Dentro do útero, na barriga da mãe, o bebê vive em seu próprio universo e ali, protegido pelo líquido amniótico, começa a praticar todo o tipo de movimento. Ele dá cambalhotas, mexe as pernas e os braços e começa até mesmo a chupar o dedinho. Ao mesmo tempo, em uma combinação semelhante aos movimentos de translação e rotação da Terra, ele sente e também se move conforme a sua mãe.
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Não à toa, quando o bebê nasce, andar com ele no colo e balançar suavemente é uma das estratégias usadas para acalmá-lo e fazê-lo dormir. O embalo o lembra do seu lugar de conforto e proteção e o deixa mais tranquilo. O movimento conjunto, entre mãe e filho, vem desde o início da gestação, e existe hoje uma série de atividades que permitem que as famílias continuem a fazer esse exercício, de uma forma que beneficia a todos.
A dança materna (@dancamaterna), criada pela bailarina e professora Tatiana Tardioli, surgiu, justamente, do desejo dela de continuar dançando após o nascimento da primeira filha. "Eu dirigia uma companhia de dança na época e, quando dançava, tinha a consciência da presença dela em mim, me emocionava dançando e percebia como uma maneira muito forte de nos comunicarmos", lembra.
Há 16 anos, Tatiana continuou cultivando esse sentimento, prestando atenção aos movimentos conectados entre ela e sua bebê e, quando começou a procurar pessoas e lugares onde pudesse vivenciar um parto humanizado, descobriu uma rede de profissionais à frente do processo de humanização do parto e da gestação.
A partir daí, ela percebeu que também poderia fazer a diferença para a vivência de outras mães, criando aulas de dança para gestantes e também para mães e bebês de colo e engatinhantes. "São danças muito diferentes. Para a gestante, trabalhamos com um viés de autoconhecimento, preparação para o parto e com o cuidado de não se entregar ao sedentarismo durante a gravidez", ensina.
Já a dança com os bebês, tem foco no acolhimento do puerpério. O ambiente é de cuidado para mães e bebês, e o trabalho corporal busca trazer conforto para a mãe. "O corpo fica muito cansado e, ao mesmo tempo, precisa de exercícios e práticas que tragam o bem-estar físico sem exaurir ainda mais". Tatiana ressalta que o objetivo é manter o corpo saudável, com movimentos que levam em consideração as necessidades do pós-parto, como o fechamento da diástase e o fortalecimento pélvico.
Professora da dança materna em Brasília, a educadora física e bailarina Aline Salih Alencar Oliveira, tem dois filhos e está grávida pela terceira vez. Foi na segunda gestação, em 2021, que conheceu a atividade e resolveu se tornar também professora. "É um trabalho muito gostoso, passei a ter um tempo de conexão com meu bebê e me conectei também com outras mães, criando uma rede de apoio e de amizades", acrescenta.
A aula começa com um momento para as mães. Os bebês ficam nos tapetinhos, com brinquedos próprios, enquanto as mães fazem massagens, alongamentos e exercícios posturais. A ideia é soltar o corpo. Depois disso, vem uma massagem nos bebês, preparando-os. Por fim, eles vão para o sling e começa a dança.
"Seguimos o fluxo dos bebês, as turmas são menores para que todos recebam esse cuidado e atenção. Algumas vezes, a massagem pode demorar mais; outras, o alongamento. Depende muito deles e deixamos livre caso eles precisem mamar, trocar fralda, cochilar", explica Aline.
Corpo em movimento
Ela ressalta a importância de colocar o corpo em movimento após o nascimento de um filho. "Exercitamos a consciência corporal para entender que aquele corpo mudou, e vamos percebendo e atendendo essas necessidades", explica.
A dança é toda pensada para esse corpo no puerpério. As professoras ensinam a respiração correta para favorecer a ativação abdominal e contribuir com o fechamento da diástase. São explorados movimentos orgânicos que respeitam os limites de cada mãe. Mesmo assim, Aline afirma que a atividade garante que elas possam suar um pouco.
"Trabalhamos o aeróbico. Claro que não é de alta performance ou nada assim, mas existe, sim, a atividade física que é considerada de intensidade média e promove essa volta para o exercício", completa.
Sling dance
Mariana Russo, professora de dança há 28 anos e criadora do método de sling dance que leva o seu nome, acrescenta que todos os benefícios da dança se aplicam às modalidades entre mães e bebês.
Ela destaca o fortalecimento muscular, o aumento da flexibilidade, a diminuição de dores musculares, a melhora na postura e o alívio de tensões acumuladas durante os movimentos do dia a dia. "Quando temos um bebê, estamos o carregando o tempo todo, amamentando, e passamos muito tempo nessas posições, o que pode gerar essa tensão muscular que é liberada durante a dança", explica.
O método sling dance Mariana Russo (@slingdance) surgiu, assim como o dança materna, da maternidade e da vivência de sua idealizadora. Quando teve seu bebê, em 2012, Mariana percebeu os inúmeros benefícios do sling e os movimentos que o objeto permitia entre mãe e bebê. Ela ressalta a importância do objeto no período do puerpério, não só para as mães, mas também para os pais. "É uma forma de estimular o contato pele a pele. O toque e o contato são muito importantes para o bom desenvolvimento do bebê e para o fortalecimento do vínculo afetivo", explica.
Mariana acrescenta que a dança entre mães e bebês é uma forma de promover o bem-estar físico, mental e emocional e não só pode, como deve, ser também praticada pelos pais. "Como qualquer pessoa, eles têm a potência da dança, e o sling é uma forma superimportante de estimular o contato pele a pele que eles acabam tendo menos por não amamentar. Promove essa conexão e essa proximidade afetiva entre eles e os bebês", completa.
Momentos a sós
Mãe de três, Theo, 7 anos, Cauã, 2 e Iara Brito, 25 dias, a bióloga Fernanda Brito, 37, é uma entusiasta da dança materna desde o nascimento do segundo filho. "Eu já tinha um filho mais velho e foi muito importante ter esse momento a sós com o bebê, já que, em casa, sempre dividia a atenção entre os dois", comenta.
Além de poder curtir o novo bebê, Fernanda afirma que o autocuidado foi uma das coisas que a conquistou e trouxe alegria. Estar ali, mesmo que com o filho, cuidando do próprio corpo, se mostrou fundamental para seu bem-estar. E como se isso já não fosse incrível para Fernanda, que pretende dançar também com Iara, ali surgiram laços de amizade com outras mães que duram anos e se transformaram em uma enorme rede de apoio.
A bancária Andressa Meggiolaro dos Santos, 39, também tem três filhos, Daniel, 5, Felipe, 2, e Clarisse Meggiolaro dos Santos, 20 dias, e poder dividir algumas horas com cada filho separadamente é uma prioridade para ela.
Além do momento de conexão e carinho com o bebê, a dança, para Andressa, é uma das formas de sair de casa, espairecer, aliviar a rotina e colocar o corpo em movimento. "É muito fácil esquecer da gente mesma, e a dança traz uma disposição emocional e física para podermos curtir mais a maternidade", acredita.
Para ela, que não é muito fã de academia, se mover enquanto dança com um dos filhos é uma das melhores maneiras de fugir do sedentarismo. A atividade também a incentivou a começar caminhadas e ter mais coragem para sair de casa pela primeira vez com um bebê.