Neurônios em dia

Precisamos de mais marcadores para as doenças neurodegenerativas

O desenvolvimento de marcadores para outras causas de demência que podem se confundir com o Alzheimer é urgente, pois pode auxiliar no diagnóstico de outras patologias

cérebro ilustração -  (crédito: Maurenilson Freire/CB/D.A Press)
cérebro ilustração - (crédito: Maurenilson Freire/CB/D.A Press)
postado em 01/12/2023 14:16

Os hipocampos poderiam ser chamados como os principais centros da memória no cérebro, localizam-se nos lobos temporais, e a redução de seus tamanhos predizem o declínio cognitivo em idosos. A interpretação imediata para esse fato é de que a atrofia dessas estruturas seriam sinais precoces da doença de Alzheimer. Essa interpretação está, na maioria das vezes, correta. Entretanto, uma pesquisa recém-publicada pela Neurology, periódico da Academia Americana de Neurologia, mostra que o déficit cognitivo subsequente pode não estar associado exclusivamente à doença de Alzheimer.

Para chegar a essa conclusão, pesquisadores da Harvard Medical School e de outros centros na Europa e na Austrália acompanharam idosos sem queixas cognitivas por uma década. Mediram de forma seriada as estruturas cerebrais pela ressonância magnética, assim como o contingente de acúmulo das proteínas tau e beta-amiloide através do exame PET (tomografia por emissão de pósitrons). Esses exames PET têm sido repetidamente apontados como preditores de declínio cognitivo na doença de Alzheimer. Idosos sem queixas cognitivas, mas com PET anormal para ambas as proteínas, têm 50% de risco de apresentarem declínio cognitivo nos próximos dois a cinco anos.

Os resultados do presente estudo mostraram que os idosos com menores volumes dos hipocampos tiveram maior risco de declínio cognitivo durante o período de seguimento. Isso já era esperado. O que chamou mais a atenção foi o achado de que essa associação é independente dos resultados dos exames de PET, sugerindo que outras doenças neurodegenerativas, não só o Alzheimer, podem ser responsáveis pelo declínio cognitivo.

Entre essas doenças degenerativas devemos nos lembrar de algumas bem menos comuns que o Alzheimer e que têm diagnóstico somente através de lâminas de patologia na necropsia, já que ainda não temos biomarcadores para detecção enquanto o indivíduo está vivo. Uma delas é a LATE (Limbic-predominant age-related TDP-43 encephalopathy), descrita em 2019. Limbic é o envolvimento preferencial da doença nos circuitos límbicos, semelhante ao Alzheimer; Age related nos diz que é uma doença que ocorre em idosos, de forma mais gradual e numa idade até mais avançada que no Alzheimer; TDP-43 diz respeito ao acúmulo de proteínas com esse mesmo nome; Encephalopathy significa disfunção cerebral difusa. PART foi descrita em 2014 e é um outro diagnóstico que pode se assemelhar clinicamente com a demência de Alzheimer. PART é o acrônimo para “Primary Age-Related Tauopathy”, condição em que o acúmulo de proteínas beta-amiloide não é expressivo.

Qual a importância disso tudo? Recentemente, três novas drogas para o Alzheimer (anticorpos monoclonais) mostraram efeitos na redução da velocidade do declínio cognitivo e no depósito de marcadores patológicos (placas beta-amiloides), resultados que nos deixam enxergar uma luzinha no fim do túnel. Entretanto, os resultados clínicos foram muito modestos, e uma das explicações para isso é a de que outros diagnósticos foram incluídos nos estudos, além da doença de Alzheimer. O desenvolvimento de marcadores para essas outras causas de demência que podem se confundir com o Alzheimer é urgente. Um marcador da proteína TDP-43 auxiliaria também no diagnóstico de metade dos pacientes com demência frontotemporal que apresenta depósitos dessa proteína e de 97% dos casos de esclerose lateral amiotrófica.

*Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp, professor do curso de medicina do Unieuro e neurologista do Instituto do Cérebro de Brasília

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