Moda

É hora de eles botarem, sem receio, as pernas para jogo (de novo)!

O verão chegou e trouxe consigo a tendência do shortinho masculino, tão comum nos anos 1970 e 1980. Compreender por que seu uso foi comum e perdeu popularidade no passado comprova que a moda é um assunto mais político do que se imagina

Letícia Mouhamad*
postado em 05/01/2023 07:00 / atualizado em 05/01/2023 18:10
 (crédito: Reprodução: Pinterest)
(crédito: Reprodução: Pinterest)

Olhe os antigos álbuns de famílias e observe as figuras masculinas. Você certamente os verá, em muitos momentos, exibindo as pernocas com tranquilidade. Não havia idade mais adequada para tal “ousadia” e estar fora do padrão de beleza não parecia ser um impedimento.

Em 1970, por exemplo, Pelé levantou a taça, conquistando o tricampeonato da Copa, de shortinho azul; em 1985, John Travolta requebrou, em uma cena do filme Perfeição, icônica até hoje, de minishort; e em 1991, Axl Rose performou no palco do Rock in Rio, quem diria, de shortinho!

Calma. Diferentemente do que fazem com as mulheres há tempos, não se trata, aqui, de uma sexualização do corpo masculino, mas, sim, de uma reflexão sobre como as tendências desse vestuário também se modificam ao longo dos anos conforme os costumes e as mudanças de comportamentos, afinal, como sempre é bom lembrar, nada na moda surge ou desaparece por acaso.

Axl Rose no Rock in Rio, em 1991.
Axl Rose no Rock in Rio, em 1991. (foto: Reprodução: Pinterest)

Por isso, recorrer à história é essencial para compreender o contexto em que determinado estilo se destacou. E, nesta viagem do tempo, cabe voltar ao final dos anos 1960, em que, no Brasil, o povo vivia sob uma ditadura militar, enquanto o movimento Tropicalista pregava inovações estéticas e comportamentais; lá fora, a Guerra do Vietnã se arrasava ao lado de uma geração de jovens ávidos por liberdade.

Liberdade esta que se manifestou, também, na moda. Porém, vale destacar, que tendências não nascem em passarelas. Nascem nas ruas, nos grupos, nas comunidades — muitas delas excluídas socialmente — e na arte, como pontuou Nanda Gomes, da Ouija Consultoria. “O shortinho masculino vem de carona com as saias curtas das mulheres, nos anos 1960. O corpo era instrumento de luta social, então, nada mais justo, em meio a uma guerra silenciosa, que os homens estivessem mais livres e em paz com o próprio corpo”, completa.

Outro ponto, destacado pela mercadóloga, especialista em Fashion Weeks e editora de moda Julianna Terra foi o culto ao corpo, muito forte no começo dos anos 1980, principalmente com a chegada da lycra, que deixava as peças ainda mais justas e enaltecia as curvas. Nesse ínterim, a moda esportiva, com shorts de ginástica e de times de futebol, caiu no gosto do público, reforçando a estética.

Semana de Moda Masculina de Milão, da Versace, em 2019
Semana de Moda Masculina de Milão, da Versace, em 2019 (foto: Versace/Divulgação)

Mas, por que os shortinhos perderam força nos anos seguintes — e por que isso importa? A moda é feita de ciclos. As tendências vêm e vão. E voltam. Como naquela teoria que prevê que a cada 20 anos um estilo em alta no passado, provavelmente, retornará, com algumas repaginações. Nos anos 1990, veio o grunge, com o Nirvana, e o hip-hop, com o 2Pac. Surgiram as bermudonas, os calções e as camisas largas. “A efervescência do skate e o sucesso de bandas como Charlie Brown Jr. e CPM 22, no Brasil, já nos anos 2000, foram a cereja do bolo”, pontua Julianna.

Preconceito

O Portal DASMODAS, entretanto, traz um tópico importante e digno de reflexão: com a crise da aids, ainda nos anos 1880, e o estigma em torno do vírus, chamado, à época, de “câncer gay”, as ideias preconceituosas eram disseminadas em escalas absurdas, promovendo marginalização e segregação. Certamente, o impacto disso na comunidade LGBTQIA+ foi imenso. E a moda, o que tem a ver?

