Pablo Picasso em sua “fase azul e rosa", no século 20, é uma boa referência para introduzir o monocromatismo — a aplicação de apenas uma cor. Antes de lançar suas obras mais icônicas, como Guernica e Les Demoiselles d’Avignon, com a técnica cubista, o pintor criava quadros com tons e subtons da mesma cor, criando os efeitos monocromáticos.
Na fase azul de Picasso, pinturas dramáticas e sombrias eram representadas por meio de variantes dessa cor. Porém, a sensação que a cor fria e seus tons transportavam em suas obras iam além dos sentimentos representados e traziam, também, a sensibilidade da unificação e harmonização de um espaço.
É exatamente o que acontece com ambientes monocromáticos, selecionados de acordo com as necessidades e intenções colocadas naquele local. A partir de uma cor base, os outros elementos, como decoração e móveis, serão escolhidos em versões mais neutras ou mais saturadas daquele tom.
Julia Cabral, arquiteta especializada em neuroarquitetura, explica que ambientes monocromáticos trazem a sensação de unidade e formam uma espécie de "caixa", trazendo equilíbrio, sem muita movimentação. “As cores, suas nuances e contrastes influenciam nossa percepção do espaço, ativando áreas específicas do cérebro, despertando emoções diferentes, criando a visão de um ambiente maior ou menor”, explica a arquiteta.
“A mesma cor no teto, no chão e nas paredes também cria a democratização do lugar. Imagine uma sala onde todo mundo conversa, come e trabalha; se aplicarmos o estilo monocromático, as pessoas passam a ser mais flexíveis sobre onde realizar suas atividades naquele espaço”, esclarece Cecília Werneburg, formada em design de interiores pela Pontifícia Universidade Católica do Chile.
Qual cor escolher
A conscientização do espaço é o segredo para essa escolha. O que realizamos em nossa rotina vai determinar se a cor escolhida vai ajudar ou atrapalhar nossa percepção das situações. Lembrando que cada cor desperta reações diferentes em nós, sendo elas positivas ou negativas.
Se quer um ambiente mais calmo, relaxado e organizado, cores como branco, bege e cinza vão ajudar nessa missão; agora, se quer um ambiente para te deixar animado e atento, o amarelo e o laranja vão se adaptar muito bem. “Tons vivos podem criar uma atmosfera fantasiosa, por ser algo que não encontramos com frequência na natureza, e, assim, estimula a criatividade, o humor e a energia”, detalha Julia. “Já os tons pastéis, criam ambientes sem excessos, estimulam menos áreas cerebrais e trazem sensação de relaxamento, diminuindo o estresse e a ansiedade.”
Mas é preciso estar atento a essas percepções de maneira individual. A arquiteta ainda pontua que, apesar dos estudos sobre psicologia das cores serem analisadas de maneira ampla, essa reação também depende da vivência de cada um. “Por exemplo: uma pessoa na infância recebe carinho da avó em uma colcha de cor vermelha, ela pode associar essa cor ao relaxamento, apesar de que, para a grande maioria das pessoas, é uma cor que desperta energia”, analisa Julia.
O uso de uma cor também influencia na escolha dos elementos que vão acompanhá-la, como as texturas. “Ela se torna sócia e apoiadora da escolha dos materiais decorativos: um tricô, por exemplo, se destaca muito mais em um ambiente com tons claros. Se reparar nas fachadas de cafés, restaurantes e prédios, as pedras e madeiras estão substituindo elementos frios, como o porcelanato ou granito”, detalha a designer Cecília.
Pandemia
O confinamento fez com que usássemos nossos espaços para comer, trabalhar e estudar sem divisória alguma. “Começa-se, então, a sentir incômodo com a cor da parede, com objetos em demasia, como muitos móveis, caixas e pertences que, provavelmente, não eram usados e estavam lá por lembrança”, conta Cecília Werneburg.
Entende-se melhor a necessidade de organizar, ampliar e otimizar espaços que não tinham utilidade, mas que, com a pandemia, precisaram ser ocupados. “Por isso, os arquitetos e designer de interiores tiveram muito trabalho nos últimos anos, e, logo após a pandemia, aconteceu um ‘boom’. As pessoas passaram a procurar muito esses profissionais”, constata a designer. “Isso também justifica o fato de o monocromatismo e o minimalismo entrarem tão em alta nesses tempos. Eles andaram juntos na hora de pensar em um ambiente para a pandemia”, exemplifica.
Isso faz com que possamos vivenciar experiências mais tranquilas e assertivas dentro de casa, ajuda a enxergar com mais clareza a essência dos nossos espaços e como usá-los de forma eficiente. “As madeiras e pedras naturais entraram muito em tendência, na cor que elas têm, somadas ao monocromatismo natural: móveis de madeira, pedras decorativas, folhas secas e o chão de concreto”, conta Cecília. “A tendência é que, nos próximos anos, as pessoas, cada vez mais, tenham consciência do seu ambiente e procurem montar espaços saudáveis”, finaliza.
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A arquiteta Gilda Mara, do Studio RC, especializado em arquitetura e design de interiores, produziu três simulações de uma cozinha monocromática, exclusivamente, para a Revista. Confira:
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