Queridinhos dos brasileiros, os cães sem raça definida (SRD), mais popularmente conhecidos como vira-latas, tem até um dia para chamar de seu — 31 de julho, celebrado na semana passada. Esses cachorros resultam da mistura entre diversas raças e outros cães SRD, por isso não possuem um padrão genético. "Eles podem ter os mais diversos tamanhos e pelagens, justamente por não terem uma predisposição racial específica", explica a médica veterinária Mariane Leão, professora do curso de medicina veterinária do Centro Universitário Uniceplac.
Devido a essa diversidade, esses cães podem apresentar uma grande variedade de aparências e, por todo o Brasil, algumas classificações carinhosas surgem, como os famosos vira-latas caramelo, pretinhos, tigrados e caroço de manga. "Os cães vira-latas fazem parte da adaptação e da domesticação dos cães de uma forma geral, são muitos anos de evolução junto aos humanos", conta a veterinária. Atualmente, temos um projeto de lei que visa reconhecer o vira-lata caramelo como manifestação cultural imaterial do Brasil.
Apesar de todo o carinho, infelizmente muitos desses bichinhos vivem em situações de abandono nas ruas do Brasil. De acordo com o Instituto Pet Brasil, hoje há mais de 180 mil animais em situação de abandono ou sob tutela de ONGs esperando para serem adotados no país. "Temos um problema muito grande de superpopulação de animais de rua, e precisamos buscar um controle sobre isso", ressalta Mariane.
Para que esse controle ocorra, além da realização de castrações ou outras formas de esterilização, um dos principais mecanismos é a adoção. "Além de diminuir a população de animais de rua, você tem a oportunidade de aumentar a qualidade de vida de um animal, diminuir a transmissão de doenças e não ter custo inicial algum para adquirir o pet", enumera a especialista. "Outro benefício é o de ter um animal completamente único, em aspectos físicos e personalidade", completa.
Mitos e verdades
Graças à variedade de características únicas e imprevisíveis decorrentes das misturas genéticas, muitos tutores têm incertezas sobre as necessidades e os cuidados específicos com os cães SRD. Para sanar algumas dessas dúvidas, a Revista desmistificou três mitos populares sobre os vira-latas. Confira:
- Vira-latas são mais bagunceiros que cães de raça
De acordo com a veterinária Mariane Leão, as características comportamentais dependem de outros fatores que vão além da raça. “O temperamento pode ser passado de forma hereditária. Algumas raças são conhecidas por serem mais agitadas, como labradores, goldens, ou o border collie”, esclarece.
Os cães vira-latas, devido à origem incerta, podem ter características herdadas dessas raças mais ativas. No entanto, o modo como são criados, a rotina diária, a alimentação e os treinamento são os fatores que realmente influenciam o comportamento que irão exibir ao longo da vida. “Se o animal já passou por algum trauma, tem medo de alguma coisa, se fica muito tempo dentro de casa, isso tudo influencia no comportamento”, completa Mariane.
-
Os vira-latas podem comer de tudo
Existem alimentos que são tóxicos para cães de forma geral, que devem ser evitados ao máximo, independentemente da raça. “Como principais exemplos temos cebola, alho, chocolate, uva e abacate”, cita Mariane. Como qualquer cão de raça, os vira-latas devem ter uma dieta balanceada e variada, que atenda a todas as necessidades nutricionais.
- Vira-latas são mais resistentes a doenças
Apesar de possuírem menores chances de apresentarem doenças hereditárias, quando se fala de doenças transmissíveis, eles têm a mesma predisposição que outros cães. “Isso vai depender muito da forma que são criados. Cães que vivem nas ruas estão mais suscetíveis a contrair doenças, como cinomose, verminoses e erlichiose. Cães que possuem casa e são bem-cuidados, recebem acompanhamento veterinário, vacinas, vermífugos e carrapaticidas têm menor riscode contraírem essas doenças”, afirma Mariane.
Saiba Mais
Cuidados
Segundo o médico veterinário Jean Veras, o mito de que os cães SRD são mais resistentes a doenças é muito comum, e isso faz com que muitos tutores de vira-latas achem que seus pets demandam menos cuidados ou possuem uma "saúde de ferro". "Assim como qualquer outro cão, eles necessitam de atenção à saúde, com visitas ao médico veterinário, realização de vacinas e exames de rotina", assegura o especialista.
A publicitária Gabriela Gomes é tutora de Caramelo, um vira-lata de três anos que, em 2022, foi levado para uma praça em Ceilândia após ser resgatado de uma autoestrada. Desde que conheceu o cachorrinho, em 2022, ela sempre garantiu que os cuidados com a saúde dele estivessem em dia, antes mesmo de adotá-lo. "Com ajuda de algumas vizinhas, cuidamos dele, que recebeu vacinas e remédios. Por seis meses, ele morou na praça, em uma casinha de papelão feita por mim", lembra ela.
Em 2023, Gabriela descobriu que Caramelo estava com um tumor venéreo transmissível (TVT) e o levou para casa. "Eu adaptei minha casa para recebê-lo, e ele passou pelo tratamento lá, onde ficaria mais fácil manter os cuidados", relata. O tratamento de Caramelo durou três meses. "Ele foi feito com a aplicação de uma medicação imunossupressora via intravenosa, um tipo de quimioterapia", explica. Depois da última aplicação do remédio, os veterinários constataram a remissão do tumor, e Caramelo finalmente ficou bem.
Hoje, ele tem uma rotina tranquila. "Ele faz três passeios por dia, come uma ração adequada e vai retornar ao veterinário para fazer novos exames depois de seis meses", conclui Gabriela. Histórias como as de Caramelo comprovam que os vira-latas não são imunes a doenças e precisam de tantos cuidados quanto os cães de raça. "Se você está pensando em adotar um, certifique-se que terá espaço, tempo para que vocês possam compartilhar momentos inesquecíveis juntos e recursos financeiros para garantir a ele uma vida saudável e de longevidade", finaliza o veterinário Jean Veras.
*Estagiária sob a supervisão
de Sibele Negromonte
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br