Quando moléculas de ar chegam a uma cavidade chamada orelha interna, estimulam as células ciliadas, responsáveis pela captação de vibração, que, por sua vez, vira impulso nervoso processado no cérebro. Só que as células ciliadas não se regeneram. Isso quer dizer que, à medida que ficamos sem elas, temos a perda de audição como sequela.
Ao mesmo tempo que isso explica a redução da capacidade de ouvir ao longo da vida, chama a atenção para cuidados com sons intensos e/ou contínuos, que agravam essa perda. A Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou, por meio de um relatório de 2021, que um quarto da população mundial, o equivalente a 2,5 bilhões de pessoas, terá algum tipo de deficiência auditiva até 2050. A exposição a ruídos excessivos é um dos motivos.
Tatiana Matos, otorrinolaringologista da clínica Otorrino DF e especialista em ouvido, explica o avanço gradativo de perda auditiva: "É comum iniciar com dificuldade para escutar entre quatro mil e 12 mil hertz, que são frequências mais agudas. Por isso, muitas vezes, se traduz na incompreensão de vozes femininas", esclarece. Há ainda aquelas situações em que a pessoa não entende a palavra toda e é incapaz de compreender a mensagem por inteiro. Um exemplo é falar "faca" e entender "vaca".
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O aparelho auditivo é o principal tipo de reabilitação. E é importante iniciar o uso tão logo se constate necessidade. Os modelos mais tecnológicos já conseguem suavizar sons ambientes, como sirenes e latidos, e amplificar a fala da pessoa que está mais próxima do paciente, o que proporciona mais conforto a ele. O design é outro aspecto cada vez mais aprimorado. "A intenção é melhorar a parte estética, que ainda é tabu aos olhos do outro e do próprio paciente. Há opções pequenas, com um fio fino e discreto e, para as crianças, aparelhos supercoloridos."
Surdez súbita, perda auditiva autoimune ou quadro infeccioso podem exigir outras saídas. Médica otorrinolaringologista do Hospital Santa Luzia, da Rede D'Or, Rafaela Aquino lista, entre elas, tratamento com medicamentos e cirurgia para colocação de prótese. "Ainda assim, o mais comum, principalmente, em relação à exposição a ruídos, é o aparelho, que pode ser com ou sem terapia com fonoaudiólogo", complementa.
Nas crianças
A Triagem Auditiva Neonatal (TAN), conhecida como teste da orelhinha, deve ser feita nos primeiros dias de vida, ainda na maternidade ou, no máximo, durante o primeiro mês de vida do bebê. Desde 2010, hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) são obrigados a oferecê-lo.
Ao longo da vida
A perda de audição costuma acontecer próximo dos 60 anos. Doença do labirinto, diabetes e hipertensão podem agravá-la.
Checape
Deve-se fazer audiometria anualmente a partir dos 60 anos. Para quem tem histórico familiar, a recomendação é fazer antes dessa idade, assim que notar empecilho para escutar. “Se perceber que não ouve quando o outro está de costas, mesmo que a uma distância curta, já é indicativo”, orienta Tatiana Matos, otorrinolaringologista da clínica Otorrino DF. Também deve ser anual entre crianças em fase escolar.
Audiometria
O exame é simples. Em uma cabine que isola o som ambiente, um fonoaudiólogo reproduz sons. Também fala palavras para testar a compreensão dos fonemas, etapa em que avalia a mobilidade da membrana timpânica (tímpano) do paciente.
Fones de ouvido
Mais que o modelo usado, é a intensidade do som que determina a saúde auditiva.
Recomendações para o uso
- Manter o menor nível sonoro possível
- A intensidade não deve ficar acima dos 75dB (decibéis)
- Tirar pausas a cada uma hora com fone. O ideal é parar uma hora seguida, ficar uma hora sem usá-lo
Fatores de risco para perda auditiva
- Exposição a ruídos por longos períodos ou a vibrações muito intensas (explosão de som)
- Avanço da idade
- Tabagismo
- Consumo de bebida alcoólica
- Deficiência de ferro
Palavra do especialista
Há um perfil mais propenso à perda auditiva?
Além dos casos de história familiar, observamos uma população com perda auditiva associada à exposição a ruídos no ambiente de trabalho. Geralmente, barulhos contínuos, como máquinas. Mas, hoje, é cada vez mais comum identificar o problema em jovens. O uso de fone de ouvido, por si só, não é tão prejudicial, mas a intensidade, sim. Sabemos que a partir de 75dB (decibéis) já há algum dano e, quanto mais alto escutar e por mais tempo, mais rápido ele ocorre.
Prejuízos desse tipo afetam outros sentidos e funções do corpo?
Esse é um ponto que frisamos muito em consultório para conscientizar sobre o tratamento precoce. A audição é uma função primordial para boas relações interpessoais, produtividade e cognição. Um paciente deficiente auditivo tem mais dificuldade para se comunicar e interagir. Em idosos, percebe-se muito isso. Eles pedem para repetir e a outra pessoa perde a paciência. Nesse caso, pode levar o mais velho ao isolamento e até depressão. Entre crianças, influencia o aprendizado, mesmo se for uma deficiência leve, sendo que também pode se manifestar na alteração da fala, com troca de fonemas. Outro ponto é que há uma associação entre perda auditiva e quadros demenciais. Atualmente, estima-se que até 8% dos casos de demência seriam preveníveis se tivessem tratado a audição assim que diagnosticada uma alteração.
O silêncio também é importante para a boa audição?
Sim, silenciar acaba sendo importante em um mundo como o nosso: extremamente ruidoso, com poluição sonora, carros, buzina. Depois do ruído, devemos descansar as células do ouvido para elas tentarem se recuperar, principalmente ao final do dia. Não precisa ser um silêncio absoluto. Ficar naquele silêncio doméstico, um ambiente mais calmo e quietinho, já é o suficiente.
Rafaela Aquino é médica otorrinolaringologista do Hospital Santa Luzia, da Rede D’Or
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