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O que é a deficiência de G6PD, problema hereditário que afeta bebês

Descubra como cuidar da saúde diante da carência hereditária da glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD), que exige identificação precoce no teste do pezinho. No Brasil, desafios persistem, mas a esperança surge com diagnóstico e tratamento

Teste do pezinho é importante para diagnosticar doença em seu início -  (crédito: Reprodução: Janko Ferli?/Unsplash)
Teste do pezinho é importante para diagnosticar doença em seu início - (crédito: Reprodução: Janko Ferli?/Unsplash)
postado em 15/01/2024 10:14 / atualizado em 15/01/2024 10:17

A glicose-6-fosfato desidrogenase, ou G6PD, é como um guarda-costas molecular dentro das células, zelando para que a fonte de energia (G6PD) permaneça protegida. Contudo, em certas situações, é preciso um cuidado extra para garantir o funcionamento sem problemas. Pode-se imaginar as células como casas e essa fonte de energia como a eletricidade vital que as mantém em funcionamento.

Quando a G6PD está enfraquecida, essa fonte de energia pode ser danificada, resultando em problemas de saúde, como a icterícia – coloração amarelada da pele após o nascimento – em recém-nascidos. No mundo, mais de 400 milhões de pessoas, incluindo seis milhões de brasileiros, são afetados por essa condição, tornando-a um problema de saúde pública significativo. A herança ligada ao cromossomo X torna a deficiência de G6PD mais prevalente, impactando até 2,5% dos recém-nascidos, com 1% podendo desenvolver icterícia patológica nas primeiras 24 horas de vida.

O Departamento Científico de Hematologia e Hemoterapia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) elaborou um documento que destaca a importância da avaliação minuciosa da deficiência de G6PD em recém-nascidos e lactentes com anemia e icterícia associadas. O gene da G6PD, localizado no cromossomo X, não apenas vincula a deficiência ao sexo, mas também serve como marcador genético relevante para diferentes etnias.

Os autores e especialistas responsáveis pela elaboração do documento enfatizam haver variabilidade nas manifestações clínicas da deficiência de G6PD, desde casos assintomáticos até hemólise de diferentes graus de gravidade, desencadeada por fatores como medicamentos, alimentos, infecções e até mesmo o leite materno. O diagnóstico desempenha papel crucial, associando a deficiência de G6PD à mortalidade neonatal e à morbidade infantil. Testes de triagem neonatal, recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), incluem determinação de fluorescência, atividade enzimática de G6PD e detecção de mutações.

Conforme destaca a pediatra e neonatologista Maria Eduarda Canellas, é essencial explorar as opções de tratamento disponíveis para crianças com deficiência de G6PD, assim como compreender como os profissionais de saúde podem colaborar efetivamente com os pais para assegurar um manejo adequado dessa condição ao longo do desenvolvimento infantil.

“Não há um medicamento curativo ou que controle a hemólise ocasionada pela deficiência de G6PD. Deve-se evitar os gatilhos de hemólise, suspender fármacos precipitantes ou substâncias deflagradoras e prover medidas de suporte. Ao longo da hemólise aguda, o tratamento é de suporte; as transfusões são raramente necessárias. O conhecimento franco da doença é a melhor terapia que temos hoje para controle das complicações", concluiu a pediatra.

Confira a seguir mais detalhes da deficiência, segundo a especialista Maria Eduarda Canellas:

Causas e diagnóstico

— A deficiência de G6PD é hereditária, afetando a capacidade de lidar com estresse oxidativo.
— O gene da G6PD, localizado no cromossomo X, torna a condição ligada ao sexo, sendo mais prevalente em homens.
— A triagem neonatal, como o Teste do Pezinho, é vital para diagnóstico precoce e prevenção de hemólise.

Sintomas e identificação precoce

— Manifestações clínicas variam de assintomáticas a hemólises graves desencadeadas por medicamentos, alimentos e infecções.
— Sinais incluem icterícia neonatal, anemia aguda com palidez e dor abdominal.
— A anemia hemolítica crônica é uma variante rara com esplenomegalia e alterações laboratoriais.

