Ao falar em insetos, a maioria das pessoas torce o nariz e tem outras expressões que demonstram nojo. E quando o bicho em questão está no prato? É motivo mais que suficiente para jogar a refeição fora e, em um restaurante, chamar o garçom e fazer uma reclamação.
As diferenças culturais, no entanto, permitem que, ao imaginar um inseto no prato, algumas pessoas fiquem com água na boca. Em alguns países, como a Tailândia, grilos cozidos são comuns e vendidos até como enlatados, além de serem iguaria apreciada por turistas em feiras de rua.
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E segundo diversas organizações de saúde e relatórios, é possível que, em breve, os insetos se tornem tão comuns em nossos pratos como o feijão e o arroz. Eles surgem como uma das diversas fontes alternativas de alimentos que ajudarão a sanar uma futura crise de insegurança alimentar.
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), em 30 anos, a população mundial será de quase 10 bilhões de pessoas e, com o crescimento em ritmo acelerado, a indústria alimentícia não será capaz de suprir essa demanda, principalmente quando considerados os danos ambientais causados pelas atuais formas de produção.
Com esses dados como base, em 2020, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) publicou um relatório no qual foram apresentadas diversas fontes alternativas de alimentação, entre elas, os insetos.
Embora estejam entre as possibilidades que mais chamam a atenção pela forma como são vistos, os insetos são apenas uma das diferentes fontes de proteína, minerais e vitaminas apresentadas. As algas, a carne vegetal e as oleaginosas estão entre os alimentos citados pelo relatório.
Para o nutricionista Victor Madela, começar a enxergar fontes não tradicionais de nutrientes como alimentos comuns é importante não só no futuro, mas também no presente. Ele chama a atenção para um dado da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) que aponta que 75% dos alimentos do mundo são gerados a partir de 12 espécies de plantas e cinco espécies de animais. "Além de toda a questão da sustentabilidade e biodiversidade, isso também é prejudicial para o nosso organismo, que acaba tendo uma oferta muito limitada de nutrientes, e sempre por meio das mesmas fontes", explica.
Mas calma, isso não quer dizer que o nutricionista está sugerindo que você cate insetos no quintal e os coloque no prato. "As pessoas acabam tendo esse preconceito, mas é importante entendermos que esses insetos para consumo, por exemplo, são todos produzidos em um ambiente estéril e preparados, assim como as carnes."
Uma das maneiras que Victor sugere para trazer mais diversidade ao prato sem precisar se aventurar tanto é fazer parte de iniciativas como a entrega de alimentos CSA, que é quando um grupo de consumidores subsidia a produção de produtores rurais de micro e pequeno porte e recebe em casa os alimentos produzidos, semanal ou quinzenalmente.
Assim, é possível ter contato com alimentos diferentes e inseri-los no dia a dia, trazendo diversidade não só para o corpo, mas também para o paladar, fugindo do que Victor denomina monotonia alimentar e nutricional.
A nutricionista do Hospital Santa Lúcia Daniela Teixeira ressalta a importância de diversificar a alimentação e explica que quanto mais completa for a nutrição, mais fácil é para o organismo se adaptar às mudanças necessárias. "O processo precisa ser gradual, fazendo alterações mais próximas do habitual. E conforme as refeições vão se diversificando, é mais fácil alcançar uma constância no objetivo nutricional proposto", explica.
Entre os alimentos do futuro, ela menciona a carne vegetal, uma alternativa que, a depender da composição, é mais saudável que a carne animal, principalmente com relação à gordura saturada.
A spirulina, um suplemento obtido a partir de cianobactérias, também está entre os queridinhos nas refeições futuristas. "Ela contribui de inúmeras formas para o bem-estar e a saúde, e não precisa ter seu consumo limitado ao futuro", brinca. Rica em ferro, contribui positivamente na redução do colesterol total, do colesterol LDL, dos triglicerídeos e, devido às suas propriedades antioxidantes, estudos relacionam a ingestão de spirulina ao aumento do desempenho em exercícios e maior resistência.
Farofa de formiga?