Wil Smith de cropped, em Um Maluco no Pedaço, item que também perdeu força por um tempo no guarda-roupas masculino
Wil Smith de cropped, em Um Maluco no Pedaço, item que também perdeu força por um tempo no guarda-roupas masculino (foto: Reprodução: Pinterest)

Bom, todas as peças que se aproximavam de uma estética “afeminada” (como croppeds e regatas) começaram a entrar em desuso, dado que homens héteros não queriam ser confundidos com homens gays. Por isso, também, que os looks mais sóbrios, retos, largos e, por vezes, com uma aparência mais “desleixada” entraram em evidência. Obviamente, a roupa não define sexualidade nem gênero, mas diz muito sobre uma sociedade.

Como tudo o que vai, volta…

Fato é que a tendência retornou nos últimos anos, muito por conta desse ciclo da moda, que resgata estilos passados, mas também por outros fatores. Na pandemia, por exemplo, o conforto foi palavra de ordem e, agora, no “pós”, surge novamente o desejo por liberdade e, por que não, por vaidade, vontade de se sentir bem consigo. Eis que o shortinho ressurge, cumprindo os três pré-requisitos.

Emicida de shortinho
Emicida de shortinho (foto: Reprodução/Instagram)

Ademais, a moda agênero veio para questionar quem ainda olhava com maus olhos o comprimento da peça, considerando-a muito feminina. “Se olharmos para os desfiles das últimas temporadas, percebemos uma maior liberdade dos estilistas em criar para os homens. Percebemos a presença das saias, das modelagens mais ajustadas, das transparências, do comprimento cropped e de outros itens antes não utilizados no vestuário deles”, explica Julianna.

Como adotar

Para o verão, Nanda Gomes deixa algumas dicas de looks para usar seu shortinho em paz e sem medo de ser feliz:

- Para os mais ousados, aposte no jogo de cores. Um shortinho de cor sólida com uma blusa de botões em listras ou, até mesmo, com alguma estampa legal. Pode-se inverter essa lógica e apostar em um shortinho estampado com uma blusa lisa e básica. Ótima aposta para um dia na praia ou no parque.

Ator Paul Mescal por dentro da tendência
Ator Paul Mescal por dentro da tendência (foto: Click News and Media)

- Para os mais tímidos, a dupla algodão e linho nunca falha! Nada mais lindo que um homem de shortinho de algodão em uma cor neutra e uma bela camiseta ou blusa em linho.

- O queridinho do momento é ótimo marcando presença na academia. Aposte em uma blusa mais larga e confortável ou uma regata, caso goste. O corpo definido não dá para prometer, mas o estilo, sim!

*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte

Cobertura do Correio Braziliense

Quer ficar por dentro sobre as principais notícias do Brasil e do mundo? Siga o Correio Braziliense nas redes sociais. Estamos no Twitter, no Facebook, no Instagram, no TikTok e no YouTube. Acompanhe!

Newsletter

Assine a newsletter do Correio Braziliense. E fique bem informado sobre as principais notícias do dia, no começo da manhã. Clique aqui.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

  • Semana de Moda Masculina 
de Milão, 
da Versace, em 2019
    Semana de Moda Masculina de Milão, da Versace, em 2019 Foto: Versace/Divulgação
  • Emicida de shortinho
    Emicida de shortinho Foto: Reprodução/Instagram
  • Mateus Carrilho, na SPFW, para a marca anacê
    Mateus Carrilho, na SPFW, para a marca anacê Foto: Reprodução: Mateus Carrilho/Instagram
  • Axl Rose no Rock in Rio, em 1991.
    Axl Rose no Rock in Rio, em 1991. Foto: Reprodução: Pinterest
  • Wil Smith de cropped, em Um Maluco no Pedaço, item que também perdeu força por um tempo no guarda-roupas masculino.
    Wil Smith de cropped, em Um Maluco no Pedaço, item que também perdeu força por um tempo no guarda-roupas masculino. Foto: Reprodução: Pinterest
  • Ator Paul Mescal com a tendência
    Ator Paul Mescal com a tendência Foto: Click News and Media
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação