Saúde

Doença rara e grave, a neuromielite óptica pode causar cegueira e paralisia

Doença autoimune, a neuromielite óptica ataca o nervo óptico e a medula, causando a morte das células e consequentemente a interrupção das funções da área afetada

por Ailim Cabral
postado em 16/09/2022 06:01 / atualizado em 16/09/2022 12:17
 (crédito: Victor Freitas/Unsplash)
(crédito: Victor Freitas/Unsplash)

Ao falar sobre doenças raras, muitas vezes se questiona o porquê de dar atenção a um tema que não afeta tantos pacientes. No entanto, a informação é uma das maiores aliadas do diagnóstico precoce, que, muitas vezes, é o que separa uma pessoa de sequelas irreversíveis.

E esse é o caso da neuromielite óptica (NMO), também conhecida como doença ou síndrome de Devic. A condição autoimune, quando não identificada ou tratada corretamente, pode resultar em perda completa da visão ou paralisia dos membros.

A dificuldade do diagnóstico e a semelhança da doença com outras condições autoimunes, a exemplo da esclerose múltipla, atrapalham o cálculo da estimativa de pacientes atingidos. Mas acredita-se que, atualmente, de 3.500 a 7.000 pessoas convivam com a condição no Brasil. Mas afinal, o que é a neuromielite óptica e como podemos reconhecer os seus sinais?

A doença

- A Neuromielite óptica (NMO) é uma doença autoimune e neuroinflamatória. Além de rara, é grave, como alerta o coordenador científico de neurologia da Academia Brasileira de Neurologia e professor de neurologia na Universidade de Brasília (UnB), Felipe von Glehn.

- Na NMO, o organismo começa a atacar uma proteína chamada aquaporina-4 ou AQP-4, muito concentrada no cérebro, no nervo óptico e na medula. “Ninguém sabe ainda por que, mas o corpo cria anticorpos para destruir essa proteína”, acrescenta Felipe.

- Os anticorpos anti-aquaporina-4 se ligam às proteínas e promovem uma inflamação nos tecidos atingidos, que deixam de funcionar plenamente.

- Quando o sistema imune atinge o nervo óptico, ocorre a diminuição na capacidade de enxergar ou, dependendo da gravidade do ataque, pode ocorrer a cegueira súbita em um ou nos dois olhos.

- Quando a crise ataca a medula, pode resultar em fraqueza nos membros, dores ou até na paralisia imediata. A dificuldade para urinar, defecar e a perda do controle também pode acontecer a depender da região da medula que foi afetada. As crises podem ser locais ou gerais.

- “A progressão e a gravidade variam muito entre os pacientes, e os ataques e a gravidade da doença são imprevisíveis”, explica o neurologista Thiago de Faria Junqueira.

- O médico acrescenta que, em três anos, 69% dos indivíduos têm grave perda de visão em pelo menos um dos olhos. No prazo de seis anos, cerca de 18% dos pacientes perdem a visão nos dois olhos e 34% podem apresentar uma deficiência motora permanente.

Sinais de alerta

- Os sinais aos quais as pessoas precisam estar atentas são perda temporária de visão, dor nos olhos, sensações alteradas com sensibilidade à temperatura, dormência e formigamento, membros fracos e pesados.

Diagnóstico

- O diagnóstico é feito por meio de um exame que identifica a presença do anticorpo antiaquaporina-4 no sangue e, apesar de fazer parte do rol de exames suplementares da Agência Nacional de Saúde (ANS), não está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS).

- O neurologista Felipe von Glehn afirma que, com o tratamento adequado, é possível que o paciente leve uma vida próxima do normal. No entanto, em função da dificuldade no diagnóstico, muitos já chegam com sequelas irreversíveis.

Tratamento

- A NMO não tem cura, mas tem sido tratada conforme outras doenças autoimunes. Felipe explica que na fase de surto, quando a inflamação está ativa, é feito o uso de corticoides.

- Em seguida, são usados outros medicamentos, que não são indicados para a NMO especificamente, mas que diminuem a resposta imune do paciente, enfraquecendo a doença e diminuindo o risco de crise.

- Os sintomas são variados e podem, além da NMO, indicar outras patologias, sobretudo a esclerose múltipla e outras doenças autoimunes. O médico explica que todo sinal que se mantém constante por mais de 24 horas pede a avaliação de um neurologista.

Palavra do especialista


O que difere a NMO da esclerose múltipla?

Algumas declarações ainda têm uma certa controvérsia pela dificuldade de compreender todos os mecanismos de uma doença autoimune. Algumas correntes e alguns autores acreditam que a doença de Devic é uma manifestação mais grave da esclerose múltipla. Mas ela é uma doença que surge de maneira independente e não se sabe ainda por quê. Uma das principais maneiras de diferenciar a NMO de outros problemas autoimunes é pela manifestação, que costuma ser única, e pelo teste que avalia os tipos de anticorpo que estão atuando. Pela semelhança dos sintomas, é necessária uma avaliação minuciosa.

Por que as sequelas da NMO são irreversíveis?

Quando ocorre a lesão medular, que na grande maioria dos casos da neuromielite é muito agressiva, acontece a necrose daquela região. O prognóstico é muito ruim, porque uma crise pode resultar na necrose dos neurônios de regiões críticas da medula ou do nervo óptico. Na esclerose, por exemplo, alguns danos podem ser revertidos por serem nas proteínas que envolvem o nervo. Essa é uma das formas que também auxiliam no diagnóstico: quando há uma lesão permanente, é mais provável que seja a NMO. Apesar de não ser possível reverter os danos, quando é tratada, a doença não vai progredir.

Amauri Araújo Godinho é médico neurologista e neurocirurgião do Hospital Santa Lúcia

 

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