É bastante tentador imaginar que nós, no mundo contemporâneo, com toda sua eletricidade, aparelhos eletrônicos e cafeína além da conta, temos o hábito de dormir menos que nossos ancestrais. Isso sem falar nos atuais índices de depressão, ansiedade e obesidade, que costumam atrapalhar o sono. Podemos encontrar relatos já no fim do século 19 de que as pessoas estavam dormindo menos que os antigos, mas parece que a história é um pouco diferente.
Uma pesquisa publicada no prestigiado periódico Current Biology mostrou que caçadores-coletores de três diferentes partes do mundo dormem até um pouco menos do que os homens de vida moderna. O registro da rotina de sono de comunidades de caçadores-coletores na Namíbia, Tanzania e Bolívia que vivem sem luz elétrica apontou que eles dormem, em média, 6,5 horas, menos que a média das sociedades atuais, que é de aproximadamente 7 horas.
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A pesquisa ainda demonstrou que essas comunidades unplugged não tiram cochilos durante o dia, deitam-se para dormir cerca de três horas após o pôr do sol e acordam antes do sol nascer. Eles também dormem uma hora a menos no verão. Apesar de terem genéticas e viverem em ambientes bem diferentes, os hábitos de sono não foram diferentes entre as comunidades. O padrão de sono descrito na Europa antiga dividido em dois tempos separados por um intervalo em vigília não foi identificado nas comunidades estudadas, sugerindo que esse sono não interrompido deva ser o padrão natural dos nossos ancestrais mais antigos, e que o sono europeu repartido já foi uma adaptação às condições ambientais do continente.
Chamou muita atenção a quase inexistência de insônia, o que nos faz interrogar se a simulação desses ambientes arcaicos não poderia ser eficaz no tratamento da insônia dos homens de vida moderna.
*Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp, professor do curso de medicina do Unieuro e neurologista do Instituto do Cérebro de Brasília