Por José Manuel Diogo / Especial para o Correio
A casa tinha um cheiro de café fresco e flor de laranjeira. Na sala, quadros de família e lembranças de viagens se misturavam a retratos de peças de teatro e filmes, testemunhas de gerações dedicadas à arte. Era uma noite especial, pois Fernanda Torres concorria ao Oscar de Melhor Atriz por um filme emocionante, rodado em terras brasileiras.
Na poltrona de veludo, Fernanda Montenegro repousava com um olhar sereno que trazia no fundo um leve nervosismo — afinal, mesmo depois de tantas décadas de conquistas, ela continuava a sentir a velha e conhecida ansiedade antes de um grande momento. Ao seu lado, Cláudio, irmão de Fernanda, conferia o celular a todo instante, trocando mensagens com amigos e parceiros de profissão que vibravam pela vitória iminente.
A TV exibia flashes do tapete vermelho. Lá fora, repórteres disputavam uma palavra exclusiva, um sorriso, um comentário de Fernanda. Enquanto isso, dentro daquela sala, cada segundo se esticava como se houvesse elásticos no tempo. O locutor anunciava os indicados com vozes graves e trilhas sonoras grandiosas.
— "E o Oscar de Melhor Atriz vai para…" — a voz ao microfone hesitou um instante.
Nos poucos segundos que antecederam a fala final, o coração de todos na sala pareceu parar. "Fernanda Torres!". O nome ecoou primeiro pela televisão e depois retumbou pelas paredes da casa, enchendo o ar de uma vibração quase palpável.
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Em um impulso, a família inteira saltou das cadeiras e poltronas, rompendo o silêncio com gritos de alegria. As lágrimas de Fernanda Montenegro foram as primeiras a rolar, acompanhadas pelas palmas ritmadas de Cláudio.
No telão da TV, Fernanda Torres subia ao palco, com um vestido de corte elegante, ostentando um sorriso que misturava emoção e encantamento. Quando ela falou, a voz da atriz, firme, porém carregada de sentimento, rompeu a solenidade, desta vez falando em português:
— "Este prêmio é de todos que sonham em português. Obrigada, mãe, por me ensinar que a arte é ponte, e que por ela cruzamos do íntimo ao universal. Obrigada a cada pessoa que me aplaudiu, criticou, inspirou e, principalmente, acreditou que uma história nossa, contada na nossa língua, poderia ganhar o mundo."
Na sala, o momento de consagração se transformou em um coro coletivo de aplausos e abraços. Celulares começaram a tocar sem parar, familiares distantes enviavam áudios emocionados, e pelas redes sociais chegavam parabenizações de amigos, colegas e até desconhecidos que se sentiam parte daquela vitória.
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Alguém estourou uma garrafa de champanhe — guardada especialmente para ocasiões de grande celebração — e a bebida espumou como se também quisesse participar. Fernanda se levantou, contrariando a cautela dos mais jovens, e propôs um brinde com a taça erguida:
— "À Fernanda e à nossa língua! Que ela leve muitas outras vozes a todos os palcos do mundo!"
O brinde fez-se ouvir entre sorrisos e lágrimas, numa noite em que as cortinas do mundo haviam se aberto não só para a atriz, mas também para a força de um idioma que, naquele momento, reinava supremo. A vitória no Oscar não era apenas o triunfo de uma pessoa extraordinária: era a coroação de uma família que, na sala de casa, fazia do amor pela arte um laço inquebrantável, e do português uma bandeira que seguia tremulando na imaginação de todos.
José Manuel Diogo é diretor da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira