Você já parou para se perguntar quanto lixo produz em um único dia? Talvez, com a correria da rotina, essa contagem pareça difícil de estipular, mas aí vão algumas lembranças: o copinho descartável do café na firma, a embalagem de plástico do doce que compra no fim da tarde, o pote de hidratante que joga fora antes de se deitar e por aí vai. Isso porque nem chegamos no tópico dos desperdícios — de água, de energia, de roupas e de saúde.
Munida dessa inquietação e motivada pelo movimento lixo zero, a então designer gráfica Cristal Muniz criou, em 2015, o blog Um ano sem lixo, no qual reuniria seus aprendizados acerca do tema. Se para alguns a escolha soa trabalhosa, para ela foi sinônimo de viabilidade e liberdade. Afinal, imagine só a satisfação em produzir os próprios cosméticos com ingredientes selecionados e eficientes?
A iniciativa cresceu, o blog tornou-se Uma vida sem lixo e Cristal passou a estudar nutrição. No Instagram @umavidasemlixo, começou a compartilhar dicas de como reduzir o desperdício com medidas simples, ensinando receitas de produtos de limpeza e de cosméticos fáceis. Já foram mais de três milhões de acessos no site, enquanto na rede social acumula cerca de 240 mil seguidores.
Em 2018, escreveu o primeiro livro sobre lixo zero do Brasil, o Uma vida sem lixo, finalista do Prêmio Jabuti na categoria Economia Criativa. A publicação funciona como um super guia de como viver uma vida mais sustentável e, dividido por cômodos, apresenta 29 receitas de como fazer substituições inteligentes para reduzir a produção de lixo. Além disso, a criadora de conteúdo tem dois ebooks: um sobre beleza natural e outro sobre produtos de limpeza naturais.
“Acredito que sustentabilidade tem que ser pra todos, simples e descomplicada. Para mim, é menos sobre o que a gente usa, tem ou faz e muito mais sobre como a gente usa, cuida e pratica”, afirma a escritora e influenciadora digital.
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Cinco perguntas para Cristal Muniz
Quando essa consciência ecológica se fez mais latente em sua vida? Era algo compartilhado por seus familiares na infância?
Acho que eu sempre tive essa percepção sobre o desperdício desde criança. Na minha família, eu tinha muitos exemplos para evitar desperdiçar e isso sempre me impressionou de alguma maneira. Mas foi só quando eu estava morando sozinha que comecei a questionar a questão do lixo em si, porque achava muito lixo para uma pessoa que morava sozinha e não era acumuladora, consumista. Eu não tinha um comportamento que — para mim — justificasse gerar tantas sacolas toda semana. Isso ficou ali, latente, me incomodando, até que eu conheci, um pouco por acaso, o movimento lixo zero. Eu não fui atrás ativamente de uma solução, porque nem pensava que isso seria possível.
Você criou o projeto Uma vida sem lixo em 2015. Como foi esse início? Precisou lidar com muito hate ou descrenças?
Na verdade, foi o contrário. Eu sempre recebi muito entusiasmo e abertura das pessoas, por isso, sempre digo que moro em um “oásis da internet”. Acho que isso tem a ver com o fato de eu apresentar o conteúdo, num primeiro momento, como um desafio pessoal que eu estava indo atrás. E, num segundo momento, passado o primeiro ano, continuar trazendo os conteúdos de uma forma que eles aparecem como soluções, além de debater muito as simplificações disso. Acho que essa abordagem faz as pessoas se sentirem convidadas a experimentar, daí o hate não faz sentido e as descrenças fazem a gente debater e construir.
Quais passos mais simples ou básicos daria aos iniciantes que pretendem se inspirar no seu projeto?
