Moda

A moda das ruas: o estilo com peso social é voz ativa nas periferias

O streetwear, tendência que vem das quebradas, une elementos culturais diversos e traz debates sociais e políticos através de suas roupas e acessórios

Eduardo Fernandes
postado em 15/01/2023 08:00 / atualizado em 15/01/2023 13:10
 (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
(crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

Uma expressão da personalidade e uma essência que atravessa o mundo da moda, provocando impactos sociais e políticos. Assim é o streetwear, termo em inglês que significa Roupa de Rua, estilo que traz uma forma de se vestir mais casual, unindo peças esportivas, de skate, de surf e até mesmo de culturas musicais, como o punk e o rock.

O streetwear começou a ganhar o mundo na década de 1990, com a ascensão do movimento hip-hop, em Nova York, e o crescimento do surf na Califórnia. Seus passos, no entanto, foram dados 10 anos antes, com outras tendências mais variadas da época, oriundas de gêneros artísticos como pop, rock e punk.

Mas, com roupas largas, peças folgadas e outros itens, como joias, o streetwear acabou casando-se com o hip-hop, em uma união que perpassa estilos e mergulha em uma profunda discussão sobre movimentos políticos, levando a moda para o público das ruas.

Naturalmente, as narrativas da época se encontraram e provaram, em mais um dos inúmeros exemplos, como mostramos os posicionamentos políticos e sociais por meio das peças usadas, mesmo que nem sempre as pessoas estejam totalmente conscientes desse processo. O streetwear, dentro dessa perspectiva, continua a trazer, ainda hoje, debates e manifestações importantes por meio das vestimentas.

Representatividade

Para a designer de moda Laís Dairel, essa representação repercute com uma imensa força social. A roupa, além de vestir uma pessoa, é um objeto que pode ganhar vida e levar visibilidade para as camadas mais pobres da sociedade, aparecendo como instrumentos de atitude e discurso. Atualmente, o streetwear é uma tendência que foi apropriada pelas marcas de luxo, muito por conta do gosto da nova geração pela forma livre e despojada proporcionada pelo estilo. Além disso, a profissional acredita que essa direção seguida pela juventude surge com desejo de se encaixar em algum lugar, com roupas que, um dia, nunca pensaram que poderiam usar.

Tal movimento de desejo que as marcas geram sempre esteve atrelado ao que a elite ditou como moda, principalmente em séculos passados. Laís destaca que esse olhar de baixo para cima é visto pela sociedade como um ideal; um comportamento ainda pertinente e levado como bagagem por meio dos anos. "Os jovens veem a Lacoste, a Nike, os tênis desejados e tudo isso vai muito além da marca. É uma vontade de pertencimento que é inerente do ser humano, e que as peças traduzem de forma física", explica a especialista em moda.

Skatista e morador de Ceilândia, Lucas Gabriel Lima da Conceição, 20 anos, entende que o streetwear está presente na periferia há muito tempo. Assim como mencionado por Laís, o jovem enxerga que a elite, de alguma maneira, tomou para si as referências dos trajes usados. Entretanto, o ponto de partida e sucesso das roupas continua sendo da favela. "Eles fizeram isso para tentar mostrar algo que não são. Tudo isso foi feito pela periferia. A moda sempre foi a gente, a nossa moda", finaliza.

Elitista

O streetwear tomou essa direção contrária, veio das ruas mas acabou sendo elitizado, e hoje, é levado para a periferia novamente, como um meio de dizer: queremos o que é nosso de novo. Desta vez, segundo Laís, esse diálogo manifesta-se com uma sensação de vitória, uma vez que o uso das roupas se tornou tão inacessível, que ter elas mais uma vez é uma conquista para muitos. "Vemos muito isso em jogadores de futebol, normalmente, como são mais humildes, eles vão para o exterior e já se acostumam a usar grandes marcas para mostrar que conseguiram", ressalta.

