Atropelamento, envenenamento e maus-tratos são alguns dos riscos aos quais os gatos que têm acesso livre às ruas estão expostos. A maior chance de contrair doenças, brigar com outros gatos e comer lixo ou alimentos contaminados se somam aos perigos, que diminuem consideravelmente a expectativa de vida desses animais.
O veterinário Frederico do Vale comenta que as lesões causadas pelas brigas com outros gatos e até mesmo com cães também podem causar inflamações e infecções, além de machucados internos que podem passar despercebidos pelos tutores. Entre as doenças, Frederico destaca a leucemia felina (FeLV) e imunodeficiência felina (FIV), infecções virais transmitidas com bastante facilidade entre gatos.
A bióloga e veterinária Lara Beatriz de Miranda Belmonte acrescenta a contaminação por parasitas, como pulgas, carrapatos, vermes e fungos, além das infecções bacterianas. Quando não são vacinados, os riscos de contrair infecções são ainda maiores. Quando não são castrados, contribuem para o aumento no número de animais de rua e podem pegar infecções sexualmente transmissíveis.
"Além dos perigos para si mesmos, esses gatos podem oferecer riscos para outros animais, crianças ou adultos da mesma forma que os felinos que vivem nas ruas. Embora possam ser mais dóceis, diminuindo assim as chances de ataques, eles têm alto potencial transmissor de doenças, como a toxoplasmose, a leptospirose, a raiva e a esporotricose, por meio de arranhões, lambidas ou mordidas, devido a um fungo muito comum em gatos”, acrescenta Lara.
Quanto aos riscos de toxoplasmose, Frederico faz a ressalva de que, embora seja uma possibilidade, é mais difícil, uma vez que é necessário que o humano tenha contato direto com as fezes de um animal contaminado. “Se porventura a pessoa tiver contato com um gato de rua ou que tenha acesso a ela, é importante sempre lavar as mãos quando limpar as fezes, por exemplo.”
Para manter dentro de casa
A natureza exploradora dos gatos dificulta que eles fiquem restritos a um ambiente, mas existem maneiras de evitar, ou pelo menos diminuir, as fugas e os passeios. Lara indica que o ambiente em que o animal vive deve contemplar todas as suas necessidades básicas, como alimentação, espaço para as necessidades fisiológicas e brincadeiras e estímulos que o mantenham entretido.
Em apartamentos, as janelas devem ter grades ou redes de proteção, e a porta deve ser mantida fechada. Nesses casos, sem a proteção, há ainda o risco de quedas que podem resultar na morte ou em ferimentos graves.
Saiba Mais
-
Revista do Correio Aproveite o fim de semana para passear com seu bichinho na ParkPets
-
Revista do Correio Confira sete brinquedos perigosos para cachorro
-
Revista do Correio Veja cinco razões que fazem do cachorro o melhor amigo do homem
-
Revista do Correio Confira nove cuidados importantes com cachorro de grande porte
-
Revista do Correio Anote 7 dicas para fortalecer a imunidade de cães e gatos
-
Revista do Correio Crueldade animal pode deixar traumas físicos e emocionais nos bichinhos
Em casas, pode-se destinar um espaço para eles, que também seja protegido com grades, cercas ou telas. Nos muros, é possível usar hastes e outros elementos que impeçam que os bichanos pulem. Quando não é possível impedir o acesso à rua, já que, em casas, a própria configuração arquitetônica e os telhados podem favorecer a fuga, Lara indica a castração. “É uma medida que ajuda a diminuir consideravelmente, ou quase eliminar, os passeios. O instinto de exploração e de reprodução, que os motiva a sair atrás de parceiros, diminui muito”, explica.
Além disso, a veterinária indica o uso de coleiras de identificação de microchips, o que ajuda a encontrar o animal em caso de desaparecimento e impede, inclusive, que ele seja adotado por outra família que pode achar que ele não tem casa.
Impedir os passeios é o principal obstáculo para a servidora pública Ana Cristina Oliveira, 52 anos, e de sua filha, a estudante Luana Uchoa de Oliveira, 18. A família sempre gostou de animais, mas costumava ter apenas cachorros, há cerca de 10 anos uma gata adotou a família.
Em uma viagem de férias, elas passaram um mês fora e, quando voltaram, descobriram que uma gata havia escolhido o depósito da churrasqueira para ter três filhotes. Um dia, a mãe veio e levou um filhote embora; no dia seguinte, levou o outro. O terceiro acabou ficando com a família, esperando pela mãe, que não voltou. “É a Lua, a nossa primeira gata. Como não tínhamos o hábito de criar gatos, não chegamos a fechar e telar a casa e, mesmo castrada, ela acabou crescendo acostumada com mais liberdade”, conta Luana.
Depois da chegada de Lua, todo gato que Ana Cristina e Luana viam na rua abandonado era resgatado. Como a maioria já chegava na casa da família adulto, era praticamente impossível impedir que eles saíssem. “É diferente quando você adota filhote e vai criando, desde o início, o animal dentro de casa. Ele se habitua. Mas o gato adulto que vivia na rua já tem um território grande estabelecido e acaba fugindo de vez se não os deixamos mais livres”, explica a estudante.
A situação, infelizmente, já trouxe bastante dor para a família, que só pega gatos que estão em situações de risco. Ao todo, três animais foram atropelados perto da casa, que fica na esquina de um condomínio. O sofrimento, no entanto, não impede que elas continuem ajudando os animais que precisam. Ana Cristina acredita que, apesar dos riscos de criar gatos com acesso à rua, eles estavam em situações de perigo muito maior antes de serem acolhidos pela família.
Apaixonadas por animais, elas fazem parte de uma iniciativa do condomínio onde moram que captura e castra os gatos de rua da região. Atualmente, cuidam de cinco bichanos, incluindo Lua, a primeira, Lucy, Fernando e dois mais novinhos sem nome. “Eu ainda tinha a ilusão de que eles ficariam apenas por um tempo, como lar temporário, então não deixei ninguém dar nome. Hoje, cada um os chama de uma coisa diferente”, conta, rindo, Ana Cristina.
Os últimos dois adotados foram acolhidos depois de serem resgatados de uma acumuladora de animais, e eram filhotinhos. “Esses são os mais caseiros, pois os criamos dentro de casa, presos, e são castrados, evitando, assim, que corram tantos riscos.”
O impacto ambiental
Atualmente, Lara atua na assessoria da gerência de monitoramento e controle de fauna no Jardim Botânico de Brasília e ressalta que, ao falar de gatos de rua, é necessário considerar a questão ambiental.
Ela explica que os gatos, assim como os cães, são animais domesticados há centenas de anos e não fazem mais parte da natureza selvagem, dessa forma, não têm mais predadores, e a população não é controlada naturalmente. No entanto, eles são predadores de animais selvagens, seu instinto aguçado faz com que cacem, inclusive, por prazer. “Mesmo sendo bem alimentados em casa, os animais que têm acesso à rua caçam e trazem a presa como prêmio para seu tutor”, acrescenta.
O resultado é que os bichanos têm sido responsáveis pela extinção de vários animais invertebrados. “Houve um caso, na Nova Zelândia, em que um único gato foi responsável por levar à extinção de uma espécie de ave que era endêmica, só existia ali”, lamenta Lara.
A bióloga e veterinária afirma que é extremamente necessário abordar também esse aspecto relacionado aos felinos domésticos, porque os tutores não têm ideia de que, além dos riscos para ele mesmo, o gato pode trazer problemas para o ambiente e a natureza local.
“Muitas vezes, nós, os seres humanos, não temos ideia do quanto abandonar um animal ou deixá-lo solto pode impactar a natureza, e os estragos que causamos. Os animais selvagens merecem a nossa preocupação tanto quanto, e eu diria até mais, os animais domésticos. Porque eles têm um papel importantíssimo na natureza e mantêm um equilíbrio do qual nós dependemos para viver, principalmente na realidade em que vivenciamos hoje com a crise climática”, completa.