Cidade Nossa

Crônica: Brasília além dos estereótipos

Para a jornalista e fotógrafa Graça Seligman, a capital federal é mais do que os olhos podem ver. Isso, sobretudo, no que diz respeito a busca pela qualidade de vida e empregos melhores

Especial para o Correio — Graça Seligman 

Brasília, como capital do Brasil e sede do governo federal, é frequentemente alvo de estereótipos que não refletem a realidade de seus habitantes. A ideia de que os moradores recebem altos salários sem trabalhar ignora a diversidade e a complexidade da vida na cidade. A verdade é que Brasília é um microcosmo das desigualdades e das realidades brasileiras, em que a luta diária por melhores condições de vida é uma constante para muitos. Enquanto alguns desfrutam de privilégios, a maioria dos brasilienses enfrenta desafios como o alto custo de vida e a busca por oportunidades em um mercado competitivo.

Muitos profissionais em Brasília atuam em áreas exigentes, como políticas públicas, direito, gestão e serviços essenciais. Esses trabalhos demandam longas horas e um alto nível de responsabilidade. Exatamente pelo elevado custo de vida, a população busca e trabalha por um salário compatível com suas despesas.

A pressão para entregar resultados positivos em ambientes muitas vezes hostis e burocráticos pode ser extenuante, levando muitos a questionar sua vocação e seu papel dentro de uma estrutura governamental que nem sempre reconhece o esforço individual. Essa realidade revela um lado menos visível da cidade, onde o estigma do "funcionário público" descomprometido não se aplica à maioria.

O termo "aspone" (assessor de porra nenhuma) deslegitima o trabalho de assessores e profissionais que desempenham funções importantes na gestão pública. As generalizações sobre Brasília podem ser prejudiciais e não refletem a diversidade cultural e profissional da cidade. A realidade é mais complexa do que esses estereótipos sugerem. Cada assessor ou especialista traz consigo uma bagagem única de experiências e conhecimentos que são fundamentais para a tomada de decisões dentro das instituições públicas. Ao desmerecer essas funções, perde-se a oportunidade de reconhecer o papel vital que esses profissionais têm na construção de políticas que impactam diretamente a vida dos cidadãos.

É verdade que existem altos salários em Brasília, especialmente entre servidores públicos do Judiciário, Executivo e Legislativo. Esses salários geram debates sobre a justiça e a equidade no uso dos recursos públicos em um país com grandes desigualdades sociais. Por trás dessas cifras estão discussões sobre meritocracia e o valor real das contribuições desses profissionais para a sociedade. É essencial entender que altas remunerações não são sinônimo de ineficiência; muitas vezes, refletem a complexidade das funções desempenhadas e as exigências da legislação.

Uma reforma política e administrativa precisa revisar excessos, especialmente em benefícios e gratificações — os chamados "penduricalhos" — que acompanham os altos salários. Há abusos no serviço público, no qual muitos recebem sem efetivamente trabalhar. Cargos comissionados são frequentemente usados para clientelismo, assim como as verbas de gabinete, que precisam ser transparentes. O fortalecimento dos mecanismos de controle social pode ser uma solução viável para garantir que os recursos públicos sejam utilizados de forma eficiente e justa.

Essas questões, se abordadas com uma gestão transparente e eficiente, podem melhorar a vida da população em geral, em vez de beneficiar apenas uma elite privilegiada. É fundamental promover um diálogo aberto entre cidadãos e gestores públicos para construir uma Brasília mais inclusiva e representativa dos interesses da sua população. Somente assim será possível desconstruir estereótipos que só desmerecem Brasília e prejudicam a construção de um novo olhar sobre o potencial da capital brasileira.

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