Em pouco tempo, a vida de Kize Pinon passou por uma reviravolta — o pedido de demissão do emprego concursado, o fim do casamento e o rompimento com a melhor amiga. Tudo isso em meio à pandemia da covid-19 e com uma filha ainda bebê para criar. A única coisa que alentava a ex-servidora pública era a lembrança dos torrones que comia com a avó paterna, nascida na Espanha, ainda criança. Daí, veio a vontade de saborear aquela memória afetiva para se sentir melhor.
Kize começou, então, a procurar um lugar que vendesse o autêntico torrone europeu. Não queria aqueles industrializados disponíveis em supermercados. Revirou a internet e não encontrou nada em Brasília; achou uma marca, mas era do Paraná. Quando estava prestes a fazer a encomenda, torcendo para que eles enviassem pelos Correios, descobriu uma confeiteira de São Paulo que dava aulas on-line de como preparar o doce original. Decidiu, então, fazer o próprio torrone.
Nascida no Rio Grande do Sul, Kize mudou-se para o Rio de Janeiro quando tinha 2 anos de idade. Aos 9, veio, com os pais, para Brasília, onde passou três anos e voltou para a Cidade Maravilhosa. O reencontro com a capital só aconteceu tempos depois, quando, aos 21 anos, passou no concurso da Força Aérea Brasileira (FAB). Aqui, se estabeleceu, casou-se e teve uma filha.
Mas foi justamente com a chegada da maternidade, há quatro anos, que ela resolveu dar um novo rumo à vida. "Eu não era respeitada no meu trabalho. O ambiente era extremamente machista e hierarquizado, e eu não queria dar esse exemplo para a minha filha." Apesar da estabilidade, sonho de muita gente, pediu demissão, em 2020. Pouco tempo depois, em janeiro de 2021, veio o divórcio.
Kize fez, então, um curso para ser doula e abriu um negócio com a melhor amiga. Mas as coisas não andaram do jeito que esperava e as duas decidiram mudar de ramo. Passaram a produzir e vender doces sob encomenda. "A gastronomia sempre esteve presente na minha vida. Minha mãe cozinha muito bem, fazia salgados para fora e eu sempre a ajudava. Lembro de, com uns 10 anos, nós duas preparando pão", recorda-se.
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Infelizmente, o negócio em sociedade com a amiga não deu certo. E o pior: a amizade acabou. "Nessas horas de tristeza, a lembrança boa que vinha à minha mente era eu e minha avó comendo torrones, dava um quentinho no coração." Os avós chegaram ao Brasil após a Segunda Guerra e se estabeleceram no Paraná, onde o pai de Kize nasceu. Já a mãe é baiana, de descendência indígena.
Quadradinhos de amor
Em abril de 2022, a ex-servidora fez o curso de torrones. "O primeiro que fiz sozinha ficou tão duro que caiu no chão e se espatifou todo", diverte-se. Mas Kize não desistiu. Foi fazendo experimentos na cozinha da sua quitinete. Muitos deram errado; outros ficaram gostosos. Foram aproximadamente quatro meses de erros e acertos até ela achar que estava preparada para comercializar os torrones, em julho de 2022. Assim nascia a Piñon Torroneria (@pinontorroneria). "Poucos meses depois, em dezembro do ano passado, a minha avó morreu", lamenta.
A princípio, Kize desenvolveu a receita com mel e amêndoas, a clássica europeia, como faz questão de ressaltar. Mas também começou a fazer versões com amendoim — a mais famosa no Brasil — e pistache. Depois, vieram outras variações, e a confeiteira foi adicionando sabores: chocolate, cranberry, limão, café, noz pecan, matchá, figo turco… Em datas festivas, costuma criar sabores especiais — já está a todo vapor para as ofertas de Natal.
Como já tinha experiência em vender as sobremesas do seu antigo negócio pelas redes sociais, usou o Instagram para anunciar os seus torrones. "Mas eu queria um ponto fixo que servisse de vitrine", diz. Foi aí que surgiu a oportunidade de comercializar os seus produtos na Mercearia Colaborativa, na 412 Norte. A partir daí e do boca a boca, recebeu convite para fornecer seus produtos para a loja de massas Casa do Manjericão e também para participar de feiras e eventos da cidade.
Aliás, esse contato pessoal com o cliente é o que mais encanta Kize. "Quando as pessoas chegam na feira e veem que tem uma barraca vendendo torrones, os olhos delas se iluminam. Muitas se emocionam e dizem que o doce trouxe boas memórias", conta. Exatamente como aconteceu com ela própria. "Muitos se tornaram clientes assíduos, fazem encomendas semanalmente."
Saiba Mais
O torrone feito pela Piñon é do tipo macio, típico da Itália. Mas Kize já planeja desenvolver a receita dos mais duros, populares na Espanha. Ela também tem planos de dar aulas on-line. Os quadradinhos custam a partir de R$ 7 e podem ser vendidos em caixinhas com quatro ou dez unidades. "Muita gente procura para presentear. Acima de 20 unidades, tem um desconto de 15%."
Kize conta que não se acomodou com a estabilidade de um emprego que não a fazia feliz. "Eu provei que é possível fazer os torrones em uma quitinete, onde eu moro com minha filha. Hoje, eles pagam as minhas contas."
Foudant chocolate
Ingredientes
4 ovos
300g de chocolate amargo
170g de farinha de amêndoas
170g de açúcar cristal
Modo de fazer
Preaqueça o forno a 180ºC e unte uma forma redonda de fundo removível com óleo vegetal e cacau.
Derreta o chocolate em três ou quatro tempos de 30 segundos no micro-ondas, mexendo nos intervalos para que o chocolate não queime. Eu usei chocolate amargo 40% cacau, mas você pode usar um com intensidade maior, como preferir.
Em um bowl, misture a farinha de amêndoas e o açúcar. Depois que o chocolate estiver derretido, acrescente e misture à farinha e ao açúcar.
Bata os 4 ovos ligeiramente. E incorpore rapidamente à mistura com chocolate.
Transfira a massa para a forma untada com cacau e leve para assar por cerca de 25 minutos.
O foundant tem interior molhadinho e casquinha crocante. Se você é fã de brownie, mas não pode comer farinha de trigo ou leite, essa é uma ótima opção para matar a vontade!
Serviço
Instagram: @pinontorroneria