Helsinque — São 18h na capital da Finlândia. Hora do rush em qualquer cidade grande do mundo. Trânsito agitado. Algumas retenções e engarrafamentos. Quem escolhe caminhar sob uma chuva fina gelada e o frio do outono no país escandinavo chega mais rápido onde deseja.
Com o smartphone em mãos e o aplicativo google maps apontado para o endereço Harjutorinkatu 1, 00500, chegamos a um dos destinos da romaria pela encantadora paisagem de Helsinque, a Kotiharjun Sauna. A bandeira de chegada na tela indica que estamos diante de uma das mais tradicionais saunas entre as 3,2 milhões espalhadas pela nação de 5,6 milhões de habitantes. Sim, você calculou certo: há espaço de sobra nesses estabelecimentos se todos os finlandeses decidirem ir ao mesmo tempo suar o corpo sob uma temperatura média de 80ºC.
Saiba Mais
É um pecado praticamente imperdoável ir à Finlândia e não experimentar o ambiente de uma sauna. A primeira impressão espanta. Kotiharjun Sauna, por exemplo, fica no meio de um conjunto habitacional. Há vários prédios vizinhos. Logo na entrada, você se depara com clientes enrolados em toalhas, de chinelo ou descalços, ao ar livre, sentados em cadeiras ou bancos. Eles tragam cigarro ou estão com uma garrafa de cerveja na mão. Recomenda-se repor o líquido perdido com alguma bebida. De preferência, água, óbvio. Tudo acontece como se fosse uma praça pública. Conversas e risos rolam soltos. Aquecem o corpo quente em contraste com o frio.
Embora o investimento na experiência saia caro — o acesso a Kotiharjun Sauna custa 15 euros (R$ 76,5) —, o barato é esquentar o corpo na temperatura mais elevada possível, tomar uma ducha fria para limpar o suor e dirigir-se ao ar livre para uma interação no meio da rua com conhecidos e anônimos. Recomenda-se seguir a liturgia. Os finlandeses tratam esse momento como ambiente para convivência e até mesmo o fechamento de negócios. Portanto, não ouse viver a sua experiência em seu mundinho e sair correndo como se os outros fossem invisíveis.
As saunas mais sofisticadas, destinadas, principalmente, aos turistas, oferecem mergulhos nas águas gélidas do Mar Báltico ou em piscinas com baixíssimas temperaturas a fim de tornar o passeio um pouco mais divertido. Consequentemente, cobram mais do seu bolso.
Os adeptos da Kotiharjun Sauna procuram tradição. Afinal, é a única a lenha remanescente em Helsinque. O marketing do estabelecimento reforça: "Apenas saunas a lenha permitem que você aproveite o calor suave da experiência". Na recepção, é possível pagar em dinheiro ou cartão. Esqueceu de levar toalha? É possível incluir a locação no combo. O vestiário tem armários com chaves vinculados a pulseiras. Basta acomodar os pertences e imergir em um calor infernal.
Embora tenha sido construída em 1928, a Kotiharjun é flexível. Em geral, o acesso às saunas na Finlândia é sem roupa. Peladão mesmo, sob rígido respeito. Quem não curte a exposição pode usar traje de banho. Há separação por gênero. Um acesso exclusivo para mulheres e outro destinado aos homens. Não há zona mista. Nessa experiência, os casais precisam se separar.
Os usuários se sentam em arquibancadas de madeira em cima de toalhas. Quem fica nos degraus mais altos da bancada sente mais calor. A opção para quem tem aversão a transpirar é procurar os bancos mais baixos. Alguns batem papo numa boa. Outros preferem sentir a vibe e tratam a experiência como um momento "zen", uma espécie de purificação da alma e do corpo dos perrengues cotidianos. Há um entra e sai rumo às duchas de água fria e o retorno para sentir a sensação do choque térmico antes do desfecho do passeio: o momento social ao ar livre na porta da loja enrolado na toalha.
Kotiharjun mantém a arquitetura original do início do século passado. Recebe desde frequentadores do bairro, com traços medievais, a estudantes e professores universitários das proximidades. Há pacotes para despedida de solteiro. Em comum, todos vão ali em busca de relaxamento. Literalmente baixam a pressão antes de uma noite de sono angelical.
Cultura
Há várias provas de que a Finlândia é a Disneylândia das saunas. Por exemplo: o tíquete para um passeio na roda gigante da Finnair, em frente à Praça do Mercado, oferece opção de uma sauna instalada em uma das cabines do cartão-postal de Helsinque. Os finlandeses frequentam as saunas ao menos uma vez por semana.
É comum casas e condomínios com saunas. Empresas também. Autoridades, como o presidente e o primeiro-ministro, desfrutam de saunas oficiais. Reuniões são marcadas nesses locais. As missões diplomáticas no exterior também costumam demandar saunas.
A finalidade terapêutica não é descartada. Muitos as chamam de "farmácia dos pobres". Pesquisas indicam que frequentar uma delas melhora o sistema imunológico e a circulação, com diminuição da exposição a resfriados e a doenças cardíacas, além de redução dos níveis de hormônios associados ao estresse, como cortisol. Por outro lado, aumenta os níveis de endorfinas e outros hormônios responsáveis pela sensação de bem-estar.
*O repórter viajou a convite da Embaixada da Finlândia
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