecem Musk não esperam que esse cenário permaneça assim por muito tempo.
Seu primeiro movimento foi lançar uma enquete - perguntando se as pessoas querem um botão de edição, ferramenta há muito pedida e talvez algo de que ele precise pessoalmente.
O novo anúncio de que ele se juntará ao conselho do Twitter não é nenhuma surpresa.
Em uma mensagem na terça-feira (05/04), o presidente-executivo do Twitter, Parag Agrawal, disse que "por meio de conversas com Elon nas últimas semanas, ficou claro para nós que ele traria grande valor ao nosso conselho".
Agrawal acrescentou que "como um crente apaixonado e crítico intenso" do serviço, Musk é "exatamente o que precisamos".
Mais tarde, Musk respondeu dizendo que estava ansioso para fazer mudanças na gigante das redes sociais.
A participação de 9,2% de Musk na empresa de mídia social pode parecer pequena, mas Dan Ives, da empresa de análise Wedbush, a descreve como "de arregalar os olhos" - a porcentagem equivale a 73,5 milhões de ações da rede social.
As ações da plataforma dispararam após a revelação do negócio, na segunda-feira, de que o fundador da Tesla se tornou o maior acionista da empresa - o que significa que a participação já cresceu em valor e agora vale mais de US$ 3 bilhões.
A participação acionária de Musk é quatro vezes maior que a do fundador do Twitter, Jack Dorsey, que deixou o cargo de presidente-executivo da companhia em novembro.
Ives acredita que o bilionário sul-africano agora tem os olhos voltados firmemente para o Twitter, e sua participação significativa o levará a pressionar por um papel ativo na administração da empresa.
"Esperamos que essa participação passiva seja apenas o início de conversas mais amplas com o conselho e gerência do Twitter que podem levar a uma participação ativa e a um papel de propriedade potencialmente mais agressivo do Twitter", disse ele.
Musk tem uma relação de amor e ódio com o Twitter. Ele é um usuário frequente, com mais de 80 milhões de seguidores - e muitas vezes suas interações na rede social geram polêmicas.
A plataforma vai precisar se adequar à personalidade impulsiva de Musk. No ano passado, ele perguntou se deveria vender 10% de suas ações em sua empresa de carros elétricos Tesla. Os usuários do Twitter disseram "sim". Isso levou Musk a vender cerca de US$ 5 bilhões em ações da companhia em novembro.
Meses antes, ele havia se oferecido para assinar um cheque de US$ 6 bilhões se o Programa Mundial de Alimentos (PAM) explicasse como o dinheiro seria usado para resolver a fome em todo o mundo. A declaração foi dada após uma afirmação feita pelo chefe do programa da ONU.
Mas tuitar também colocou Musk em apuros. Um post de 2018 sobre as ações da Tesla levou a uma investigação da Securities and Exchange Commission (SEC), agência federal americana de fiscalização do mercado financeiro. A apuração terminou com um acordo que exigia que os advogados da empresa pré-aprovassem certos tuítes de Musk. Não está claro se isso realmente acontece.
Curiosamente, o jornal The Wall Street Journal relata que os arquivos de ações do Twitter com a SEC, que em circunstâncias normais incluiriam uma linha dizendo que ele não pretende influenciar na direção da empresa, vieram com a observação "não aplicável".
O momento do acordo também levantou questões e pode mais uma vez colocar Musk em desacordo com os reguladores financeiros.
Seu investimento no Twitter foi registrado em 14 de março, mas não havia sido anunciado até esta semana. A lei de valores mobiliários dos Estados Unidos exige a divulgação dentro de 10 dias após a aquisição de 5% de uma empresa.
Liberdade de expressão
Musk usa o Twitter não apenas como um barômetro de como ele administra suas próprias empresas, mas também cada vez mais para medir a temperatura dos Estados Unidos.
No mês passado, depois de apresentar seu investimento à SEC - mas antes de sua participação se tornar de conhecimento público -, ele perguntou aos usuários se eles acreditavam que a liberdade de expressão era essencial para uma democracia em funcionamento e se o Twitter acredita nesse princípio.
A professora assistente da Universidade de Cornell, Alexandra Cirone, acha que isso é uma evidência de que Musk pode usar sua nova participação "para tentar influenciar as práticas do Twitter" e para um "jogo mais ativo no ecossistema de mídia social".
Mas outros veem problemas mais imediatos com suas reflexões.
Howard Fischer, sócio do escritório de advocacia Moses & Singer, disse à agência de notícias Reuters que, como já havia comprado uma participação no Twitter, essas perguntas podem ser vistas como uma forma de manipulação de mercado. "Suspeito que a SEC vai investigar muito se essas mensagens podem trazer acusações de manipulação", disse ele.
Agrawal parece estar claramente observando cada movimento de Musk. Em resposta à enquete do botão de edição, que atualmente tem 2,6 milhões de respostas, ele pediu aos eleitores que o façam "com cuidado".
"As consequências desta pesquisa serão importantes", disse ele, repetindo exatamente as mesmas palavras que Musk usou depois de lançar sua pesquisa sobre liberdade de expressão no Twitter.
Jack Dorsey sempre rejeitou a ideia do botão de edição, e os críticos apontam que a ferramenta poderia permitir que as pessoas mudassem fundamentalmente o significado dos tuítes depois de serem compartilhados.
Seria uma grande mudança para o Twitter incluir essa ferramenta, e Musk está claramente interessado em fazer parte dessa conversa.
Por um tempo, no mês passado, parecia que Musk pretendia construir uma nova plataforma de mídia social como uma espécie de rival do Twitter.
Donald Trump, que foi banido do Twitter em janeiro de 2021 após os distúrbios do Capitólio, anunciou no outono passado que estava lançando sua própria rede social - apelidada de Truth Social - para "enfrentar a tirania da grande tecnologia", segundo ele.
Mas seis semanas após o lançamento da plataforma ainda há uma lista de espera de 1,5 milhão de pessoas que não ainda podem usá-la. O sistema foi apontado como um desastre por Joshua Tucker, diretor do Centro de mídia social e política da New York University.
Segundo a Reuters, dois executivos importantes se demitiram após o lançamento conturbado.
Para aqueles com ações nos muitos outros negócios de Musk - Space X, Tesla, Neuralink, The Boring Company - haverá sem dúvida um alívio por ele não ter seguido o mesmo caminho de Trump.
Mas também haverá preocupações de que o bilionário encare o Twitter como espécie de paixão que o distraia do negócio sério de administrar suas empresas já estabelecidas.
E isso sem mencionar as questões que agora podem ser levantadas sobre o acordo do Twitter pela SEC.
O especialista em mídia social Casey Newton ressalta que não é a primeira vez que outra grande empresa de tecnologia está de olho no Twitter. O presidente-executivo da Microsoft, Steve Ballmer, certa vez comprou uma participação de 4% da empresa "e essencialmente não fez nada com ela", escreve ele.
Mas também afirma que Ballmer nunca usou o Twitter como Musk faz, "alegre, irritante e constantemente".
E parece mais provável que seja a partir dessa conta no Twitter que Musk deixará o mundo saber o que ele pretende fazer com a famosa plataforma.
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