Dessa forma, é possível estudar o indivíduo não somente pela moda, mas, também, correlacionado ao sonho que o move, de estar seguro e devolver a autoestima para si e para o local onde vive. Em contrapartida, a contemporaneidade ressurge com dilemas mais esperançosos quando o tema é citado. Para Laís, as barreiras que diferenciam as classes sociais pela forma como se vestem estão, cada vez mais, difusas.

"Hoje em dia a moda traz muitas opções e o mercado é muito vasto. Está mais relacionado em como as pessoas se vestem e o porquê. Às vezes as pessoas podem se vestir bem e você não saber se elas são ricas ou pobres. A linguagem de diferenciação de classes ainda existe, mas acredito que está diminuindo ao longo do tempo", esclarece a designer de moda.

 03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF.Revista.  Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Vitor da Silva.
03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF.Revista. Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Vitor da Silva. (foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

Universo feminino

O streetwear, além de estar bem presente no guarda-roupa masculino, ganha cada vez mais força entre as mulheres. Entre elas, Giovanna Paulino, 21, que começou a se apaixonar pelas roupas mais despojadas ano passado. “Há alguns anos, eu passava horas usando peças desconfortáveis só porque me achava bonita. Depois de um tempo, percebi que dá pra ter os dois e acredito que as roupas do estilo streetwear trazem exatamente essa proposta: você pode estar super confortável e também estilosa”, completa.

As peças que a jovem mais gosta de vestir, segundo ela, são as que garantem conforto, mas contribuem para melhorar sua autoestima, como blusas folgadas, moletom e calças Mom Jeans. As principais inspirações de Giovanna, dentro do estilo, são marcas que trabalham com êxito não somente nas roupas, mas também na maneira escolhida para a divulgação e o marketing das vestimentas.

“Não posso deixar de fora Nike, Adidas e Baw Clothing. Inclusive, depois de tanto despertar meu interesse nessas marcas, resolvi abrir minha própria marca, a Wea Streetwear. Comecei justamente com o intuito de trazer roupas que eu gosto de usar, porém não acho com tanta facilidade ou com boa qualidade e preço acessível”, revela.

Criada em outubro de 2022, a loja de Giovanna, como ela descreve, nasceu para restabelecer novos padrões que são uma febre atualmente. Mesmo como recém-chegada ao universo dos negócios, ela espera crescer no mercado e ganhar a visibilidade que tanto sonha.

Há seis meses , a paixão pelo estilo fez com que Giovanna criasse sua própria marca a Wea Streetwear.
Há seis meses , a paixão pelo estilo fez com que Giovanna criasse sua própria marca a Wea Streetwear. (foto: Fotógrafo/ Geovane Freitas)

Essência

Apesar das grandes marcas terem apostado no estilo, a consultora de imagem Patricia Coutinho analisa que o streetwear continua ligado diretamente à expressão da personalidade. É muito mais sobre como vestir um look do que, somente, usar algo caro sem que transpareça a essência de quem está usando. “A cultura hip-hop e o skate, hoje mainstream, continuam contribuindo para difundir, influenciar e propor essa inovação para a tendência de roupas de rua”, avalia.

Por esse jeito único, o estilo, mesmo globalizado, adequa-se à realidade de cada país ou região. De acordo com a profissional, o vestuário disposto no Brasil não é o mesmo encontrado em lugares como Estados Unidos e Inglaterra, por exemplo. “Isso seria a contracultura da maneira daquelas tribos se expressarem. Cada um se expressa dependendo daquela tribo, através das roupas, que podem ser diferentes”, enfatiza Patricia.