Eu sempre digo para as pessoas começarem aos poucos e, de preferência, escolherem um lixo que elas detestam produzir (risos). Eu sugiro isso, porque acho que, quando a gente consegue parar de produzir um lixo que detesta, há uma satisfação muito grande que serve de motivação para um próximo passo. Alguns exemplos de trocas simples que podem puxar outras: ter consigo um copinho para evitar os descartáveis na rua; levar um guardanapo de pano na bolsa; trocar opções descartáveis por retornáveis, como o coletor menstrual no lugar dos absorventes tradicionais; levar uma ecobag para fazer as compras; ter talheres de metal e saquinhos de pano para comprar vegetais; optar por cosméticos em barra em vez de líquidos, que geram menos resíduo plástico; e escolher latinha de alumínio e vidro no lugar de plástico.
Considera que há uma área da vida na qual seja mais difícil reduzir o lixo? É algo que leva certo tempo para se acostumar?
Acho que a dificuldade é muito individual, porque depende de como é a vida de cada um: tem filhos? Tem animais de estimação? Trabalha fora ou em casa? Passa muito tempo fora de casa? Alimenta-se onde? Posso dizer que, para mim, o setor mais desafiador é a cozinha — e acho que para todo mundo gera um trabalho constante —, justamente por estarmos sempre comprando, cozinhando, comendo, lidando com as sobras etc. Além de ser um cômodo da casa que gera bastante resíduo (cerca de 50% do total), estes também são muito fáceis de acontecer caso não fiquemos atentos, pela questão da alta perecidade. E certamente leva tempo, pois não existe uma resposta única para cada problema, então, às vezes, a gente precisa testar algumas opções para descobrir a que melhor funciona.
As redes sociais permitem uma troca significativa de interações (e aqui incluo saberes e experiências) entre quem produz e quem consome conteúdos. Nesse sentido, o que aprendeu e aprende com o público do Uma vida sem lixo?
Olha, eu acho difícil responder porque eu aprendo muitíssimo com minha comunidade. São pessoas inquietas como eu, que me trazem dúvidas e me fazem pesquisar muito e, com isso, aprendo demais, além de também trazerem soluções para eu testar. É realmente uma comunidade! Eu gosto de dizer que me sinto muito mais como mediadora desse conteúdo, como se eu fizesse o filtro, botasse em prova e apresentasse a melhor solução.
Cristal indica
- Livro Resista: Não faça nada, de Jenny Odell
“Gosto muito desse livro para pensar como estamos gastando nosso tempo para nos orientarmos sobre as prioridades na vida.”
- Livro Cozinhando sem desperdício: Receitas sustentáveis para o gourmet consciente, de Lisa Casali
- Condicionador em Barra Hidratação Profunda, da marca B.O.B Bars Over Bottles
- Flanela Ecológica, da marca Positiva
Mão na massa!
Receita 1: desengordurante de cascas de laranja
Ingredientes
Casca de uma laranja (de preferência sem aquela parte branca da fruta)
1 e ½ xícara de água ou o suficiente para cobrir
Utensílios
Liquidificador
Pano ou voal para coar
Modo de fazer
Bata tudo no liquidificador até virar quase um suco. Os óleos da casca vão se soltar nessa mistura. Coe com o pano e armazene o líquido na geladeira por até três dias. O resíduo pode ir para a composteira, mas, como é cítrico, misture com outros restos de frutas e verduras.
Modo de usar
Use o líquido para limpar bancadas, armários, pia, fogão e outros móveis da cozinha que costumam ficar engordurados. Também funciona como desinfetante para limpar o chão. E, se você quiser, pode até lavar louça com essa mistura. Não faz espuma, mas é só ir molhando a bucha enquanto lava.
Receita 2: creme dental
Ingredientes
3 colheres (sopa) de óleo de coco
1 colher (sopa) de bicarbonato de sódio
10 a 15 gotas de óleo essencial de hortelã (opcional)
Utensílios
Pote de vidro
Colher pequena para aplicar
Modo de fazer
Misture tudo no pote de vidro. Se o óleo de coco estiver líquido, deixe-o na geladeira até solidificar. Na hora de usar, aplique com uma colherinha a quantidade de creme dental desejado na sua escova. Você também pode usar um potinho com válvula tipo pump para facilitar o uso e evitar a contaminação. Essa quantidade dura cerca de 1 mês para uma pessoa adulta.
Fonte: Livro Uma vida sem lixo
*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte
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