Os insetos têm sido assunto recorrente quando se fala na alimentação do futuro. Victor explica que isso se dá pelo seu alto potencial como fonte de proteína, sendo uma substituição à carne bovina. "A produção é mais rápida, você não precisa esperar anos, como no caso da agropecuária, e pode ser feita em larga escala em espaços muito menores. É algo muito vantajoso do ponto de vista industrial", completa. Eles também são ricos em vitaminas, minerais e fibras.
Victor acrescenta que acabamos sempre imaginando um espetinho de grilo, famoso na culinária asiática, ou uma farofa de içá, prato brasileiro feito com a formiga saúva, mas que os insetos podem ser muito mais interessantes quando usados como matéria-prima. Podem ser insumos em outros tipos de alimento, como hambúrgueres.
Além dos insetos
A partir do relatório sobre a insegurança alimentar do futuro e as possíveis alternativas, a World Wildlife Fund (WWF), ou Fundo Mundial para a Natureza, em português, fez uma parceria com a marca de alimentos Knorr e criou uma lista com 11 categorias, das quais fazem parte 50 alimentos do futuro.
- Algas — Nessa categoria destacam-se a laver, também chamada de nori, e a wakame, duas algas muito consumidas na culinária japonesa. A nori é usada para enrolar sushis, por exemplo. De maneira geral, as algas são ricas em ácidos graxos essenciais, como ômega 3, 6 e 9. São fontes das chamadas "gorduras boas", ricas em antioxidantes, além de vitamina C, iodo e vitaminas do complexo B. Possuem boa densidade nutricional.
- Leguminosas — Diferentes tipos de feijão, incluindo o de soja e a lentilha, fazem parte do grupo. São uma fonte rica de fibras, proteínas e vitamina B.
- Cereais e grãos — Aqui, como nas leguminosas, estão incluídos alimentos mais comuns, como o arroz integral e a quinoa. Essa categoria engloba as fontes mais importantes da alimentação humana, mas é importante diversificar seu consumo. São ricos em carboidratos, minerais e proteínas vegetais.
- Cacto — Embora não seja tão conhecido, o consumo de cacto já acontece, incluindo as suculentas. Eles são ricos em vitaminas C e E, carotenoides, fibras e aminoácidos.
- Frutas-vegetais — São frutas que se assemelham a vegetais e são comumente consumidas como tais. Normalmente incluídas em saladas e refeições, têm sabores mais adocicados, mais carboidratos e água, quando comparadas aos vegetais. Ricas em vitamina C e frutas, têm como exemplo tomate, abobrinha e berinjela.
- Folhas verdes — São consideradas os vegetais mais versáteis e nutritivos. Podem ser as folhas de outros vegetais, como beterrabas e abóboras, e as folhas em si, como couve e espinafre. São ricas em fibras, vitaminas e minerais, têm baixas calorias e crescem com rapidez, sendo ótimas alternativas para o futuro.
- Cogumelos — Existem mais de duas mil variedades comestíveis de cogumelos. São fontes de proteína e fibra, além de ricos em vitaminas B e D.
- Sementes — São considerados superalimentos, fonte de proteína, vitamina E e gorduras boas. Variadas em sabores, podem ser usadas em todo tipo de refeição. A linhaça, a hemp seeds e o gergelim são algumas das sugestões do estudo.
- Raízes — Contêm uma vasta variedade de minerais, são ricas em carboidratos, vitaminas B1 e B3, potássio, magnésio e zinco. A WWF e a Knorr sugerem scorzonera hispanica, raiz de salsinha e rabanete branco.
- Brotos — São usados há cerca de cinco mil anos, quando médicos chineses os adotavam por sua alta concentração de nutrientes. Eles costumam ter o dobro ou até mesmo o triplo de valor nutricional das plantas. Brotos de feijão, alfafa e grão de bico são algumas das opções.
- Tubérculos — Grande fonte de carboidratos, são uma valiosa fonte de energia, além de versáteis no preparo. A batata é um dos tubérculos mais conhecidos, mas comer outras variedades, como a jicama e a raiz de lótus, aumenta a absorção nutricional.