Neurônios em dia

Por dentro de um cérebro super eficiente com 90 anos de idade

Estudo mostra que mesmo os idosos que chegam aos 90 anos com o as funções cognitivas preservadas apresentavam alterações microscópicas vasculares ou associadas à doença de Alzheimer

Ricardo Afonso Teixeira*
postado em 07/06/2023 18:55 / atualizado em 07/06/2023 18:56
 (crédito: Thiago Fagundes/CB/D.A Press)
(crédito: Thiago Fagundes/CB/D.A Press)

Você pode imaginar que as pessoas ao chegarem aos 90 anos de idade com as funções cognitivas excelentes tenham um contingente menor de alterações estruturais no cérebro quando comparadas àquelas com declínio cognitivo por doença de Alzheimer. Entretanto, um estudo recém-publicado pelo Journal of Alzheimer’s Disease, liderado por pesquisadores da Universidade da California-Irvine, nos EUA, apontou que as autopsias desses “super-olds” apresentavam alterações microscópicas vasculares ou as associadas à doença de Alzheimer da mesma monta quando comparadas às de indivíduos com a doença. Super-olds são os idosos que chegam aos 90 anos com o as funções cognitivas preservadas.

Esses achados sugerem que os cérebros de pessoas com envelhecimento cerebral funcionalmente ótimo sejam mais resilientes a essas alterações patológicas, comuns também entre indivíduos idosos sem doença. Essas lesões são consideradas marcadores da doença de Alzheimer e essa suposta resiliência não aconteceria nos indivíduos que desenvolvem a doença. Os resultados ainda mostraram que os super-olds tinham menos lesões que estão associadas a outras doenças neurodegenerativas, como a doença de Parkinson. A menor presença dessas outras lesões (corpúsculos de Lewy e esclerose hipocampal) é um forte candidato para explicar a resiliência dos super-olds, e novos estudos deverão pontuar como os hábitos de vida podem influenciar esses achados neuropatológicos. O cérebro de Olga Kotelko, atleta aos 93 anos, já nos trouxe algumas pistas sobre o impacto da atividade física no cérebro que ultrapassa os 90 anos.

A canadense Olga Kotelko, detentora de mais 30 recordes mundiais em diversas modalidades de atletismo, faleceu no ano de 2014, mas teve seu cérebro estudado cuidadosamente em 2012 pela Universidade de Illinois nos EUA. Os pesquisadores compararam o desempenho cognitivo de Olga e as características da ressonância magnética de seu cérebro com outras 58 mulheres com idades entre 66 e 78 anos. Nessa época, Olga tinha 93 anos. Os resultados foram publicados na revista Neurocase.

O estudo mostrou que o cérebro de Olga era mais volumoso do que o esperado para sua idade. Surpreendente foi encontrar que a parte do cérebro que liga os dois hemisférios, o corpo caloso, era mais intacta em Olga do que entre as mulheres 10 ou 20 anos mais jovens!

O desempenho cognitivo de Olga mostrou-se levemente inferior ao das mulheres mais jovens, mas superior ao de mulheres da mesma idade e não atletas de um estudo independente. Os hipocampos de Olga, área cerebral fortemente responsável por nossa memória, também eram menores que o das mulheres de 60-70 anos, mas maiores que o de mulheres da mesma idade.

Estudos prévios já haviam demonstrado que a atividade aeróbica é capaz de garantir um bom funcionamento cerebral entre os idosos e até preservar o volume de algumas áreas estratégicas do pensamento, como o hipocampo.

O mais interessante é que Olga iniciou sua vida de atleta aos 65 anos e passou a se dedicar ao atletismo aos 77. Competiu em corridas curtas e longas, saltos e arremessos de disco, martelo e dardos.

*Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília

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