Desafios no cuidado pediátrico

— Hemólise episódica após estresse oxidativo, como febre e infecções, requer precauções.
— Evitar infecções e substâncias oxidantes, como certos alimentos, é crucial para prevenir crises hemolíticas.

Impacto nas escolhas alimentares e estilo de vida

— Orientações alimentares específicas são essenciais para evitar desencadear crises.
— Listas de medicamentos e alimentos a evitar são fornecidas às famílias.

No Distrito Federal

No DF existe o Protocolo de Atenção às Crianças com G6PD é uma iniciativa da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, da equipe do Núcleo de Saúde da Criança (NUSC), Portaria SES-DF nº 335 de 30/12/2013, publicada no Diários Oficial do DF nº 2 de 03/01/2014.

O protocolo visa orientar profissionais de saúde na Atenção Primária à Saúde (APS), com destaque para a identificação precoce por meio do teste do pezinho. A prevenção inclui evitar desencadeadores, como alguns tipos de alimentos, certas infecções e medicamentos. O acompanhamento clínico visa assegurar o bem-estar das crianças afetadas, com ênfase na nutrição e na monitorização laboratorial.

A iniciativa representa um esforço significativo para lidar com a alta prevalência da deficiência de G6PD na população, promovendo ações preventivas e garantindo o adequado acompanhamento dessas crianças.

Palavra do especialista

Como a deficiência de G6PD pode influenciar não apenas a saúde hematológica, mas também as respostas a certos medicamentos e a predisposição a certas condições, tornando-a uma condição multifacetada?

Nesta condição, os glóbulos vermelhos ficam mais suscetíveis ao estresse oxidativo e podem sofrer hemólise (destruição), principalmente em caso de infecções agudas ou uso de determinadas medicações. O processo de hemólise pode gerar anemia e impactar na qualidade de vida. A maior parte dos indivíduos com deficiência de G6PD é assintomática, mas deve evitar fatores que predispõem a estresse oxidativo e hemólise, especialmente medicamentos específicos, como alguns anti-inflamatórios (ex.: dipirona, aspirina), sulfas (ex.: dapsona), antibióticos (ex.: ácido nalidíxico, nitrofurantoína), antimaláricos (ex.: primaquina) e antidiabéticos orais (ex: glibenclamida). Alguns alimentos também devem ser evitados, como o feijão-fava, pouco comum no Brasil. A deficiência de G6PD também deve ser suspeitada em casos de icterícia neonatal (coloração amarelada da pele após o nascimento), quando outras causas mais comuns foram afastadas.

Considerando avanços recentes na pesquisa, há perspectivas promissoras para tratamento ou intervenções específicas para deficiência de G6PD? Como essas inovações podem potencialmente transformar o cenário de cuidados hematológicos no futuro?

Com o avanço da medicina, o diagnóstico da deficiência de G6PD tem sido cada vez mais precoce, pois pode estar presente inclusive no teste do pezinho. O teste do pezinho no Distrito Federal é um dos mais completos do país e detecta a deficiência de G6PD. O teste comercial também está amplamente disponível, caso haja suspeita em crianças maiores ou na fase adulta. Fazendo o diagnóstico precoce, as crianças e suas mães podem ser orientadas quanto ao prognóstico e como evitar os fatores desencadeantes de hemólise, especialmente uma lista já bem definida de medicações. O tratamento é de suporte, mas a maior parte dos episódios de hemólise é autolimitada, e a anemia ocorre de forma transitória, sendo raro ocorrer anemia hemolítica crônica ou necessidade de transfusão sanguínea. Evitando os desencadeantes de hemólise, as pessoas com deficiência de G6PD comumente têm uma vida totalmente normal.

Rafael Fernandes Pessoa Mendes é hematologista da Rede D’Or Brasília

*Estagiária sob a supervisão de José Carlos Vieira

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