Isso, mesmo dentro do país, pode variar entre muitas localidades. Hiury Bueno, 19, mora em Santo Antônio do Descoberto e gosta de skate, praticamente, desde que nasceu. Onde mora, ele comenta que amigos e conhecidos se vestem com características diferentes, mas sem perder o respeito pelo estilo do próximo. Com atributos voltados para o surf, funk, rock ou rap, o jovem descreve que os elementos são diversos. Uma coisa que só se encontra em um lugar onde a diversidade existe. “O local em que a gente vive nos ajuda a ter o nosso próprio jeito”, afirma o skatista.

(BOX: Kyan, o trapper sensação do estilo)

Um dos rostos mais conhecidos por discursar sobre a importância da moda na favela é Renan Mesquita, rapper conhecido como Kyan. Uma das principais revelações do rap nacional desde 2019, o jovem de 22 anos estampa nas letras de música e nas roupas em que veste as marcas que sempre sonhou em ter e que são capazes de fazer meninos e meninas sonharem com o topo do mundo. Lacoste, Nike, Adidas e entre outros. Mais que ostentação, artigos de luxo são para ele conquistas nunca imaginadas.

 

Renan Mesquita é uma das revelações do rap nacional e discursa sobre moda na periferia.
Renan Mesquita é uma das revelações do rap nacional e discursa sobre moda na periferia. (foto: Reprodução/ Pinterest)

Peças para looks:

— Calças mais largas

— Bonés

— Correntes ou cordões

— Tênis com design street

— Toucas

— Camisetas folgadas

— Bags transversais

Fonte: Por Patrícia Coutinho (@patty.coutinho_)

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  •  03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF.Revista.  Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Hiury Silva Bueno.
    03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF.Revista. Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Hiury Silva Bueno. Foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
  •  03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF.Revista.  Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Hiury Silva Bueno.
    03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF.Revista. Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Hiury Silva Bueno. Foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
  •  03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF.Revista.  Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Vitor da Silva, Lucas Lima(bermuda) e Yuri Silva(cabelo grande)
    03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF.Revista. Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Vitor da Silva, Lucas Lima(bermuda) e Yuri Silva(cabelo grande) Foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
  •  03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF.Revista.  Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Lucas Lima da Conceição.
    03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF.Revista. Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Lucas Lima da Conceição. Foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
  • Vitor da Silva, Lucas Lima (bermuda) e Hiury Silva (cabelo grande)
    Vitor da Silva, Lucas Lima (bermuda) e Hiury Silva (cabelo grande) Foto: Fotos: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
  •  03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF.Revista.  Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Vitor da Silva.
    03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF.Revista. Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Vitor da Silva. Foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
  •  03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF.Revista.  Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Lucas Lima da Conceição.
    03/01/2023. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF.Revista. Moda Streetwear skatistas no Setor Bancário Sul. Lucas Lima da Conceição. Foto: Minervino Júnior/CB/D.A.Press
  • Rapper Kyan é um dos donos e representantes do estilo no Brasil.
    Rapper Kyan é um dos donos e representantes do estilo no Brasil. Foto: Reprodução/ Pinterest
  • Renan Mesquita é uma das revelações do rap nacional e discursa sobre moda na periferia.
    Renan Mesquita é uma das revelações do rap nacional e discursa sobre moda na periferia. Foto: Reprodução/ Pinterest
  • Moletons, calças largas e boné são peças usadas na moda streetwear.
    Moletons, calças largas e boné são peças usadas na moda streetwear. Foto: Reprodução/ Pinterest
  • Blusas mais folgadas são opções para composição do look.
    Blusas mais folgadas são opções para composição do look. Foto: Reprodução/ Pinterest
  • Acessórios como cordões ou relógios são bastante usados na tendência.
    Acessórios como cordões ou relógios são bastante usados na tendência. Foto: Fotos: Reprodução/ Pinterest
  • Há seis meses , a paixão pelo estilo fez com que Giovanna criasse sua própria marca a Wea Streetwear.
    Há seis meses , a paixão pelo estilo fez com que Giovanna criasse sua própria marca a Wea Streetwear. Foto: Fotógrafo/ Geovane Freitas
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