Quem já visitou Pirenópolis ou conhece alguém que esteve na cidade, provavelmente, ouviu falar nas joias produzidas no município. Após mais de 40 anos de tradição como referência na produção de peças artesanais em prata e pedras preciosas, a cidade goiana foi agraciada com a Indicação Geográfica (IG) da prata, um selo de procedência reconhecido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).
A modalidade reconhece e protege um território notório pela fabricação, produção ou extração de um determinado bem ou serviço e veio para agregar ainda mais valor à região como produtora de joias exclusivas e com um estilo próprio reconhecido nacional e internacionalmente. Pirenópolis é o segundo município do estado a conquistar o selo por produzir produtos especiais. O Brasil possui somente 100 IGs.
O selo foi concedido ao município em 2019, mas o processo para a conquista começou em 2012 com a criação da Associação Cultural e Ecológica dos Artesãos em Prata de Pirenópolis (Aceapp), que reuniu artesãos e, com a ajuda do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae-GO), trabalhou para cumprir os critérios do INPI de concessão do IG da prata.
Em 2020, foi criado o Conselho Regulador do IG de Pirenópolis, composto por artesãos e representantes do Sebrae-GO, da Secretaria de Turismo de Pirenópolis e da Secretaria de Indústria e Comércio do Estado de Goiás. Dessa forma, o selo é concedido às joias e aos artesãos por meio desse colegiado formado por representantes locais, capacitados para analisar os critérios e conceder o IG.
"A função do conselho é avaliar a qualidade das joias que receberão o selo. São feitas reuniões em que as pessoas apresentam as peças para avaliação. O essencial para que elas recebam o selo é que sejam feitas artesanalmente por um joalheiro do município. É preciso ser produzida em prata 925 ou 950. As pedras têm de ser naturais ou de elementos originários da natureza", explica a tesoureira e coordenadora de projetos da Aceapp, Marisa Pacheco.
"O IG nos abre portas para buscar outros mercados. É um selo de peso. Nós temos o privilégio de ser o segundo item que recebeu o IG no estado de Goiás", declara Maria Delma de Melo, artesã e presidente da Aceapp, referindo-se ao açafrão da Região de Mara Rosa, outro produto que também foi agraciado com o IG. "A indicação geográfica é uma ferramenta de proteção coletiva. É justamente para diminuir pirataria, ilegalidade, é para que a gente consiga ter rastreabilidade", complementa o gestor de Indicação Geográfica do Sebrae Goiás, João Luiz Prestes Rabelo.
O início de tudo
Em meados de 1978, grupos de artesãos de várias partes do Brasil e do mundo chegaram a Pirenópolis com o intuito de montar comunidades alternativas, acabaram criando a Cooperativa Agroartesanal Terra Nostra e se firmando na cidade. Desde então, começaram a desenvolver a joalheria em prata e a ensinar aos jovens nativos da cidade o labor do artesanato de joias. Em Anápolis, a 50km de Pirenópolis, havia um Centro de Gemologia, o que ajudou a dar uma base de conhecimento em pedras e metais aos artesãos que foram surgindo no município.
O paulistano Carlos Ronald Henrique, 65 anos, mais conhecido como Tatu, foi um dos artistas pioneiros que fixaram residência em Pirenópolis nos anos 1980. Ele não se define como hippie e sim como "maluco de estrada". Ao chegar à cidade, montou um ateliê e vive por lá até hoje. A clientela de Tatu fica, essencialmente, no Rio de Janeiro e em São Paulo. "Sempre mexi com artesanato, é a minha paixão", diz.
"A produção de peças em prata veio para somar com aquilo que Pirenópolis já tinha de melhor: belezas naturais, gastronomia, saberes e fazeres dos nossos antepassados", afirma o prefeito do município, Nivaldo Melo. "Valorizamos muito a indústria da prata aqui porque, para mim, não há programa social maior do que a geração de empregos. Isso dá cidadania, dá dignidade para as pessoas. Buscar o próprio sustento", completa o prefeito.
"A produção de joias em Pirenópolis incentiva o fluxo turístico e movimenta a economia", diz a secretária de Turismo da cidade, Vanessa Leal. "Quanto mais local, maior o valor global. Nossos artesãos são, literalmente, as pratas da casa", conclui a gestora.
Saiba Mais
Tradição consolidada
Hoje, há 112 artesãos que produzem joias em prata em Pirenópolis. A atividade é responsável pela geração de empregos, além de fomentar o turismo e a economia local. Há aqueles que têm a joalheria como segunda fonte de renda, há os profissionais que tornaram o artesanato em prata sua principal e única fonte de receita e tem aqueles que tornaram-se empreendedores e hoje geram empregos.
Maria Delma de Melo, 53, é um exemplo de artesã que virou empresária e hoje, além de gerar empregos, trabalha estimulando jovens a desenvolverem a profissão. Ela começou a trabalhar com joias em prata há 36 anos, lapidando pedras até ganhar uma bolsa no Centro de Gemologia de Anápolis para cursar joalheria. "Montei meu ateliê há 29 anos. Tudo o que eu tenho hoje — casa, carro, lote, minha loja, meu café —, eu tirei do meu trabalho com joalheria", conta ela, orgulhosa.
"Não há como dissociar a joalheria do destino turístico. Os turistas querem conhecer a história dos artistas. Temos vários ateliês de joias que também são cafés e restaurantes", diz o gestor de Indicação Geográfica do Sebrae Goiás, João Luiz Prestes Rabelo.
Luiz Triers, 35, trabalha com ourivesaria há oito anos, desde 2014, e é um dos jovens artesãos que adquiriu conhecimento em joalheria bebendo na fonte dos veteranos, como Maria Delma. Luiz sente-se honrado em poder desenvolver joias e se juntar ao grupo de artistas de Pirenópolis. "O que mais me atrai na joalheria é o resgate antropológico. O ser humano evolui a partir da idade do metal. Ter a oportunidade de moldar o metal e transformá-lo em joias é uma função muito nobre", conta Luiz.
Sustentabilidade
A prata utilizada pelos artesãos de Pirenópolis é toda proveniente da reciclagem de radiografias, chips, peças de computadores, etc., ou vinda de países latino-americanos, como México, Argentina e Peru. "O próprio processo de polimento da joia gera um excedente de metal que é sugado por aspirador e reaproveitado", explica a artesã Maria Delma.
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