
Considerada uma das doenças mais antigas conhecida pela humanidade, a hanseníase ainda é um desafio de saúde pública no país. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o segundo país com maior incidência de hanseníase no mundo, atrás apenas da Índia. Em 2023, dados do Ministério da Saúde revelaram que o Brasil registrou quase 20 mil novos casos da enfermidade, o que representa um aumento de 5% em relação a 2022. A Região Nordeste foi a que mais registrou casos, com 7.779.
A hanseníase é uma doença infecciosa, contagiosa e crônica que afeta a pele e os nervos. Antigamente conhecida como lepra ou mal de Lázaro, é causada por infecção com a bactéria Mycobacterium leprae. Ela também afeta os olhos, as vias respiratórias superiores, o nariz, as mãos e os pés. Apesar de ter cura, essa doença tropical negligenciada continua afetando muitas pessoas.
“Essa é uma doença infectocontagiosa de evolução crônica, que se manifesta por lesões na pele e sintomas neurológicos, como perda de sensibilidade e fraqueza nos pés e nas mãos. Causada por um bacilo, se propaga por meio do contato próximo e prolongado com pessoas infectadas”, expõe a secretária geral da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), Regina Carneiro.
Segundo Carla Andréa Avelar Pires, coordenadora do Departamento de Hanseníase da SBD, a hanseníase é transmitida pelo contato próximo e frequente com uma pessoa doente que ainda não começou o tratamento. “Ela se espalha por gotículas que saem quando a pessoa fala, tosse ou espirra. É importante lembrar que a maioria das pessoas não pega a doença, mesmo em contato, porque tem resistência natural. É uma doença que, apesar de antiga, tem tratamento e cura”, informa.
Sintomas
Os primeiros sinais da hanseníase podem incluir:
• Manchas ou outras lesões na pele que podem ser mais claras ou avermelhadas e nas quais a pessoa perde a sensibilidade (não sente calor, frio ou toque).
• Dormência ou formigamento em mãos, pés ou outras partes do corpo.
• Fraqueza muscular, como dificuldade para segurar objetos ou caminhar.
A médica Carla Andréa Avelar Pires alerta que esses sintomas são sutis, mas precisam de atenção médica.
Diagnóstico
O diagnóstico da hanseníase pode ser tardio. Isso ocorre porque os sinais e sintomas da doença podem demorar até 10 anos para aparecerem. A dermatologista Regina Carneiro conta que o diagnóstico demanda uma avaliação clínica detalhada, além da capacitação do médico e da equipe de saúde envolvida no cuidado desses pacientes. “Nosso objetivo é mostrar à população que quando tratada precocemente, a cura é possível; caso contrário, a doença pode resultar em sequelas e deformidades físicas.”
Carla complementa: “Além de avaliar se há perda de sensibilidade ou alterações nos nervos periféricos, também é fundamental que o profissional examine as pessoas que convivem com o doente para identificar e tratar casos precocemente, se necessário”, diz.
Por ser uma doença que sofre estigma na sociedade, o diagnóstico pode ser tardio. “Os sintomas aparecem de forma lenta e muitas pessoas não percebem ou demoram a procurar ajuda, seja por falta de informação, seja por medo do preconceito. Quando o diagnóstico é feito tarde, a doença pode já ter causado danos nos nervos, como perda de movimentos ou sensibilidade, e isso pode deixar sequelas. Além disso, o tratamento pode ser mais longo e a recuperação mais difícil”, observa Carla.
Tratamento
A hanseníase pode ser tratada de forma eficaz com antibióticos. O tratamento, totalmente gratuito pelo Sistema Único de Saúde (SUS), é ambulatorial, ou seja, realizado de forma contínua, com o paciente tomando comprimidos diariamente até o término do ciclo terapêutico e pode pode variar de seis a 12 meses, dependendo do tipo de infecção e da resposta do paciente.
A Poliquimioterapia Única (PQT-U) é o esquema utilizado, que combina três antibióticos: Rifampicina, Dapsona e Clofazimina. É fundamental que o tratamento seja concluído completamente para evitar o retorno da doença, novas contaminações e o risco de resistência aos antimicrobianos, o que pode dificultar o controle da doença no futuro. O acompanhamento médico durante todo o período de tratamento é essencial para garantir a cura e prevenir complicações.
Efeitos colaterais
Depende do remédio. "Existem medicações que podem dar uma coloração diferente à pele do paciente, outra pode causar anemia, mas é importante saber que o tratamento é bastante seguro”, enfatiza Regina.
Iniciar o tratamento o quanto antes é essencial, já que a hanseníase não tratada pode causar lesões irreversíveis na pele e nos nervos, além de incapacidades físicas. “As principais sequelas são danos dos nervos periféricos, que podem levar à ‘mão em garra’ e a úlceras nos pés, por exemplo. A prevenção se dá com o diagnóstico e tratamento precoce”, pontua a secretária geral da SBD.
Essas são algumas das sequelas da hanseníase não tratada:
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Perda parcial ou total da sensibilidade em mãos e pés
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Fraqueza muscular, que pode causar deformações
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Lesões desfigurantes na pele e na mucosa nasal
Prevenção
Para a prevenção e propagação das informações sobre a doença, Carla Andréa Avelar Pires indica:
• Diagnosticar e tratar a pessoa doente rapidamente, porque quem está em tratamento não transmite mais.
• Examinar as pessoas que convivem com o doente para identificar se estão doentes ou não.
• Divulgar informações corretas para reduzir o preconceito e incentivar mais pessoas a buscar ajuda.
Palavra do especialista
Quem está mais vulnerável a desenvolver hanseníase? Fatores como idade, gênero ou região influenciam?
Qualquer pessoa pode ter hanseníase, mas o risco é maior para quem convive com alguém doente sem tratamento, especialmente em locais com condições de saúde precárias. Não há um grupo específico por idade ou gênero, mas crianças e idosos podem apresentar maior vulnerabilidade.
Qual é o tratamento para hanseníase e quanto tempo ele costuma durar?
O tratamento é feito com remédios gratuitos oferecidos pelo SUS, chamados poliquimioterapia (PQT). Eles combinam medicamentos que curam a doença e impedem a transmissão.
Quanto tempo dura o tratamento?
Varia. Para casos mais leves, dura seis meses. Para casos mais graves, pode durar até um ano. O mais importante é que o tratamento seja seguido até o fim para garantir a cura completa.
Carla Andréa Avelar Pires é coordenadora do Departamento de Hanseníase da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD).
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte