A ameaça de proibição do TikTok nos Estados Unidos está obrigando os gigantes tecnológicos chineses a reconsiderar seu desenvolvimento internacional e pode provocar um novo enfoque no mercado interno, de acordo com analistas.
Dos smartphones até as infraestruturas para rede 5G da Huawei, passando pelos jogos eletrônicos do grupo Tencent - incluindo o famoso PUBG - e milhares de aplicativos para smartphones, as empresas chinesas registraram fortes avanços no exterior nos últimos anos.
Mas ao mesmo tempo estão cada vez mais ameaçadas, em um contexto de acusações de espionagem, em particular nos Estados Unidos, e tensões diplomáticas.
"A tecnologia é cada vez mais um desafio geopolítico e para um crescente número de países uma prioridade estratégica", declarou à AFP Dexter Thillien, analista na Fitch Solutions.
Estes países "consideram que a inovação e as tecnologias têm um impacto direto na segurança nacional, a economia e a estabilidade social", afirmou Alex Capri, pesquisador da Fondation Hinrich, organismo independente que acompanha as evoluções do comércio mundial.
Após uma disputa na fronteira em junho com a China, que terminou com mortos, a Índia proibiu quase 180 aplicativos para smartphones do país vizinho, acusados de serem "prejudiciais para a segurança do Estado".
A decisão deixa as empresas chinesas fora do segundo maior mercado mundial de internet em termos de usuários.
"Tecnonacionalismo"
"Cada país adota medidas para fortalecer sua posição", afirma Capri, que chama o fenômeno de "tecnonacionalismo".
Nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump acusa, sem apresentar provas, o aplicativo de vídeos curtos TikTok de espionagem a favor do serviço de inteligência chinês.
O republicano ameaça proibir o aplicativo nos Estados Unidos em nome da "segurança nacional", a menos que as atividades da plataforma no país sejam vendidas a uma empresa americana.
O TikTok tem 100 milhões de usuários por mês nos Estados Unidos, o que equivale a quase um terço da população do país.
As empresas chinesas precisam encontrar um difícil equilíbrio entre satisfazer os interesses chineses e responder às exigências de países estrangeiros, indica à AFP Larry Ong, analista da consultoria SinoInsider.
"Inevitavelmente, os empresários chineses teriam que pensar duas vezes antes de contemplar o desenvolvimento internacional", afirma Nicolas Colin, cofundador do The Family, fundo de startups europeias.
"Ao invés de arriscar o mesmo destino que o TikTok, poderiam concentrar-se novamente no mercado chinês, um dos maiores e mais conectados do mundo, com 900 milhões de internautas", explica Colin.
O especialista no cenário digital aponta inclusive uma vantagem: os gigantes de tecnologia chineses já conhecem muito bem seu mercado, tão grande como o dos Estados Unidos e Europa juntos, onde o uso da internet é "radicalmente diferente".
Na China, os gigantes digitais mundiais (Google Facebook, Twitter, etc) estão bloqueados pelo "Great Firewall", sistema que censura qualquer conteúdo considerado politicamente sensível.
O TikTok tem no país uma versão específica, chamada Douyin. Seu proprietário, o grupo ByteDance, espera dobrar no período de 12 meses o volume de negócios, atualmente em 5,1 bilhões de euros (quase 6 bilhões de dólares), informou a agência Bloomberg.
Freio à inovação
Os gigantes do setor de tecnologia da China encontram novos vetores de crescimento em alguns campos inovadores nos quais o país está na vanguarda, como os carros autônomos, a inteligência artificial ou a biotecnologia.
A ferramenta de busca Baidu lançou na semana passada em Pequim um serviço de táxis sem motoristas, que pretende revolucionar os transportes.
Mas levando em consideração a deterioração das relações com a China, o governo dos Estados Unidos provavelmente vai "acentuar a pressão sobre as empresas de tecnologia chinesas", prevê Larry Ong.
E, devido à sua dependência das tecnologias americanas, algumas empresas chinesas teriam que "lutar por sua sobrevivência" se Washington adotar sanções, explica Ong, que cita o exemplo da Huawei.
Desde terça-feira, o grupo chinês, que está incluído em uma lista americana, não pode utilizar cartões SIM Kirin (da fabricante taiwanesa TSMC) - que não consegue fabricar localmente - em seus smartphones de ponta.
"Pequim fará todo o possível para apoiar seus gigantes", considera Dexter Thillien, que menciona os grandes investimentos para reduzir a dependência da China das tecnologias estrangeiras mais importantes.
O presidente chinês, Xi Jinping, anunciou em maio um gigantesco pacote de 1,45 bilhão de dólares por cinco anos com este objetivo.
Mas a corrupção e a reduzida proteção da propriedade intelectual na China representam "um freio para a inovação", observa Larry Ong.