Cecília de Araújo demorou até decidir que profissão seguir. Iniciou o curso de arquitetura e abandonou quatro anos depois; ingressou na faculdade de administração e largou após três anos e meio; trabalhou na empresa do pai, mas não se sentia realizada e pediu demissão. Em 2013, resolveu mudar radicalmente. Vendeu o carro e o apartamento que ainda estava pagando, pegou todas as economias e foi estudar gastronomia em Nova York, cidade que sempre amou. "Na primeira semana de aula, sabia que era aquilo que queria para a vida", conta.
O prazer de comer bem e se reunir em torno da mesa sempre esteve presente na vida de Cecília. Filha de pai capixaba e mãe baiana, ela nasceu em Antas, na Bahia, mas se mudou ainda criança para Goiânia, onde viveu dos 7 aos 36 anos. "Minha avó paterna, Odete, cozinhava muito bem, assim como a minha mãe. Desde cedo, eu as ajudava na cozinha, queria aprender. Mas eram comidas simples, e eu nunca imaginei que aquilo se tornaria minha profissão."
Em Nova York, Cecília se matriculou em um curso integral, de seis meses, na renomada International Culinary Center (ICC) — escola que fechou as portas em 2020, durante a pandemia — e foi aprender técnicas da clássica cozinha francesa. "A escola sempre estava presente em eventos, como casamentos, festas e até o US Open de Tênis, e os alunos podiam se voluntariar para trabalhar. Eu ia em todos", diverte-se.
Terminado o curso, a baiana resolveu ficar um pouco mais pelos Estados Unidos, aperfeiçoando o inglês. Depois de quase dois anos, voltou para Goiânia decidida a trabalhar com gastronomia. Montou, então, um curso de bon gourmand, em que ensinava pessoas que queriam aprender desde o básico da cozinha até se aprimorar em pratos mais sofisticados. Também era contratada para dar aulas em lojas e eventos. Em quase três anos como professora, contabilizou 312 alunos.
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Encontrando a confeitaria
No início de 2018, Cecília descobriu que estava grávida. Na mesma época, apareceu a oportunidade de o então marido montar um negócio em Brasília e, assim, ela se mudou para a capital. Decidiu dedicar-se integralmente à pequena Maria Alice, que nasceu em outubro daquele ano.
Mas ficar parada — por mais que os cuidados com a casa e com a filha recém-nascida tomassem todo o seu tempo — era uma novidade para Cecília. Ela resolveu, então, fazer um curso on-line de bolo de camada. "Não é uma técnica fácil de fazer, afinal as camadas precisam ficar perfeitas, assim como o recheio", detalha. Até aquele momento, a confeitaria era algo distante na vida da chef, que sempre tinha se dedicado à comida salgada.
Cecília começou a fazer testes e desenvolveu um bolo de massa de cacau com um toque de café e recheio de brigadeiro com chocolate 52%. Deu a ele o nome de Alice, em homenagem à filha, e sempre o levava para as festas de família. "Minha sogra começou a fazer propaganda para todas as amigas até que uma delas me encomendou um bolo, em abril de 2019. Eu fiz e foi um sucesso", recorda-se.
E novas encomendas foram chegando. Cecília passou, então, a fazer, além do bolo Alice, brigadeiro e cookies, e a vender na casa de carne do agora ex-marido. "Achei que a confeitaria era um bom caminho a seguir, pois conseguiria trabalhar em casa e cuidar de Alice." Mas ela só tinha, basicamente, um produto, que era vendido em dois tamanhos.
Logo depois, criou uma nova torta com pistache e fava de baunilha e a batizou de Romero, em homenagem ao ex-marido. Mas, assim como aconteceu com o bolo Alice no início, só servia nas reuniões familiares. Por insistência dos parentes, acabou, um ano depois e já em meio à pandemia da covid-19, também o comercializando. Agora, no cardápio, havia dois bolos. E as encomendas não paravam de chegar.
Cecília percebeu que a cozinha de casa já não dava conta e, em sociedade com o ex-marido e com a ex-cunhada, abriu, em julho de 2021, um espaço, na Asa Sul, onde, além de produzir os bolos, os clientes podem pegar as encomendas e até sentar para tomar um café com bolinho. Na Cozinha Alice, além dos bolos Alice e Romero, é possível adquirir outras criações que ela foi desenvolvendo ao longos dos últimos meses. Detalhe: todos em homenagem a pessoas importantes na vida da confeiteira. "Os meus bolos sempre têm uma história por trás", garante.
Assim, surgiu o bolo Selma, feito com pistache, um toque de azeite e um mix de chocolates, o preferido da mãe de Cecília. Já o bolo Odete, batizado com o nome da avó paterna, é produzido com chocolate e coco. "Para chegar à textura que queria, criei uma pasta de coco, que é feita aqui e leva quatro dias para ficar pronta", detalha.
A ex-sogra Samira ganhou um brownie de chocolate e a amiga Taís, um cookie de avelã com chocolate. "Desenvolvi a minha própria Nutella", brinca. No cardápio, há ainda lascas e barras de chocolate. Em breve, a confeiteira pretende lançar outro bolo em homenagem à filha, que sempre está na cozinha ajudando a mãe nos preparos. "Como Maria Alice não gosta de chocolate, no aniversário de 4 anos dela, criei um bolo de baunilha, framboesa e limão. Foi um sucesso. Agora, vou vendê-lo." Para a festa de 5 anos da garota, em outubro, Cecília está trabalhando em um bolo com blueberry e limão. "Como ela quer um bolo azul, vai ficar lindo e gostoso."
A chef ressalta que só usa farinha e açúcar cristal orgânicos, prepara a própria pasta dos recheios e, o principal, faz tudo com muito amor e dedicação. "Meus bolos são feitos para marcar a memória." Agora, resta saber quem será o próximo homenageado!