"Comer é um luxo", afirmou o chef catalão Ferran Adriá diante de uma plateia recheada de empresários, cozinheiros e entusiastas da gastronomia, no Centro de Congressos e Feiras de Málaga (FYCMA), na semana passada. Atração mais esperada da 25ª edição do Salón de Innovación en Hostelería (H&T), um dos principais eventos de gastronomia e hotelaria da Espanha, o chef que revolucionou a forma como se pensa e serve a comida falou sobre a necessidade de formatação da alta gastronomia, lembrou que o objetivo do extinto El Bulli, restaurante que fechou há 12 anos, nunca foi ganhar dinheiro e ressaltou que, para ele, o "novo luxo" é, por exemplo, beber um bom café.
"Estamos vivendo um momento histórico, em que os modelos de negócio que conhecemos estão mudando", contextualizou Adriá, considerando tanto os custos atuais para manter uma operação gastronômica quanto a urgência de repensar as longas jornadas de trabalho e o ambiente tóxico dos restaurantes.
Para o catalão, o setor nunca teve tanta vontade de mudar como agora. E usou como exemplo a experiência que teve com o próprio restaurante, localizado na Costa Brava da Espanha e responsável por apresentar ao mundo as esferas, espumas e fumaças no prato: "Eu fechei porque nós cansamos", declarou, diante do público atento. Cansaram, quis dizer, de buscar todos os dias "os limites de uma experiência gastronômica", levando todos a uma "exaustão física, emocional e espiritual", causada frequentemente por jornadas de 10 horas seguidas de trabalho em pé.
O futuro da alta gastronomia
Questionado se o fato do Noma (restaurante dinamarquês que anunciou em janeiro o seu encerramento) seguir por um caminho de pesquisa parecido com o El Bulli é um prenúncio para o mercado do fine dining, Adriá rebateu prontamente: "Nós não somos modelos".
Convicto de que sempre haverá espaço para a "restauração gastronômica", o mais revolucionário dos chefs não parece ter dúvidas sobre o sucesso deste modelo de negócio, desde que seja estratégico e tenha como foco também a sustentabilidade financeira. "Há muita gente no mundo com muito dinheiro", lembrou, antes de concluir a teoria: "As pessoas que têm dinheiro vão aos restaurantes onde podem gastá-lo".
A próxima revolução
"A América Latina é muito importante", frisou em diferentes momentos o eleito cinco vezes melhor chef do planeta, deixando pistas de onde deve acontecer o próximo grande marco da cozinha mundial. Ciente de que a Europa ainda tem um grande deficit de informação quando se trata de profissionais de fora do Velho Continente, Adriá garantiu que países como o México, o Peru e o Equador já têm "se posicionado como destino para o turismo gastronômico" e influenciado o mundo. É no México, aliás, que está a "cozinha mais extraordinária" de todas, alertou o catalão, antes de declarar a receita para alavancar qualquer país: "Um lugar é um bom destino gastronômico quando tem uma cozinha criativa e uma cozinha tradicional".
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O legado do El Bulli
No ano em que o encerramento do El Bulli completa 12 anos, Ferran Adriá se prepara para abrir, finalmente, as portas do El Bulli 1846, um museu erguido onde antes funcionou o restaurante. O objetivo, explicou o catalão durante o evento em Málaga, é que "as pessoas da gastronomia, e também todas as outras, possam entender o que aconteceu ali", citando como exemplo a institucionalização da pinça como instrumento para finalização dos pratos, que ultrapassou as fronteiras da Catalunha e invadiu o mundo.
Vai ser também no segundo semestre que o El Bulli Foundation lançará o maior projeto pós-restaurante: uma série documental de 15 episódios, com 300 entrevistas e mais de duas mil horas de captação "para explicar tudo o que fizemos", antecipou Adriá.
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